Mostra exibe “Macunaíma” restaurado
No ano em que Joaquim Pedro de Andrade completaria 80 anos, o Cine Olido faz uma retrospectiva completa com os 14 filmes do diretor. De 5 a 11 de outubro, o espectador poderá apreciar o trabalho de resgate e restauração dos longas e curtas do cineasta. A Mostra traz a exibição em 35mm de todos os longas-metragens restaurados.
Ninguém traduziu em cinema a diversidade da cultura brasileira com mais ironia que Joaquim Pedro. Macunaíma (1969), com Grande Otelo e Paulo José em grande forma, é visto como o auge cinematográfico, mas o que dizer da tradução que fez do mundo de Dalton Trevisan em Guerra Conjugal? Ou de Carlos Drummond em O Padre e a Moça? Joaquim Pedro foi o mestre da encenação da comédia humana tupiniquim. Assim, criou a antológica cena da orgia em volta de uma piscina cheia de feijoada em Macunaíma e a divertida transa de Cláudio Cavalcanti com uma melancia no impagável Vereda Tropical. Por trás do desbunde artístico havia sempre uma conotação política forte e alegórica.
A obra de Joaquim Pedro de Andrade é um constante diálogo com o Modernismo brasileiro. O cineasta, que pode ser considerado como um dos mais importantes autores do Cinema Novo, responsável inclusive pela construção de sua proposta estética e política, traz para as telas uma releitura das propostas modernistas desenvolvidas na sociedade brasileira a partir dos anos vinte. A abordagem das temáticas e obras modernistas em seus filmes suscitaram controvérsias e debates nas décadas de sessenta e setenta, profundamente influenciados pela conjuntura da época: a releitura do Modernismo, feita por Joaquim Pedro de Andrade, se realiza num quadro político e cultural que mistura a agitação política e cultural dos movimentos sociais antes de 1964, o golpe militar e a ditadura, a oposição da sociedade ao regime militar, a efervescência artística e cultural da época, alimentada inclusive pela onde de rebeldia juvenil existente nos Estados Unidos e Europa, bem como a formulação de novas propostas estéticas principalmente na área cinematográfica. É neste contexto que se sobressai Joaquim Pedro, seus filmes e sua visão de sociedade brasileira.
Veja os filmes do diretor que serão exibidos na mostra:
O MESTRE DE APIPUCOS
(Brasil, 1959, 8’, PB, documentário, DVD)
Direção: Joaquim Pedro de Andrade
Com roteiro estruturado sobre textos de Gilberto Freire, o filme documenta a vida diária e o método de trabalho do escritor e sociólogo em sua casa de Apipucos.
O POETA DO CASTELO
(Brasil, 1959, 10’, PB, documentário, DVD)
Direção: Joaquim Pedro de Andrade
Versos de Manuel Bandeira, lidos pelo poeta, acompanham e transfiguram os gestos banais de sua rotina em seu pequeno apartamento no centro do Rio.
GARRINCHA, ALEGRIA DO POVO
(Brasil, 1963, 58’, PB, documentário, 35 mm)
Direção: Joaquim Pedro de Andrade
Tratando o futebol como fenômeno social, o documentário mostra a beleza do jogo do ídolo, o sofrimento e a euforia de torcedores, e denuncia usos políticos da paixão popular pelo esporte.
MACUNAÍMA
(Brasil, 1969, 108’, cor, 35mm)
Direção: Joaquim Pedro de Andrade
Elenco: Grande Otelo, Paulo José, Jardel Filho, Milton Gonçalves, Dina Sfat, Rodolfo Arena, Joana Fomm
Adaptação de Mário de Andrade, o filme inova a estética do Cinema Novo ao incorporar elementos da chanchada, por meio da atuação de Grande Otelo, e ao utilizar o kitsch do Tropicalismo, mesclando fatos da vida política com o relato épico das andanças de Macunaíma entre figuras da mitologia popular brasileira.
O PADRE E A MOÇA
(Brasil, 1965, 90’, PB, 35mm)
Direção: Joaquim Pedro de Andrade
Elenco: Helena Ignes, Paulo José, Mário Lago
Mariana (Helena Ignês) é a única mulher bonita e jovem do lugar. E não está conformada. Não sabe exatamente o que quer, mas sabe que não quer morrer com a cidade, sem ter conhecido o que a vida tem de bom. Mariana vê no padre (Paulo José), recém-chegado à cidade, a sua salvação. Sente-se atraída. Quer falar-lhe, quer sentir alguma coisa a mais, que não seja a realidade mesquinha da cidadezinha. Honorato (Mário Lago) proíbe Mariana de avistar-se com o padre. Faz mais: resolve casar-se com ela. É neste instante que a estória começa a subir até a aguda dramaticidade do epílogo.
