Mostra comemora aniversário de Warren Beatty

Com a morte de James Dean, em 1955, Hollywood se desesperou por um ídolo popular juvenil à altura do ícone transviado e testou toda sorte de candidatos a namoradinhos da América. “Irmão Contra Irmão” (1958) apontou John Cassavetes (1929-1989) como solução para a seca de jovens inquietos. Mas, naquele ano, este já estava às voltas com um projeto de se tornar um cineasta gauche, filmando “Sombras”. Não era o que a Meca do entretenimento queria. Eis que o irmão da atriz Shirley MacLaine surgiu como “a” alternativa: Henry Warren Beatty vinha de incursões na TV, quando testou seu carisma em “Clamor do Sexo” (1961). Estava nas mãos do mesmo Elia Kazan que esculpiu a fama de Dean. Seu sorriso ajudou o longa-metragem a arrecadar US$ 8,7 milhões, à força de sua química com Natalie Wood. Era uma história sobre virgindade, e ele fez dela algo universalmente trágico. Era bonito, gestualizava improvisos, e imprimia sutileza nos diálogos. Um astro nato. Era a saída ideal para os estúdios, reafirmando sua chama em “O Anjo Violento”, que deu a John Frankenheimer uma indicação à Palma de Ouro, em 1962. Fez bonito ainda em “Lilith” (1964), de Robert Rossen.

Foi um começo em que o naturalismo vinha carregado de uma inquietação psicanalítica que não passava por sexualidade ou senso de inadequação, mas por um ideal de enfrentamento. Beatty não era rebelde sem causa. Encarnava a ideia da vontade de potência plena: o virtuoso que sabe seu lugar na polis, seu dever na sociedade civil. Era a centelha de um incêndio anunciado, sem fumaça que os engravatados hollywoodianos farejassem. Beatty era um astro com consciência.

 Não haveria ninguém melhor do que ele para estrelar um experimento godardiano que aproximasse a (ainda) velha Hollywood da Nouvelle Vague: “Mickey One” (1965), de Arthur Penn. A premissa provocativa de fazer um filme que não estivesse refém do código de causa e efeito do cinemão dos EUA atraiu o garotão. Era um experimento em que o protagonismo era da linguagem fílmica. Ninguém entendeu bem o que Penn queria, à época, mas a indústria sacou que Beatty traíra o pacto do estrelato descerebrado. Mesmo associado à fama de garanhão, ele não deixou a pecha de mulherengo brilhar mais do que seu desejo de desafiar convenções: é a consciência valendo, à esquerda, democrata. Graças a ela, Beatty fez de Clyde Barrow, assaltante dos dias de Lei Seca, um mártir em “Bonnie e Clyde: Uma Rajada de Balas”, de seu amigo Penn. Nascia ali a Nova Hollywood, com engajamento ético.

Provocador, Beatty virou o muso daquele movimento, emprestando charme a cineastas como Alan J. Pakula (“A Trama”), Robert Altman (“Onde os Homens São Homens”) e Hal Ashby, com quem desmistificou seu arquétipo macho alfa em “Shampoo”, comédia de 1975 que ele transformou em sátira política. A lição desses mestres ele levou para sua obra como realizador, iniciada em 1978, com “O Céu Pode Esperar”. É uma crônica de costumes de tom marxista, sobre ricos e pobres. Ele seguiu no marxismo em “Reds”, sobre a Revolução Russa, pelo qual ganhou o Oscar de direção. Voltaria ao “capital” em “Politicamente Incorreto” (1998) e “Regras Não se Aplicam” (2016). Pulou Marx só em “Dick Tracy” (1990), no qual prestou tributo a uma HQ de sua infância e à Hollywood clássica que fez dele mito.

 

Mostra Warren Beatty – Uma Rajada de Charme
Data: 
25 a 31 de março
Local: Cinemateca do MAM – Av. Infante Dom Henrique, 85, Praia do Flamengo, Rio de Janeiro/RJ – (21) 3883-5630
Ingressos gratuitos

 

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