Cine Ceará consagra “Petra”, da Espanha
Por Maria do Rosário Caetano, de Fortaleza
A Espanha derrotou Portugal. O belo e sólido melodrama “Petra”, banhado em tintas trágicas, derrotou o mais badalado e esperado dos concorrentes do Cine Ceará, o português “Diamantino”, paródia ultra-pop de diversos gêneros cinematográficos, interpretada por um sósia do astro do futebol, Cristiano Ronaldo.
O júri oficial atribuiu ao filme espanhol, dirigido pelo catalão Jaime Rosales, quatro dos mais importantes prêmios em disputa: melhor filme, direção, ator (o veterano engenheiro Joan Botey, que nunca atuara num filme) e roteiro (de Rosales em parceria com Michel Gaztamide e Clara Roquet). A crítica cinematográfica referendou a escolha do júri oficial e atribuiu a “Petra” o Prêmio Abraccine. Dos dez troféus Mucuripe em disputa, “Petra” levou quase a metade.
O segundo longa mais premiado no XXVIII Festival do Cinema Ibero-Americano de Fortaleza foi o cearense “O Barco”, de Petrus Cariry. Ambientado numa aldeia de pescadores, banhada pelo Oceano Atlântico e emparedada por imensas falésias, o filme, um exercício poético, de narrativa lacunar e misteriosa, centra-se em três figuras: uma mãe de 26 filhos que vê um deles, o mais velho, disposto a partir, depois que chega à aldeia, uma jovem saída as águas do mar. O júri reconheceu a belíssima fotografia de Petrus Cariry, que gosta de acumular a direção e a autoria das imagens de seus filmes. E, também, costuma colaborar com o design sonoro. “O Barco” recebeu, ainda, os troféus de trilha sonora (Hérlon Robson) e som (Yunes Viana, Érico Paiua e Petrus Cariry).
O chileno “Cabros de Mierda”, de Gonzalo Justiniano, conquistou dois Mucuripe: melhor atriz, para a jovem Natália Aragonese, e melhor direção de arte (Carlos Garrido). Natália interpreta uma mulher de 30 e poucos anos, dedicada à luta contra a ditadura Pinochet e apelidada “Francesinha”, por ser muito libertária em seus hábitos sexuais. A ponto de seduzir um missionário norte-americano, de 23 anos, que chega a uma “población” (um bairro proletário) para pregar o evangelho.
Ao badalado “Diamantino”, pop até a medula, o júri oficial só atribuiu um troféu Mucuripe: o de melhor montagem para a francesa Raphaelle Martin-Holger. O filme é fruto de coprodução com o Brasil e com a França e vem chamando atenção desde que ganhou prêmio na Semana da Crítica, em Cannes.
O júri oficial, que contou com o cineasta espanhol Gustavo Salmerón, o crítico peruano Emílio Bustamante, o professor norte-americano Stephen Bocskay e os brasileiros Belisário Franca (diretor) e a pesquisadora Belisa Figueiró não recorreu à prática do distributivismo. Deixou quatro filmes (incluindo o sólido e perturbador “Senhorita Maria, a Saia da Montanha”, do colombiano Rubén Mendoza) sem nenhum troféu. Caso dos documentários brasileiros “Eduardo Galeano Vagamundo”, de Felipe Nepomuceno, e “Anjos de Ipanema”, de Conceição Senna. E da simpática comédia “Amália, a Secretária”, de Andrés Burgos, também vindo da Colômbia.
O júri de curta-metragem — que contou com a crítica francesa Sylvie Pierre, a crítica Camila Vieira, a curadora Andrea Cals e os cineastas Cibele Amaral e Nirton Venâncio — escolheu três dos treze concorrentes. O pernambucano “Nova Iorque”, de Leo Tabosa, foi eleito o melhor filme (ganhou também o Prêmio da Crítica). O carioca “O Vestido de Myriam”, de Lucas H. Rossi, recordistas de prêmios especiais (Canal Brasil, Troféu Samburá, Olhar Universitário) recebeu o Mucuripe de melhor direção. O prêmio de melhor roteiro ficou com Sabrina Garcia, por “Só por Hoje”.
Leo Tabosa deu uma enorme guinada em sua trajetória: depois de dois filmes para maiores de 18 anos, realizou um curta com suas memórias de infância, tendo um ator mirim (Juan Calado) com retaguarda de peso: as atrizes Hermila Guedes, em estado graça na pele de uma professora interiorana, e Marcélia Cartaxo, como madrasta dura com o enteado.
Lucas H. Rossi provou, com “O Vestido de Myriam”, curta escorado em brilhantes desempenhos de Camilla Amado e Tonico Pereira, que é um diretor dos mais promissores. Ele já está trabalhando em seu primeiro longa-metragem, “Othelo, o Grande”, documentário sobre Sebastião Prata, parceiro de Oscarito em chanchadas inesquecíveis e figura emblemática do Cinema Novo.
A premiação de curtas teria sido ainda melhor se o júri tivesse prestado atenção em “A Menina Banda”, do pernambucano Breno César, um filme inventivo, construído sobre rostos (imagens) de gente que vive do trabalho braçal nos canaviais da Zona da Mata, com seus pequenos, mínimos, momentos de sonho e lazer.
Dois curtas cearenses foram premiados: “A Canção de Alice”, de Bárbara Cariry (melhor produção cearense) e “Cartuchos de Super Mitendo em Anéis de Saturno”, de Leon Reis (melhor filme da Mostra Olhar do Ceará, com júri próprio).
Confira todos os vencedores do festival:
LONGA-METRAGEM IBERO-AMERICANO
“Petra”(Espanha) – melhor filme, diretor (Jaime Rosales), ator (Joan Botey), roteiro (Jaime Rosales, Michel Gaztambide e Clara Roquet), Prêmio da Crítica
“O Barco” (Ceará) – melhor fotografia (Petrus Cariry), trilha sonora (Hérlon Robson), som (Yures Viana, Érico Paiua e Petrus Cariry), Prêmio Olhar Universitário
“Cabros de Mierda” (Chile) – melhor atriz (Natália Aragonese), direção de arte (Carlos Garrido)
“Diamantino”(Portugal) – melhor montagem (Raphaelle Martin-Holger)
CURTA-METRAGEM BRASILEIRO
“Nova Iorque” (Pernambuco) – melhor filme, Prêmio da Crítica
“O Vestido de Myrian” (Rio de Janeiro) – melhor direção (Lucas H. Rossi), Prêmio da Crítica, Prêmio Canal Brasil, Prêmio Samburá do jornal O Povo, Prêmio Olhar Universitário
“Só Por Hoje” (Rio de Janeiro): melhor roteiro (Sabrina Garcia)
“Plantae” (Rio de Janeiro) – Trofeu Samburá do jornal O Povo para melhor direção (Guilherme Gehr)
“A Canção de Alice” (Ceará), de Bárbara Cariry – melhor produção cearense
“Cartuchos de Super Nitendo em Anéis de Saturno”, de Leon Reis – melhor filme da Mostra Olhar do Ceará
“Economize”, de Abu – melhor filme da mostra “Cada Gota Conta”
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