Projeto Cinema em Casa apresenta mostras de filmes árabes e suíços
Por Maria do Rosário Caetano
Os cinéfilos nunca dispuseram de tantas opções online para atenuar o confinamento da pandemia. O CineSesc, por exemplo, oferece a espectadores espalhados por todo território brasileiro, nesse exato momento, três mostras especiais – Cinema do Mundo Árabe, Panorama do Cinema Suíço, com homenagem ao ator Bruno Ganz e ao diretor Alain Tanner, e filmes premiados no Festival Sesc Melhores do Ano (produções nacionais e internacionais).
O projeto Cinema em Casa, que abarca as três mostras, foi criado há três meses e já disponibilizou dezenas de filmes, de clássicos de Fellini, como “Os Palhaços”, passando pelo chileno “O Pacto de Adriana” e o sueco “Eu Sou Ingrid Bergman”, e chegando a filmes brasileiros como “Aquarius”, de Kleber Mendonça. Os títulos exibidos já alcançaram 450 mil visualizações.
Agora, chegou a vez de lançar no espaço virtual duas mostras que, historicamente, movimentavam o CineSesc paulistano: “Mundo Árabe de Cinema” e “Panorama do Cinema Suíço”. Elas chegam para somar-se ao Festival Sesc Melhores do Ano, criado há 46 anos, para exibições presenciais no mês de abril. Com a pandemia do Covid-19, o mais antigo festival de São Paulo (e o terceiro mais antigo do país, depois de Brasília e Gramado) transferiu-se para o espaço virtual.
A programação é de dar água na boca. Vai do brasileiro “Bacurau” ao coreano “Parasita”, passando por documentário imperdível (“Estou me Guardando para Quando o Carnaval Chegar”) e desaguando nos ótimos “Temporada”, momento especial do novo cinema mineiro, e “A Vida Invisível”, premiado na mostra Un Certain Regard, em Cannes.
Entre os títulos estrangeiros, dois se impõem por suas imensas qualidades: o perturbador “Border”, um filme de horror sueco, diferente de tudo que já vimos, e o dinamarquês “Rainha de Copas”, escorado no trabalho de uma atriz formidável, Trini Dyrholm, e em história de imensa complexidade. Quem não viu, deve colocar esses filmes em sua agenda cinematográfica, até porque se ofertam em exibições gratuitas.
Para enriquecer ainda mais a programação do Cinema em Casa, o CineSesc programou, em parceria com o Telecine, o descolado “Rafiki”, dirigido pela queniana Wanuri Kahiu. O filme, vindo de importante Mostra dos Cinemas Africanos, realizada também no cinema da Rua Augusta (e em salas baianas e gaúchas), homenageia o Dia da Visibilidade Lésbica (esse sábado, 29 de agosto).
“Rafiki” (amigos) vai agradar a mulheres homoafetivas e ao público em geral, pois conta uma bela história de amor com muita cor, alegria e ritmo. Duas jovens, uma de família rica e outra mais modesta, apaixonam-se. As leis do Quênia não admitem o amor homossexual. Para agravar, as família delas se rivalizam no campo político. Mas as jovens não se darão por vencidas.
Detalhe importante: esse filme só será disponibilizado por 24 horas. Então, fiquem atentos. Os outros títulos do Cinema em Casa serão disponibilizados por prazos variáveis (e maiores).
A mostra de filmes árabes, criada há 15 anos, começa nesta sexta-feira e prossegue até 27 de setembro. A sessão inaugural apresentará o documentário “Gaza”, dos irlandeses Garry Keane e Andrew McConnell. Depois, serão disponibilizados “O Dia em que Perdi minha Sombra”, de Soudade Kaadan, “Western Arabs – Árabes Ocidentais”, de Omar Shargawi, e “Beirute, la Vie en Rose”, de Eric Motjer.
