Globo de Ouro realiza edição virtual de olho nas minorias, mas indiferente ao documentário

Por Maria do Rosário Caetano

A Associação de Correspondentes Estrangeiros de Hollywood, colegiado que distribui, anualmente, os troféus Globo de Ouro, realiza, neste domingo, 28 de fevereiro, sua festa anual, com homenagem à atriz Jane Fonda. Por causa da pandemia, a cerimônia será virtual, portanto, sem badalações no tapete vermelho e sem mesas de jantar lotadas por astros de Hollywood.

Depois de receber críticas por ignorar a força do cinema feminino e afro-americano, cada vez mais significativa, os Correspondentes Estrangeiros afinaram sua busca de filmes realizados fora do mundo branco-masculino-anglo-saxão. Mas seguem praticando dois anacronismos. Primeiro: a separação de longas-metragens em duas (três, na verdade) categorias – filme dramático e filme musical-ou-comédia. Segundo: por incrível que pareça, a turma do Globo de Ouro ainda não percebeu o crescimento e a força inovadora do cinema documental, cada vez mais forte em festivais internacionais (incluindo Cannes, Veneza e Berlim) e no próprio Oscar da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood. Basta ver a dupla indicação do macedônio “Honeyland” para melhor documentário e melhor filme internacional, ano passado, fato que pode repetir-se, esse ano, com o chileno “O Agente Duplo” ou o romeno “Collective”.

"Nomadland", de Chloé Zhao

O colegiado do Oscar dá sinais cada vez mais explícitos de que pretende ampliar o alcance geográfico dos filmes selecionados (vide o prêmio máximo entregue ao francês “O Artista” e ao coreano “Parasita”). A chegada de novos integrantes, vindos de diversos cantos do mundo, começa a alterar procedimentos sedimentados ao longo de quase um século (o Oscar foi criado em 1929, o Globo de Ouro, em 1944).

Na última década, em especial, a Academia de Hollywood renovou a comissão que escolhe 15 documentários como semifinalistas (lista da qual sairão os cinco finalistas). Enquanto isso, os Correspondentes Estrangeiros seguem impassíveis e convictos de que devem continuar discriminando a não-ficção. Não aceitam documentário nem na categoria “filme estrangeiro”. Discriminação semelhante não se dá com o filme de animação, um das categorias laureadas anualmente.

Outra postura questionável dos 83 votantes do Globo de Ouro: para eles, cinema é sinônimo de língua inglesa. Os filmes produzidos no mundo anglo-saxão ocupam as dez vagas de melhor filme (drama + musical-comédia). Para o cinema que se expressa em outros idiomas, resta a enxuta categoria “melhor filme em língua estrangeira”.

Pelo obsoleto regulamento dos Correspondentes Estrangeiros, se cineastas norte-americanos realizarem, em seu território natal, filmes falados em francês, russo, japonês, espanhol ou grego, eles poderão ocupar as cinco vagas na referida categoria. Esse ano, “Minari – Em Busca da Felicidade” (filme made in USA, falado em coreano) veio somar-se a produções da Dinamarca, França, Guatemala e Itália.

Viola Davis, em "A Suprema Voz do Blues"

Felizmente, na categoria atrizes e atores (principais e coadjuvantes), parece que os Correspondentes Estrangeiros começam a admitir que há talentos em outros quadrantes do planeta (não só nos EUA, Grã-Bretanha, Austrália e Nova Zelândia).

Nesse domingo, fotos do francês de origem argelina Tahar Rahim (“The Mauritain”), do paquistanês, nascido em Londres, Riz Ahmed (“O Silêncio do Som”), e do indiano Dev Patel (“A Vida Extraordinária de David Cooperfield”), também nascido em Londres, ganharão visibilidade na festa virtual. Registre-se que os três filmes são produções anglo-saxãs. Mas seus protagonistas têm pele morena.

Uma estrangeira, alemã de nascimento e carreira, a adolescente Helena Zengel, conseguiu indicação como atriz coadjuvante por seu desempenho, ao lado de Tom Hanks, no western crepuscular “Relatos do Mundo”. Ela interpreta uma menina criada por indígenas Kiowa, que é “adotada” temporariamente por um veterano de duas guerras, que corre o Oeste americano como “leitor” de jornais (o personagem de Hanks). A novata germânica impressionou o mundo por sua visceral interpretação em “System Crasher” (rebatizado e lançado no Brasil como “Transtorno Explosivo”).

