Brasil tem representação de peso no Festival de Havana
As mulheres ganharam força significativa na representação brasileira no Festival do Novo Cinema Latino-Americano de Havana. Dos dez longas-metragens escolhidos para disputar três das principais mostras competitivas da 39ª edição do festival cubano, cinco trazem crédito feminino e cinco, crédito masculino. Meio a meio. Sinal de que nossas cineastas estão realizando ótimos filmes, pois, como observou o diretor do festival, Ivan Giroud, nomes femininos assinam menos de um terço dos 400 títulos programados para este ano.
As realizadoras brasileiras selecionadas são Daniela Thomas, com “Vazante”, Lúcia Murat, com “Praça Paris”, e Carolina Jabor, com “Aos teus Olhos”, para a mostra principal; a mineira Juliana Antunes (“Baronesa”), na competição de documentários, e a paulistana Carolina Leone (“Pela Janela”), na mostra Óperas Primas (filmes de diretores estreantes).
O time masculino forma-se com Marcelo Gomes (“Joaquim”, longa sobre Tiradentes), Selton Mello (“O Filme da minha Vida”, baseado em novela de António Skarmeta), ambos na competição principal, Silvio Tendler (“Dedo na Ferida”), na mostra de documentários, e Fábio Meira (“As Duas Irenes”) e Affonso Uchoa e João Dumans (“Arábia”), na Ópera Prima (Uchoa já dirigiu um longa documental, “A Vizinhança do Tigre”, mas Havana leva em conta a estreia na ficção).
O Festival do Novo Cinema Latino-Americano ocupará dezenas de cinemas na ilha caribenha, durante dez dias, de 8 a 17 de dezembro, e distribuirá o Prêmio Coral aos melhores entre os 94 filmes hispano-americanos e brasileiros selecionados para as competições desta temporada.
A Argentina tem representação de cinco longas na competição principal, portanto, o mesmo número do Brasil. Do país de Ricardo Darín, foram selecionados dois títulos femininos (“Zama”, de Lucrécia Martel, e “Alanis”, de Anahi Berneri). Os outros três concorrentes são “Invisível”, de Pablo Giorgelli, “Una Especie de Família”, de Diego Lerman, e “La Cordillera”, de Santiago Mitre (no qual o astro Darín interpreta ninguém mais, ninguém mensos, que o presidente da Argentina).
O México, a terceira potência audiovisual do subcontinente, tem três concorrentes na categoria principal (ficção). Dois dirigidos por mulheres: “Tesoros”, de Maria Novaro, “Restos de Viento”, por Jimena Montemayor, e um por Michel Franco – “Las Hijas de Abril”, obra perturbadora, fruto de coprodução com a Espanha, protagonizada pela almodovariana Emma Suárez.
Cuba e o Chile contam com dois representantes cada. A prata da casa se faz representar por “Buenos Demónios”, de Gerardo Chijona, e “Sérgio & Serguei”, de Ernesto Darana, autor do duro, mas comovente, “Uma Escola de Havana”, que teve boa aceitação no circuito de arte brasileiro. Em seu novo filme, Darana coloca dois homens de mesmo nome, um cubano e um soviético, construindo, à distância, amizade que se mostrará duradoura. Tudo isto no trágico momento (1991) em que a poderosa União das Repúblicas Socialistas Soviéticas se esfacela e Cuba entra na maior crise econômica de sua história (o “período especial”). Sérgio é radioamador e professor de Marxismo. Serguei é cosmonauta. Ele encontra-se em estação orbital semi-abandonada pela vertigem dos acontecimentos, fonte da bancarrota do império soviético.
A representação chilena é enxuta, mas forte: “Uma Mulher Fantástica”, de Sebastián Lelio, já lançado nos cinemas brasileiros, foi exibido e premiado em Berlin. O corajoso “Los Perros”, de Marcela Said, também teve boa carreira em festivais.
Na categoria documentário, o país de Neruda se faz representar por um peso pesado – “El Pacto de Adriana”, de Lissette Orozco. Este filme venceu, por unanimidade e sob louvores, a 41ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. O júri ficou fascinado pela coragem da jovem Lissette, que rompeu laços familiares ao não esconder dura verdade: sua tia Adriana, a desenvolta Channy, integrou a Dina, a polícia política de Pinochet, responsável por tortura e assassinato de milhares de presos. No terreno da animação, o Chile apresentará “Cantar con Sentido, una Biografia de Violeta Parra”, de Leonardo Beltrão.
A Colômbia, que experimentou, nos últimos anos, um boom de raro vigor, tem representação modesta no festival habanero: só “Siete Cabezas”, de Jaime Osorio. Completa a safra ficcional do festival cubano, o longa “Carpinteros”, de José Maria Cabral, da República Dominicana. Países como Uruguai, Peru, Venezuela e Equador não emplacaram nenhum título na mostra principal.
O Brasil marca presença na disputa de curtas-metragens com “De Tanto Olhar o Céu Gastei meus Olhos”, de Nathalia Tereza, e com o festejado “Nada”, de Gabriel Martins, do coletivo Filmes de Plástico, de Minas Gerais.
No terreno das mostras informativas, o Festival de Havana homenageará, com retrospectiva, o cineasta norte-americano James Ivory. Ano que vem, ele tornar-se-á nonagenário. Ivory estará em Havana para acompanhar a exibição de seus filmes (“Uma Janela para o Amor”, “Retorno de Roward´s End”, “Vestígios do Dia”, “Maurice”, entre outros). Estará sozinho, pois seus dois grandes parceiros, a escritora e roteirista anglo-alemã Ruth Prawer Jhabvala (1927-2013) e o produtor indiano Ismail Merchant (1936-2003) já se foram.
A mostra Clássicos Restaurados apresentará, este ano, dois filmes que marcaram a memória do público cubano: o belo “Lucia” (1968), de Humberto Solas, e a comédia “Se Permuta” (1984), de Juan Carlo Tabío (parceiro de Tomas Gutierrez Alea em “Morango e Chocolate” e “Guantanamera”). O colombiano Victor Gavíria, que integra o júri oficial de ficção, acompanhará sessão de um de seus filmes iniciais, “Rodrigo no Futuro” (1989). O mexicano Pablo Casals, parceiro de júri de Gavíria, verá dois de seus filmes restaurados – “Canoa” (1976) e “ Los Motivos” de la Luz” (1985) – na mostra habanera.
O Festival cubano promove, ainda, competições de “Carteles” (cartazes de cinema), Pós-Produção (filmes em fase derradeira) e de Roteiros Inéditos. Nesta última categoria, o Brasil não inscreveu nenhum projeto. Decerto, porque nossos roteiristas não dispunham de “guiones” traduzidos para a língua espanhola.
Por Maria do Rosário Caetano
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