Globo de Ouro consagra “Nomadland”, “Soul”, “Minari” e “The Crown”

Por Maria do Rosário Caetano

A Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood consagrou, em sua septuagésima-oitava edição, o filme independente “Nomadland”, de Chloé Zhao, a animação “Soul”, produção de alma black da Pixar, e a série inglesa “The Crown”, sobre a família real britânica.

Até na hora de escolher o melhor filme em língua estrangeira, os correspondentes sediados nos EUA optaram por uma produção estadunidense – “Minari, em Busca da Felicidade”, de Lee Isaac Chung. O filme é falado em coreano, pois acompanha a luta de imigrantes oriundos do país oriental. Marido e mulher jovens, com dois filhos pequenos, estão dispostos a enfrentar todas as adversidades até tornar próspera uma fazendinha no estado do Arkansas. Ele, mais que ela, sonha regressar à grande cidade. Há que registrar-se a presença da língua inglesa em boa parte (quase metade) dos diálogos. Afinal, o drama desenvolve-se em solo norte-americano e a interação com personagens nativos, incluindo um lavrador afro-americano, faz -se obrigatória.

O único filme não-anglo-saxão premiado com o Globo de Ouro foi “Rosa e Momo”, do italiano Edoardo Ponti, filho de Sophia Loren e Carlo Ponti. Ele concorria a melhor produção estrangeira, mas perdeu para “Minari”. Como consolação, ficou com o Globo de Ouro de melhor canção, “Io Sè”, de Laura Pausini, Niccolò Agliardi e Diane Warren.

Na hora dos prêmios para as melhores interpretações, os estrangeiros convocados por produções norte-americanas (a pré-adolescente alemã Helena Zengel, de “Relatos do Mundo”, o franco-argelino Tahar Rahim, de “The Mauritain”, o paquistanês-londrino, Riz Ahmed, de “O Silêncio do Som”, e o anglo-indiano Dev Patel, de “A Vida Extraordinária de David Cooperfield”) não passaram de figurantes. Todos os premiados, seja como protagonistas ou coadjuvantes, são estadunidenses ou ingleses.

Por sorte, a Associação de Imprensa Estrangeira, criticada por não contar com nenhum integrante negro entre seus quase 90 integrantes, prestou atenção em intérpretes afro-americanos, caso de Chadwick Boseman, prêmio póstumo e merecido por seu notável desempenho em “A Voz Suprema do Blues”, Andra Day, protagonista de “Os Estados Unidos Versus Billie Holiday”, e Daniel Kaluuya, de “Judas e o Messias Negro” (sobre Fred Hampton, do Partido Panteras Negras, assassinado aos 21 anos).

Para mostrar alguma diversidade, a Associação levou ao palco três de seus integrantes – duas mulheres (uma indiana e uma alemã) e um homem (turco). Depois de receber pesadas críticas de diários importantes como o Los Angeles Times e o New York Times, a Associação de Imprensa Estrangeira dá mostras de que pretende mudar.

Os dois jornais rechearam suas reportagens sobre os eleitores do Globo de Ouro com duras críticas. Constaram que, além da ausência de diversidade nos quadros da instituição, há inflexível resistência em aprovar novos sócios e “relações promíscuas” com grandes produtoras. O caso mais gritante, segundo a imprensa norte-americana, seria a indicação da série “Emily em Paris”, tida por vários críticos como deslumbrada e superficial. Um terço dos associados-eleitores do Globo de Ouro teria viajado a Paris, para acompanhar as gravações, e recebido mordomias especiais.

Já um dos títulos televisivos bem-considerados por suas qualidades – “I May Destroy You”, criação inglesa de Michaela Coel – acabou ignorado, não recebendo uma indicação que fosse. Até a homenageada Jane Fonda (Prêmio Cecil B. DeMille), lindíssima aos 83 anos e esbanjando elegância em moderno terninho branco, lamentou tal ausência em discurso muito bem informado.

A atriz mostrou-se uma coroa atenta a tudo que se passa ao seu redor, atualizadíssima com filmes, séries e minisséries. Citou várias delas. Mesmo octogenária, a estrela guarda algo da “Jane Hanói”, apelido que ganhou nos anos áureos de rebeldia e ativismo, quando combateu a Guerra do Vietnã e visitou a capital do lado comunista do conflito.