A força do cinema afro-americano se faz sentir, nessa edição do Globo de Ouro, de forma notável. O ator Chadwick Boseman, morto no auge de sua carreira, graças ao sucesso planetário de “Pantera Negra”, pode ganhar o Oscar (infelizmente, póstumo) por sua vigorosa atuação em “A Suprema Voz do Blues”. O mesmo filme traz a candidata favorita a melhor atriz, Viola Davis, em magnífica recriação da cantora Ma Rainey. Andra Day destaca-se em “Os Estados Unidos Versus Billie Holiday”.

Chadwick Boseman, em "A Suprema Voz do Blues"

O placar de finalistas a melhor atriz conta, pois, com duas afro-americanas e três anglo-saxãs (Frances McDormand esbanjando talento em “Nomadland”, Vanessa Kirby, sofrendo as dores do parto e a perda de uma filha em “Pedaços de uma Mulher”, e Carey Mulligan, por “Bela Vingança”).

A safra afro-americana destacada com diversas indicações ao Globo de Ouro (e, tudo indica, também ao Oscar – finalistas serão conhecidos no próximo dia 15 de março) conta ainda com o drama “Uma Noite em Miami”, de Regina King, “Judas e o Messias Negro” (sobre Fred Hapton, do Partido Panteras Negras), com o musical “Hamilton”, protagonizado pelo ator e rapper Lin-Manoel Miranda, de origem porto-riquenha, e com a animação “Soul”, de Pete Docter, da badalada Pixar. Neste filme, estão, tanto na trama, quanto na trilha sonora, a grande música black dos EUA.

As categorias técnicas não têm vez no Globo de Ouro. O foco dos Correspondentes Estrangeiros concentra-se em filmes, atrizes-atores, roteiristas e em músicos (melhor trilha sonora e melhor canção). E, claro, em séries de TV, também divididas em Drama e Musical-Comédia, com três dezenas de atores principais e coadjuvantes. Por isso, a cerimônia de premiação (como a do Oscar) continua longuíssima.

OS FINALISTAS – CINEMA 

MELHOR DRAMA

. Nomadland, de Chloé Zhao (EUA)
. Bela Vingança, de Emerald Fennel (Inglaterra-EUA)
. Os 7 de Chicago, de Aaron Sorkin (EUA)
. Mank, de David Fincher (EUA)
. Meu Pai, de Florian Zeller (Inglaterra)

MELHOR MUSICAL-COMÉDIA

. Hamilton, de Thomas Kail (EUA)
. Palm Springs, de Max Barbakow (EUA)
. Music, de Sia (Austrália-EUA)
. A Festa de Formatura, de Ryan Murphy (EUA)
. Borat: Fita de Cinema Seguinte, de Jason Woliner (EUA)

MELHOR FILME EM LÍNGUA ESTRANGEIRA

. “Druk – Mais uma Rodada”, de Thomas Vinterberg (Dinamarca)
. “La Llorona”, de Jayro Bustamante (Guatemala)
. “Nós Duas”, de Filippo Meneghetti (França)
. “Rosa e Momo”, de Edoardo Ponti (Itália)
. “Minari, Em Busca da Felicidade”, de Lee Isaac Chung (EUA)

MELHOR ANIMAÇÃO

. “Soul”, de Pete Docter (EUA)
. “A Caminho da Lua”, de Glen Keane (EUA)
. Wolfwalkers, de Tomm Moore e Ross Stewart (EUA)
. Dois Irmãos – Uma Jornada Fantástica, de Don Scanlon (EUA)
. Os Croods 2 – Uma Nova Era, de Joel Crawford (EUA)

MELHOR DIRETOR

. Emerald Fennell (Bela Vingança)
. Regina King (Uma Noite em Miami)
. Chlóe Zhao (Nomadland)
. Aaron Sorkin (Os Sete de Chicago)
. David Fincher (Mank)

MELHOR ATRIZ (DRAMA)

