Vinícius Reis filma drama familiar e cultura popular

O cineasta Vinícius Reis, diretor de “Praça Saens Peña” e “A Cobra Fumou”, está finalizando seu próximo filme, “Noites de Reis”, um drama que o levou de volta à infância. Não exatamente por causa da temática – o lento processo de reestruturação familiar após uma morte trágica –, e sim devido à importância que a manifestação popular da Folia de Reis adquire no filme. “Eu sou de São Paulo, mas passei boa parte da infância no interior de Minas Gerais, no sítio da minha avó. Nós preparávamos a casa para a chegada da Folia. Era bonito e assustador, ao mesmo tempo. Evoco, então, o meu olhar de criança”, explica Vinícius, referindo-se à festividade de caráter profano-religioso, ligada às comemorações do ciclo natalino. O diretor planeja levar o filme, produzido com verbas do edital de Baixo Orçamento do MinC em 2010, para festivais, antes de lançá-lo no circuito comercial no primeiro semestre de 2013.

A Folia atravessa a jornada da família de Dora (Bianca Byington) e Jorge (Enrique Diaz), casal que perde o filho mais novo no incêndio da própria casa, no centro histórico de Paraty. Jorge enlouquece e se distancia. Dora tenta, aos poucos, reconstruir a vida ao lado da filha, Julia (Raquel Bonfante). Durante ausência do pai, Julia se lembra dele através da Folia de Reis. Natural: Jorge tocava rabeca na Folia. Cinco anos depois, ele volta. “O filme é sobre a reconciliação com a vida após o luto”, resume Vinícius Reis, acerca da história, não por acaso ambientada em Paraty. “A cidade tinha uma Folia forte que foi se apagando ao longo do tempo. Hoje sobrevive apenas como uma ciranda”, explica Vinícius. Foi ainda em Paraty onde a roteirista Rita Toledo viveu momentos da infância ao lado da família.

Henrique Dias, nas ruas de Paraty, interpreta o pai que perde o filho. © AC Junior

Aproximação com etnografia

A Folia de Reis adquire no filme a mesma relevância que o coro na tragédia grega. “Noites de Reis” (que já se chamou “Sobre Ruínas”) começa registrando uma Folia, a primeira a que Dora assiste após a perda do filho. Ao invés de encenar a Folia, Vinícius Reis reproduziu a do Morro Santa Marta em plena Paraty, assumindo inspiração no filme “A Folia no Morro” (2007), de Arthur Omar. “Os primeiros minutos de ‘Noites de Reis’ se aproximam do cinema etnográfico”, afirma. Por meio da Folia, Vinicius mistura procedimentos do documentário – terreno no qual se exercitou em projetos como “A Cobra Fumou” (2002), reunião de depoimentos de pracinhas da Força Expedicionária Brasileira (FEB) – aos da ficção. A mescla foi praticada anteriormente em “Praça Saens Peña” (2008), que, como o título indica, radiografava a conhecida região da Grande Tijuca através de personagens reais e inventados.

Antes do início das filmagens, Vinícius Reis investiu num processo de preparação com Bianca Byington e Enrique Diaz. “Nós nos encontramos bastante para ler e conversar sobre o roteiro. Queria que os atores se apropriassem ao máximo dos personagens”, conta. Também fazem parte do elenco Luciana Bezerra e Sidney Martins. As escalações remetem ao percurso de Vinícius. Luciana faz parte do Grupo Nós do Morro, cujo Núcleo de Cinema Vinícius fundou ao lado da diretora Rosane Svartman. “Dei aula no Nós do Morro de 1996 até 2010. Hoje estou afastado dessa função, mas vou lá duas vezes por mês para debater sobre filmes com os alunos”, informa. Sidney, radicado na Europa há 20 anos, é amigo dos tempos de Tablado, escola que Vinícius cursou entre 1981 e 1991 como aluno e assistente de direção. “E a família de Sidney é ligada à Folia de Reis”, frisa Vinícius, chamando atenção para o coração de “Noites de Reis”.

 

Por Daniel Schenker

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