A LINGUAGEM DA PERSUASÃO
(Brasil, 1970, 9’, cor, DVD)
Direção: Joaquim Pedro de Andrade
Filme originalmente encomendado pelo Serviço Nacional de Aprendizado Comercial (Senac) sobre a função dos meios de comunicação como forma de aperfeiçoamento profissional. O documentário subverte o seu objetivo inicial e propõe uma reflexão crítica sobre a sociedade brasileira dos anos 1970.
VEREDA TROPICAL
(Brasil, 1977, 18’, cor, 35mm)
Direção: Joaquim Pedro de Andrade
Episódio do longa-metragem Contos Eróticos.
Crônica de uma tara gentil, encontro lírico nas veredas escapistas de Paquetá, imagética verbalização e exposição vergonhosamente impudica das fantasias eróticas, Vereda Tropical contém a denúncia da vocação genital dos legumes, a inteligência das mocinhas em flor, o gosto da vida e a suma poética de Carlos Galhardo. Educativo e libertário.
GUERRA CONJUGAL
(Brasil, 1975, 90’, cor, 35mm)
Direção: Joaquim Pedro de Andrade
Elenco: Cristina Aché, Wilza Carla e Maria Lúcia Dahl
“Guerra Conjugal” ilustra crônicas de psicopatologia amorosa na civilização do terno-e-gravata, ainda vigente na mitológica e ubíqua cidade de Curitiba, onde medram flores de plástico e elefantes vermelhos de louça podem surgir a qualquer momento.
O ALEIJADINHO
(Brasil, 1978, 22’, cor, DVD)
Direção: Joaquim Pedro de Andrade
Documentário sobre a vida e a obra do escultor Antônio Francisco Lisboa. Dos profetas de Congonhas do Campo aos ornatos das Igrejas de Ouro Preto, a paixão e o martírio vividos pelo Aleijadinho são evocados como o tributo a um grande criador.
OS INCONFIDENTES
(Brasil, 1972, 100’, cor, 35mm)
Direção: Joaquim Pedro de Andrade
Elenco: José Wilker, Luiz Linhares e Paulo César Peréio
Reconstituição da Inconfidência Mineira que contesta versões oficiais sobre o episódio histórico. Com base nos Autos da Devassa, em poesias de Cecília Meireles e dos Inconfidentes, o filme trata da posição de intelectuais diante da prática de políticas revolucionárias.
O HOMEM DO PAU-BRASIL
(Brasil, 1981, 112’, cor, 35mm)
Direção: Joaquim Pedro de Andrade
Elenco: Juliana Carneiro da Cunha, Ítala Nandi e Flávio Galvão
Comédia, delírio rigoroso sobre a vida, paixão e obra do revolucionário escritor modernista Oswald de Andrade, representado simultaneamente por um ator e uma atriz, Ítala Nandi e Flávio Galvão. Os dois Oswalds partilham com Juliana Carneiro da Cunha, Regina Duarte, Cristina Aché, Dina Sfat e Dora Pellegrino as mesmas camas e idéias, até que estas os separem. Com a devoração de Oswald-macho pelo Oswald-fêmea, dá-se a criação da Mulher do Pau Brasil, líder da revolução que instalará o matriarcado antropófago como regime político do país.
BRASÍLIA: CONTRADIÇÕES DE UMA CIDADE NOVA
(Brasil, 1967, 23’, cor, 35mm)
Direção: Joaquim Pedro de Andrade
Imagens de Brasília em seu sexto ano e entrevistas com diferentes categorias de habitantes da capital. Uma pergunta estrutura o documentário: uma cidade inteiramente planejada, criada em nome do desenvolvimento nacional e da democratização da sociedade, poderia reproduzir as desigualdades e a opressão existentes em outras regiões do país?
COURO DE GATO
(Brasil, 1960, 12’, cor, DVD)
Direção: Joaquim Pedro de Andrade
Às vésperas do carnaval, garotos de uma favela roubam gatos para fabricantes de tamborins. Exercício de realismo lírico, síntese de ficção e documentário, o filme narra o amor de um menino por um angorá e seu dilema ao ter que vender o bichano. Episódio do longa-metragem Cinco Vezes Favela.
IMPROVISIERT UND ZIELBEWUSST (CINEMA NOVO)
(Brasil, 1967, 30’, PB, DVD)
Direção: Joaquim Pedro de Andrade
Documentário produzido para o Canal 2 – TV Alemã sobre o movimento cinematográfico denominado Cinema Novo. A difícil construção de um cinema no subdesenvolvimento. O documentário, que confirma o interesse crescente pelo Cinema Novo no exterior, acompanha as filmagens de “El Justicero” e “Terra em Transe”; o roteiro de “Garota de Ipanema”; a montagem de “Opinião Pública”; a dublagem de “Todas as Mulheres do Mundo” e o lançamento de “A Grande Cidade”. Com participação de Vinícius de Morais, Maria Bethânia, Paulo Cesar Saraceni, Leon Hirszman, Glauber Rocha, Arnaldo Jabor, Domingos de Oliveira, entre outros.