. Viola Davis (A Suprema Voz do Blues)
. Andra Day (Os Estados Unidos Versus Billie Holiday)
. Frances McDormand (Nomadland)
. Vanessa Kirby (Pedaços de uma Mulher)
. Carey Mulligan (Bela Vingança)

MELHOR ATRIZ (MUSICAL-COMÉDIA)

. Michelle Pfeiffer (French Exit)
. Kate Hudson (Music)
. Rosamund Pike (I Care a Lot)
. Anya Taylor-Joy (Emma)
. Maria Bakalova (Borat)

MELHOR ATOR (DRAMA)

. Chadwick Boseman (A Suprema Voz do Blues)
. Tahar Rahim (The Mauritain)
. Riz Ahmed (O Silêncio do Som)
. Gary Oldman (Mank)
. Antony Hopkins (Meu Pai)

MELHOR ATOR (MUSICAL-COMÉDIA)

. Lin-Manuel Miranda (Hamilton)
. Dev Patel (A História Extraordinária de David Copperfield)
. James Corden (A Festa de Formatura)
. Andy Samberg (Palm Springs)
. Sacha Baron Cohen (Borat)

MELHOR ATRIZ COAJUVANTE

. Helena Zengel (Relatos do Mundo)
. Olivia Colman (Meu Pai)
. Glenn Close (Era uma Vez um Sonho)
. Amanda Seyfrid (Mank)
. Jodie Foster (The Mauritain)

MELHOR ATRIZ COAJUVANTE

. Daniel Kaluuya (Judas e o Messias Black)
. Leslie Odom Jr (Uma Noite em Miami)
. Sacha Baron Cohen (Os Sete de Chicago)
. Bill Muray (On the Rocks)
. Jared Leto (Pequenos Vestígios)

MELHOR ROTEIRO

. Nomadland (Chloé Zhao)
. Mank (Jack Fincher)
. Os 7 de Chicago (Aaron Sorkin)
. Bela Vingança (Emerald Fenell)
. Meu Pai (Florian Zeller e Christopher Hampton)

OS FINALISTAS – TELEVISÃO

MELHOR SÉRIE (DRAMA)

. The Crown
. The Mandalorian
. Ozark
. Ratched
. Lovecraft Country

MELHOR SÉRIE (MUSICAL-COMÉDIA)

. The Great
. Ted Lasso
. Schiltt’s Creek
. Emily em Paris
. The Flight Attendant

MELHOR FILME OU MINISSÉRIE PARA TV

. O Gambito da Rainha
. Nada Ortodoxa
. Normal People
. Smal Axe
. The Undoing

MELHOR ATRIZ (DRAMA)

. Olivia Colman (The Crown)
. Emma Corrin (The Crown)
. Laura Linney (Ozark)
. Sarah Paulson (Ratched)
. Jodie Comer (Killing Eve)

MELHOR ATOR (DRAMA)

. Al Pacino (Hunters)
. Josh O’Connor (The Crown)
. Matthew Rhys (Perry Mason)
. Jason Baterman (Ozark)
. Bob Odenkirk (Better Call Saul)

MELHOR ATRIZ (COMEDIA-MUSICAL)

. Elle Fanning (The Great)
. Lily Collins (Emily em Paris)
. Kaley Cuoco (The Flight Attendant)
. Catherine O’Hara (Schitt’s Creek)
. Jane Levy (Zoey e Sua Playlist Extraordinária)

MELHOR ATOR (COMEDIA-MUSICAL)

. Ramy Youssef (Ramy)
. Eugene Levy (Schitt’s Creek)
. Jason Sudeikis (Ted Lasso)
. Don Cheadle (Black Monday)
. Nicholas Hoult (The Great)

MELHOR ATRIZ (FILME OU MINISSÉRIE TV)

. Cate Blanchett (Mrs. America)
. Shira Hass (Nada Ortodoxa)
. Nicole Kidman (The Undoing)
. Anya Taylor-Joy (Gambito da Rainha)
. Daisy Edgard-Jones (Normal People)

MELHOR ATOR (FILME OU MINISSÉRIE- TV)

. Hugh Grant (The Undoing)
. Bryan Cranston (Your Honor)
. Jeff Daniels (The Comey Rule)
. Ethan Hawke (The Good Lord Bird)
. Mark Ruffalo (I Know this Much is True)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.