Coproduções internacionais

Temor comum no segmento audiovisual é a tributação aplicável aos contratos que envolvam remessas de recursos ao exterior. Com base no entendimento informal da ANCINE, toda e qualquer remessa originada da conta de movimentação do proponente, no contexto de uma coprodução, deve ser destinada ao pagamento por serviços prestados no exterior ou à aquisição de equipamentos.

Desse entendimento, decorrem consequências cujo ônus recai exclusivamente sobre o coprodutor brasileiro, das quais se destaca a indefinição e consequente insegurança jurídica sobre o tratamento tributário pelo Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), tendo em vista as alíquotas diversas aplicadas aos serviços em geral e aos serviços técnicos.
A legislação tributária estabelece, como regra geral, a alíquota de 25% do IRRF incidente sobre os valores pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a residentes ou domiciliados no exterior em razão da prestação de serviços.

Em 2000, com a instituição do Programa de Estímulo à Interação Universidade-Empresa para o Apoio à Inovação, foi criada a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE), devida pela pessoa jurídica detentora de licença de uso ou adquirente de conhecimentos tecnológicos, bem como a signatária de contratos que implicassem transferência de tecnologia, firmados com residentes ou domiciliados no exterior.

Em agosto de 2001, foi reduzida para 15% a alíquota do IRRF incidente sobre as importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas ao exterior a título de remuneração de serviços técnicos e de assistência técnica, e a título de royalties de qualquer natureza, com a produção de efeitos desde o início da cobrança da CIDE. A partir de janeiro de 2002, nova Lei incluiu os serviços de assistência administrativa e semelhantes nas hipóteses sujeitas à alíquota reduzida de 15% de IRRF.

Criou-se, então, a dificuldade ao contribuinte para identificação do que deveria ser considerado serviço técnico, administrativo ou semelhante para efeito da aplicação da alíquota de 15% (e não mais 25%).

A prestação de serviços refere-se à obrigação de uma parte de prestar serviços a outra em troca de remuneração, caracterizado pela independência técnica e ausência de subordinação hierárquica.

Segundo a doutrina, contrato de serviços técnicos, diferentemente, envolveria a execução de serviços que pressuponham tecnologia, que não é, todavia, transmitida, mas apenas aplicada à realização da atividade determinada. Serviços técnicos, portanto, teriam caráter complementar ou acessório, afastando-se do caráter autônomo dos serviços em geral.

A Receita Federal do Brasil classificou serviço técnico como “o trabalho, obra ou empreendimento cuja execução dependa de conhecimentos técnicos especializados, prestados por profissionais liberais ou de artes e ofícios”. Desde março de 2014, passou-se a incluir nessa definição “assistência administrativa ou prestação de consultoria, realizado por profissionais independentes ou com vínculo empregatício ou, ainda, decorrente de estruturas automatizadas com claro conteúdo tecnológico”.

Nota-se que, ao contrário da classificação proposta pela doutrina, a classificação oficial não revela o efetivo conteúdo destas obrigações nem busca exemplificar os contratos que estariam inseridos nesta classificação no intuito de viabilizar o devido enquadramento tributário pelos contribuintes.

As autoridades fiscais têm questionado e autuado os contribuintes com base na sua discricionariedade, classificando comumente as obrigações contratadas como serviços em geral, visando ao recolhimento da diferença de 10% de IRRF. Na última instância administrativa federal de julgamento, as decisões ainda não favorecem a formação de um entendimento.

A nosso ver, é a construção a partir dos precedentes deste órgão que deverá suprir a ausência de uma classificação satisfatória à garantia da segurança jurídica dos contribuintes.

Enquanto isso, os contribuintes e os seus assessores legais devem ser técnicos e cautelosos na elaboração dos contratos de serviços, buscando terminologias apropriadas, a fim de evidenciar a natureza jurídica das respectivas obrigações, favorecendo a sua avaliação pelas autoridades fiscais e, principalmente, a presença de argumentos consistentes em caso de questionamento pela fiscalização.

 

Por Felipe Cabral e Silva, advogado do escritório Cesnik, Quintino & Salinas Advogados | www.cqs.adv.com.br.

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