Quando os cinemas serão reabertos?

Por Maria do Rosário Caetano

Semanas atrás, o movimento “Juntos pelo Cinema”, encabeçado por exibidores, anunciou o dia 27 de julho, a próxima segunda-feira, como data de reabertura das salas. A atração inaugural seria um Festival de Sucessos, com produções selecionadas pelo crítico Erico Borgo. O ponto forte do pacote seriam filmes de super-heróis, acompanhados de dramas, comédias e terror bem-sucedidos no diálogo com o público.

Tudo indica que a reabertura será adiada. Só André Sturm, do circuito Belas Artes, confirma a volta dos cinemas da Avenida Consolação paulistana, mas no dia 3 de agosto. Com programação própria, selecionada por ele e em apenas quatro das seis salas disponíveis. No cardápio, filmes como “Apocalipse Now”, uma seleção em homenagem a Federico Fellini (no ano de seu centenário), uma mostra Kubrick e sucessos de estima como “Medos Privados em Lugares Públicos”, de Alain Resnais.

Como os cinemas – por serem espaços fechados e sem janela, com ar condicionado e banheiros coletivos – são considerados “área de alto risco”, Sturm promete obedecer religiosamente às exigências das autoridades sanitárias (só 40% da lotação, cadeiras espaçadas, higienização pesada etc.).

Os outros templos da cinefilia paulistana – CineSesc, Espaço Itaú de Cinema e Reserva Cultural – ainda não anunciaram data de reabertura. Avaliam, com cautela, a hora oportuna. Jean-Thomas Bernardini, da Imovision, que programa o Reserva Cultural, integra o movimento “Juntos pelo Cinema”, mas já avisou que, ao reabrir suas quatro salas na Avenida Paulista, o fará com programação própria (filmes de empenho cultural). Não com os blockbusters anunciados para o Festival de Sucessos.

O mais surpreendente no atraso da reabertura dos circuitos vem das grandes cadeias exibidoras: Cinemark, Cinépolis, Kinoplex e assemelhadas. Elas não anunciaram a nova data. E por que?

A razão é poderosa: o adiamento da data de lançamento do candidato a blockbuster “Tenet”, novo filme de Christopher Nolan (com 2h31 de duração), pela distribuidora Warner. A data era estimada para julho, passou para 28 de agosto. Agora, mudou para setembro.

Há, porém, dentro da poderosa indústria estadunidense, quem sugira adiar o lançamento para 2021. Com a pandemia atormentando três poderosos mercados dos EUA – Califórnia, Flórida e Texas –, entendeu-se a dimensão do risco de arremessar o filme em países com populações amedrontadas (a norte-americana e a brasileira na linha de frente, já que habitam os dois países com mais contaminados e mortos).

França e Coreia do Sul, países que chegam a ocupar faixas de 30% a 50% de seus mercados internos com produção própria, reabriram seus circuitos de cinema. E colocaram filmes pátrios em primeiro lugar no box office. A Coreia do Sul, não se pode esquecer, além de contar com produção poderosa, está com o orgulho em alta. Afinal, venceu o Oscar principal com um filme 100% made in Korea (“Parasita”), falado em coreano, com história, atores e técnicos nativos (antes, só um filme francês – “O Artista” – conhecera tal glória, mas era mudo e tematizava-louvava o cinema mudo dos EUA).

O distribuidor Bruno Wainer, da Downtown, guardou seus candidatos brasileiros a grandes bilheterias (comédias, em especial) e não pretende arremessá-los de qualquer jeito no mercado. Cauteloso, ele acredita que a reabertura do circuito de exibição só acontecerá mesmo em 2021.

Para Wainer, o anunciado Festival de Sucessos só fará sentido se houver filmes novos e fortes, capazes, portanto, de sequenciar a retomada da exibição. “Esta estratégia” – explica – “é de soft opening”. Serve para que “se possa sentir o interesse do público”. Mesmo assim, lembra, “ninguém sabe qual será o resultado”.

O mercado brasileiro é capaz de sobreviver sem os blockbusters dos EUA? Wainer entende que “salas de cinema em nenhum lugar do mundo sobrevivem sem a produção de Hollywood”. Só – e talvez! – a Índia.

E os cines drive-ins? São uma boa alternativa?

Com sua franqueza costumeira, Bruno Wainer diz que “para filme pequeno, tanto faz”, já que “a expectativa de resultado nos cinemas é sempre mínima”. Já para “filme grande, drive-in é inviável”.

André Sturm e o cineasta Marcos Prado vão lançar “Macabro”, longa ficcional baseado em crimes que abalaram a Serra dos Órgãos, no estado do Rio, na década de 1990, em alguns drive-ins.

Tudo indica que Prado, produtor e diretor dos impactantes “Estamira” e “Curumim, o Homem que Queria Voar”, esteja de olho na TV e no streaming como vitrines preferenciais. Daí sua opção em cumprir a lei (filmes patrocinados com verba pública devem ser lançados em salas físicas) e, assim, autorizar-se a buscar espaços digitais de exibição.

Filmes brasileiros, caso de comédias promissoras como “Depois a Louca Sou Eu”, policiais (dois filmes sobre o Caso Richthofen e “Alemão”) e cinebiografias (como “Marighella”, de Wagner Moura) devem ser lançados esse ano? Ou devem ser guardados para quando o público (de todas as faixas etárias e não só dos 16 aos 24 anos) se animar a estar em um espaço, a sala de cinema, fechado e sem janelas?

Bruno Wainer responde: “Eu, pessoalmente, acho que as salas só deveriam reabrir com total segurança para os espectadores, o que significa vacina ou tratamento seguro. A vida vem em primeiro lugar”.

O Boletim Filme B, editado pelo cineasta Paulo Sérgio Almeida, vem analisando, com farto e matizado material, a situação em que se encontra o setor cinematográfico em tempos de pandemia. Afinal, é a primeira vez na história, que um vírus desestrutura indústria tão poderosa. No começo do século XX, quando a chamada Gripe Espanhola matou milhões de pessoas, o cinema iniciava sua consolidação. Só transformar-se-ia na maior indústria de entretenimento do mundo a partir dos anos 1930.

As análises do Filme B mostram que sem um conjunto de filmes candidatos a blockbuster (“Tenet”, “Mulan”, o novo “007”) não dá para colocar os circuitos exibidores em pleno funcionamento. No Brasil, os mercados de São Paulo e Rio e de Janeiro parecem prontos para serem reabertos. Mas regiões como o Sul, o Centro-Oeste e o rico interior paulista encontram-se em fases difíceis.

Por que não voltar aos tempos dos lançamentos setoriais? Ou seja, por países?

O Filme B esclarece: com a pirataria, a distribuição setorial foi abandonada, superada. Quem vai arriscar-se a lançar um candidato a blockbuster na França ou na Coreia do Sul, correndo o risco de cair nas mãos da pirataria e espalhar-se pelas mídias digitais dos outros mercados?

A situação é bem mais complexa do que parece. Hollywood vive seu maior desafio. E o faz no momento em que o streaming vive sua glória. Assinaturas da Netflix cresceram de forma exponencial, em especial em março, começo da pandemia.

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