A moda deu as caras na festa do Globo de Ouro, mesmo sem tapete vermelho real. Atrizes de cinema e TV vestiram-se com trajes de gala e foram registradas pelas câmeras a partir de seus lares, sozinhas ou cercadas de familiares. O vestido, vermelho, mais extravagante da noite foi o da inglesa Rosamund Pike (da comédia “Eu me importo”). Ela parecia um rosto mergulhado em fru-frus de delirante filme infantil.

Só o ator Jason Sudeikis, da série “Ted Lasso”, confortável em moleton de cor clara, e Chloé Zhao usaram trajes domésticos. A chinesa, em franciscano exemplo de austeridade, trajou singela camiseta de cor neutra e cabelos presos em compridas tranças. Parecia saída de multidão anônima de mulheres chinesas da era Mao Tse-Tung. Agradeceu, com síntese e elegância, aos dois mais cobiçados prêmios prêmios da noite: os Globo de Ouro de melhor filme dramático e melhor direção.

A chinesinha Chloé Zhao, de 38 anos, nascida em Pequim e radicada nos EUA, seguiu o modelo discreto de Frances McDormand, protagonista de sua saga nômade, marcada por empregos temporários e espalhados pelos estados de Nevada, Arizona, Califórnia, Dakota do Sul e Nebraska.

A grande atriz nascida em Illinois, há 63 anos, vive o cinema em tempo integral, seja sob a regência do marido Joel e do cunhado Ethan Coen, ou sob direção de outros realizadores. Ganhou um Oscar de coadjuvante por “Fargo”, feito em família, e de protagonista com “Três Anúncios para Um Crime”, de Martin McDonagh. Foi dela a ideia de protagonizar (e produzir) “Nomadland”.

Frances McDormand sabe que são raros os papéis de peso para atrizes sexagenárias. Por isso, adquiriu os direitos de filmagem do livro “Nomadland – Surviving America in the Twenty-First Century”, de Jessica Bruder, e arriscou-se ao convidar uma diretora jovem e pouco conhecida para comandá-lo. Até assumir “Nomadland”, Chloé dirigira, até então, apenas dois longas-metragens (“Songs my Brothers Taught me”, e “Domando o Destino”).

As duas triunfaram em Veneza: “Nomadland” ganhou o Leão de Ouro. Repetiram a façanha no Globo de Ouro. No próximo dia 15, quando a Academia de Hollywood anunciar seus finalistas, o filme deverá figurar em muitas e importantes categorias.

OS VENCEDORES – CINEMA

. “Nomadland”, de Chloé Zhao (EUA) – melhor drama e melhor direção

. “Borat: Fita de Cinema Seguinte”, de Jason Woliner (EUA) – melhor comédia ou musical, melhor ator de comédia/musical (Sacha Baron Cohen)

. “Soul” (EUA), de Pete Docter – melhor filme de animação, melhor trilha sonora (Jon Batiste, Trent Reznor, Atticus Ross)

. “Minari, em Busca da Felicidade”, de Lee Isaac Chung (EUA) – melhor filme em língua estrangeira

. “Os Estados Unidos Versus Billie Holiday” (EUA) – melhor atriz de drama (Andra Day)

. “A Voz Suprema do Blues” (EUA) – melhor ator de drama (Chadwick Boseman)

. “Eu me Importo” (EUA) – melhor atriz de comédia/musical (Rosamund Pike)

. “The Mauritain” (EUA) – melhor atriz coadjuvante (Jodie Foster)

. “Judas e o Messias Negro” – melhor ator coadjuvante de drama (Daniel Kaluuya)

. “Os 7 de Chicago” (EUA) – melhor roteiro (Aaron Sorkin)

. “Rosa e Momo” (Itália) – melhor canção (“Io Sè”, de Diane Warren, Niccolò Agliardi e Laura Pausini)

OS VENCEDORES – TELEVISÃO

. “The Crown” (Inglaterra) – melhor série dramática, atriz protagonista (Emma Corin), atriz coadjuvante (Gillian Anderson), ator (Josh O’Connor).

. “O Gambito da Rainha” (EUA) – melhor filme ou minissérie, melhor atriz (Anya Taylor-Jo)

. “Schitt’s Creek” (Canadá) – melhor série comédia/musical, melhor atriz (Catherine O’Hara)

. “Small Axe”, de Steve McQueen (Inglaterra) – melhor ator coadjuvante de série (John Boyega)

. “A Know this Much is True” (EUA) – melhor ator de filme ou série de TV (Mark Ruffalo)

. “Ted Lasso” (EUA) – melhor ator de comédia/musical (Jason Sudeikis)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.