Novo horizonte à produção independente de TV

O mercado da produção independente de TV prepara-se para dar um expressivo salto quantitativo (e qualitativo) no Brasil, a partir da publicação recente da Instrução Normativa Nº 100, que regulamenta a Lei 12.485/11. Em linhas gerais, esta Lei constitui-se como o primeiro marco regulatório convergente do setor audiovisual, e sua regulamentação representa um momento histórico de grande importância para a produção independente.

Ao dispor sobre princípios constitucionais referentes à competitividade, direitos de acesso, e estímulo ao desenvolvimento do setor audiovisual, o novo instrumento normativo já arrecadou até o momento mais de 800 milhões de reais em contribuições provenientes das empresas de telefonia, sendo que a metade desta quantia deverá ser investida na produção ainda em 2012, via Fundo Setorial do Audiovisual. Vale lembrar que estes recursos somam-se aos 205 milhões de reais já disponíveis para investimento pelo FSA. Neste sentido, cabe uma reflexão não só sobre as formas de destinação do montante expressivo de recursos, como também sobre as características do mercado para onde será direcionada boa parte das novas produções viabilizadas, ou seja, as TVs.

Primeiramente, é preciso ressaltar que a Lei 12.485/11 surge num contexto onde historicamente não houve uma legislação que protegesse e garantisse a veiculação de produção independente na TV, ao contrário de outros países, como os Estados Unidos. Assim, os canais consolidaram dinâmicas de funcionamento vertical a partir da produção de seu próprio conteúdo, dispondo de espaço reduzido e visivelmente restrito para a produção independente (em 2010, por exemplo, foram exibidas 6.613 obras estrangeiras na TV paga e 1.482 obras brasileiras, sendo que apenas o Canal Brasil exibiu 1.400 obras, segundo dados da ANCINE).

As poucas produções independentes veiculadas na TV paga e aberta resultam, na maior parte das vezes, da utilização de mecanismos de incentivo que foram criados com o objetivo de estimular uma aproximação entre a produção independente e os canais de TV, tais como o Art. 39 da MP 2.228-1/01 e o Art. 3º-A da Lei do Audiovisual. Neste sentido, destaca-se também a atuação de entidades de classe como a ABPITV (Associação Brasileira de Produtoras Independentes de TV), que há treze anos vem trabalhando pelo desenvolvimento da produção independente, e sua aproximação com os players do mercado.

Além dos mecanismos de fomento indireto, existem também outras maneiras de viabilizar a produção de conteúdos independentes para TV, tais como a coprodução internacional, quando um ou mais países se unem em prol da produção de uma mesma obra. Existem acordos oficiais que garantem a binacionalidade destas produções, porém apenas os acordos firmados com Chile, Canadá, Alemanha e Índia, além do acordo multilateral Latino Americano, contemplam o mercado de TV.

​A partir da regulamentação da Lei 12.485/11, haverá não só o estímulo à coprodução entre os independentes e os canais, como também a garantia de exibição de conteúdo brasileiro e independente no horário nobre. A criação de cotas de conteúdo e de canais brasileiros nos pacotes das programadoras, aliada ao crescimento da produção, favorecerá, significativamente, o desenvolvimento do setor audiovisual de uma ponta a outra da cadeia produtiva, posicionando o Brasil como uma grande potência neste setor.

Do ponto de vista do consumidor, o mercado de operação de TV paga, finalmente, sinaliza o abandono de um período de estagnação, caracterizado pelo baixo número de assinaturas existentes no país. Até o final de 2009, a expansão dos serviços de comunicação eletrônica de massa se mostrava insuficiente, considerando que o conjunto de assinantes representava apenas 12,7% dos domicílios com TV no país, um índice considerado baixo se comparado aos padrões mundiais. Na Colômbia, por exemplo, 72% dos domicílios possuíam TV por assinatura em 2009, e na Argentina este percentual chegava a 77%, conforme um estudo realizado pela ANCINE.

Ainda que o ano de 2011 tenha registrado um crescimento de 30,4% nas assinaturas de TV paga em relação a 2010, segundo dados da ANATEL, existem hoje cerca de 14 milhões de assinaturas no país. As perspectivas trazidas pela nova Lei apontam um cenário promissor, principalmente, para os consumidores da classe C, uma vez que o preço das assinaturas tende a reduzir com a entrada das empresas de telefonia neste setor, aumentando a competitividade e democratizando o acesso ao serviço de TV por assinatura.

Diante destas mudanças, o conteúdo audiovisual conquistará mais espaços, criando uma demanda expressiva por novas produções, como jamais houve na história da produção independente de TV. O grande desafio, neste novo cenário, será preparar o produtor para suprir a demanda, tanto em termos de quantidade quanto de qualidade.

É neste contexto que se torna cada vez mais importante tanto a capacitação criativa, voltada para a formação de roteiristas, quanto a qualificação técnica e empresarial, que especialize o produtor do ponto de vista da gestão do projeto e do negócio audiovisual, fortalecendo a figura do “produtor-empreendedor”.

O momento é de comemoração, mas também de grandes expectativas. Nos últimos anos, a produção independente de TV ganhou novos mecanismos de incentivo, se internacionalizou, conquistou audiências e alcançou um nível de profissionalismo jamais visto na história da indústria audiovisual brasileira.

Com a aprovação da Lei 12.485/11, o Plano Nacional de Banda Larga, a TV Digital e os eventos Olimpíadas e Copa do Mundo, presenciaremos em breve um crescimento ainda mais expressivo desse mercado. Ainda há muito a ser construído, por isso, é fundamental relacionar a busca da qualidade técnica e artística às iniciativas de capacitação que preparam o produtor para atuar neste importante setor, que tanto contribui para o crescimento econômico, cultural e social do país.

 

Por Daniela Pfeiffer, Coordenadora de Projetos na ABPITV e da Pós-Graduação em “Produção Audiovisual: Projeto e Negócio”, no Senac São Paulo (pfeiffer.cultural@gmail.com)

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