O objeto e o desejo

Marilyn Monroe é uma celebridade dos nossos tempos. Os cachos de seus cabelos loiros, a pinta, o nome, as poses, o sorriso… Uma imagem cuidadosamente construída. Uma imagem mais famosa do que qualquer personagem que ela tenha representado. Desde sua morte, em 1962 (este ano a data somará 50 anos), nenhuma outra figura no cinema foi capaz de alcançar seu poder icônico ou mesmo reproduzi-lo. “Sete Dias com Marilyn” é o mais novo filme a tratar o tema. Embora aborde, inicialmente pelo menos, a disjunção entre a face pública de Marilyn Monroe e sua tempestuosa vida privada, o cineasta Simon Curtis finca a câmera no terreno do filme biográfico e privilegia um drama simples que só consegue ver Marilyn como um inescrutável objeto de desejo.

O filme é baseado em dois livros de memórias do documentarista britânico Colin Clark (Eddie Redmayne). Em 1956, Colin, então um mero terceiro assistente de direção de Lawrence Olivier (Kenneth Branagh), narra um suposto interlúdio amoroso com Marilyn Monroe (Michelle Williams) durante as filmagens de “A Princesa Encantada”. Recém casada com o dramaturgo Arthur Miller (Dougray Scott), Marilyn esperava que o filme, baseado numa peça de Terence Rattigan, ajudaria a promovê-la como atriz. Ela aterriza no set horas atrasada, erra suas falas e está sempre acompanhada por Paula Strasberg (Zoë Wanamaker) – mulher e uma das principais defensoras do método de interpretação de Lee Strasberg. Lawrence Olivier, diretor e protagonista de “A Princesa Encantada” despreza o método e a atriz, apesar da inveja que sente pela intimidade que Marilyn consegue manter instintivamente com a câmera.

Simon Curtis (formado na escola da televisão britânica) mostra-se um bom diretor de atores (Williams e Branagh, ambos indicados ao Oscar deste ano, estão estupendos) e o longa funciona melhor nessa disputa entre dois atores e seus métodos. O cineasta se esforça para fazer um filme simpático e pouco afeito ao conflito. O que se vê é um cinema, digamos, de “qualidade”, onde tudo está certo, funcionando, leve e bonito. Um tanto rápido, também, é preciso dizer. “Sete Dias com Marilyn” imprime um ritmo acelerado aos acontecimentos, mais preocupado em registrá-los do que construí-los. Curtis aposta ainda em citar e manter Marilyn Monroe em poses famosas, seja nua, com os cabelos desgrenhados ou cantando. Uma estratégia que, embora nos mostre como a atriz era consciente de sua imagem e poder, prejudica algumas vezes o movimento no qual o filme se baseia, do mito à pessoa.

O maior problema talvez esteja no roteiro de Adrian Hodges. A narrativa se alterna entre a experiência pessoal e o amadurecimento de Colin e o dilema de Marilyn, uma mulher que depende e ao mesmo tempo sofre da imagem que o mundo faz dela. Mas “Sete Dias com Marilyn” nunca abandona o ponto de vista do rapaz – embora quase todos os demais personagens tenham mais presença e carisma do que ele. Ele abre e fecha o filme com narrações em off e frases do tipo “Eu tinha tudo para provar a minha família … mas mais para mim mesmo”, e Hodges insiste em fazê-lo presente para entreouvir todos os momentos dramáticos da história. É bem verdade que, por vezes, vislumbra-se a possibilidade de “Sete Dias com Marilyn” ter sido mais do que um filme simpático, porém demasiadamente convencional (especialmente no que concerne as interpretações e as situações e os personagens da trama), mas falou mais alto o desejo por um “cinema de qualidade”, funcional, perecível, sem conflito.

Sete Dias com Marilyn | My Week with Marilyn
(Reino Unido, 2011)
Direção: Simon Curtis
Distribuição: Imagem Filmes

 

Por Julio Bezerra

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.