Nessa segunda-feira, 31 de agosto, o IcArabe (Instituto Cultural Brasil-Países Árabes), parceiro do CineSesc no festival, disponibilizará o mais aguardado dos títulos inéditos: “O Dia em que Perdi minha Sombra” (90′). Trata-se de ficção vinda da Síria, para contar a história de Sana, jovem farmacêutica. Ela tenta comprar um botijão de gás. Como o país inicia mais uma guerra civil, o que seria um ato da vida cotidiana transforma-se em situação fora de controle. A narrativa, “traz ressonâncias do cinema de Lucrécia Martel”, se desenvolve nos planos da realidade e dos sonhos. O filme conquistou o Prêmio Luigi De Laurentis de “opera prima” (obra de diretor estreante) no Festival de Veneza/2018.
Completam a Mostra Mundo Árabe, uma seleção de filmes exibidos em edições anteriores do festival. Da primeira, um título que merece ser visto ou revisto: “Selves and Others – Um Retrato de Edward Said” (2004, 54′). Autor de obras fundamentais como “Orientalismo: O Oriente Como Invenção do Ocidente” e “Cultura e Imperialismo”, Said nasceu em território palestino (então possessão britânica), em 1935, e morreu nos EUA, em 2003. No filme, lançado um ano depois de sua morte, ele fala da doença que abreviaria seus dias, expõe suas teorias e defende a causa palestina.
Da quarta mostra, vem “Trilogia do Deserto”, da quinta, “Dunia” e “Ponto de Encontro”. Da sétima, “Sobre Futebol de Barreiras” e “Nadia e o Levante”. Da oitava, “Os Caminhos do Mascate”. O público terá um mês inteiro para conhecer os filmes sírios, libaneses, do Catar e até brasileiros (caso de “Budrus”, de Júlia Bacha) realizados no Oriente Médio. Cada longa-metragem será disponibilizado ao longo de uma semana.
O Panorama Digital do Cinema Suíço, em sua oitava edição, disponibilizará 14 longas e diversos curtas (agrupados em um programa). Vários filmes são inéditos, mas há um núcleo histórico, que homenageará dois nomes – Alain Tanner e Bruno Ganz – de grande importância na história do cinema do pequeno país europeu (de menos de nove milhões de habitantes).
Tanner, hoje com 90 anos, dirigiu Bruno Ganz (1941-2019), ator de grande sucesso internacional (graças, em especial, ao cult wendersiano “Asas do Desejo”). Dos dois, será exibido “A Cidade Branca” (1983). Tanner – cultuado pela cinefilia brasileira por causa de “Jonas que Terá 25 Anos no Ano 2000” – marcará presença, também, com “Charles Está Morto” (1969), um de seus primeiros filmes.
A seleção suíça traz documentários e ficções. E alguns nomes femininos em relevo. Caso de “No Meio do Horizonte”, de Delphine Lehericey, e “Temporada de Caça”, de Sabine Boss. Destaque para “Praça Needlebaby”, de Pierre Monnard, baseado em livro best-seller de mesmo nome (assinado pela dupla Halbheer e Mueller). O diretor centra sua narrativa em uma menina e sua mãe, que frequentam praça de usuários de droga.
“Bruno Manser – A Voz da Floresta”, de Niklaus Hilber, mostra a vocação do cinema helvético em ambientar suas histórias em países distantes. Nesse caso, na selva de Bornéu, na Ásia. Bruno Manser, ao ver a sobrevivência da tribo Penan em risco, transforma-se em abnegado ambientalista, disposto a confrontar poderosas madeireiras.
“Contrapor”, de Peter Guyer e Thomas Burkhalter, também ambientado fora do solo europeu, leva seus dois autores a Acra, capital de Gana. Lá, eles registram o trabalho de grupos musicais que colocam temas candentes da política africana em pauta. Em estúdio ou nas ruas, os artistas refletem sobre o passado colonial e suas consequências e questionam a política externa dos EUA.
“A Jornada”, de Fanny Brauning, acompanha viagem de um fotógrafo e sua amada paraplégica pelo mundo, sempre abrigados em um trailer. O documentário “Madame”, de Stéphane Riethauser, premiado no Festival de Madri, remexe na questão da identidade de gênero.
Mostra de Cinema do Mundo Árabe (até 27 de setembro), Panorama do Cinema Suíço (até dia 6 de setembro) e 46ª edição do Festival Sesc Melhores Filmes (até 20 de setembro)
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