Liliana Sulzbach debate método de criação de Carlos Nader e Eduardo Coutinho

Por Maria do Rosário Caetano

A cineasta gaúcha Liliana Sulzbach, diretora do belo “A Cidade” e do contundente “O Cárcere e a Rua”, lança nessa quarta-feira, 26 de maio, a série “O Método”, composta de quatro episódios protagonizados pelos documentaristas Carlos Nader e Eduardo Coutinho, com participações especiais de Glenn Greenwald e Bill Nicols.

A série – que será exibida pelo Canal Curta!, ao longo das próximas quartas-feiras, sempre às 22h – promove substantiva reflexão sobre o cinema documentário.

Carlos Nader, único cineasta brasileiro a vencer, por três vezes, o Festival É Tudo Verdade (com “Pan-Cinema Permanente”, “Homem Comum” e “A Paixão de JL”), fala de seu processo criativo, espelhando-se – apesar de significativas diferenças de método – em Eduardo Coutinho, com quem dialogou criativamente e a quem filmou em “Eduardo Coutinho: 7 de Outubro”, produção realizada em 2015. Para Nader, diretor de “Ópera Aberta: Os Pescadores de Pérolas”, finalista ao Emmy Internacional, o criador de “Jogo de Cena” é um dos maiores documentaristas do mundo.

A reflexão mostrada nos quatro episódios da série – explica Liliana, mestre em Cinema pela UFRGS, com especialização na Universidade de Berlim – “elabora conceitos caros ao documentário como realidade, linguagem, ética, história e a relação do autor com a sua obra”.

A documentarista gaúcha destaca que a relação do cineasta Carlos Nader com o mestre Eduardo Coutinho serviu-lhe “como instigante ponto de partida”. Ela fez questão de buscar, ainda, depoimentos de Glenn Greenwald, para que ele falasse de “Citizen Four” (2014), o importante documentário que realizou com Laura Poitras, tendo o analista de sistemas Edward Snowden como figura central. O jovem norte-americano revelou segredos digitais da CIA, que, depois do 11 de setembro, montou invasivo e ultrajante Sistema de Vigilância Global. A Bill Nichols, pensador do cinema documentário, coube, em “O Método”, abordar a questão da ética e da história nos filmes documentais.

Que ninguém tema assistir a uma série cabeçuda e monótona. Primeiro, porque Carlos Nader expõe ideias complexas com rara coloquialidade, muita simpatia e, o que é melhor, sem nenhum pedantismo. As intervenções, aparentemente ranzinzas, de Eduardo Coutinho são saborosas e iluminadoras. E, o que o filme tem de melhor: muitas e enriquecedoras imagens. Liliana Sulzbach e sua equipe não mediram esforços para conseguir direito de uso de trechos de diversos filmes internacionais.

Trechos dos principais títulos, de curta e longa-metragem, de Carlos Nader enchem a tela. Não há como não divertir-se com do ‘baianárabe’ Wally Salomão, protagonista de “Pan-Cinema Permanente”. Como, ainda, não envolver-se com os protagonistas da saga do “Homem Comum” (pai caminhoneiro e sua filha) e as memórias gravadas (e legadas) pelo artista plástico José Leonilson, o JL? O mesmo acontece com alguns dos filmes de Eduardo Coutinho (em especial “Cabra Marcado para Morrer”, “Santo Forte” e “Dona Marta – Duas Semanas no Morro”).

Impossível não arrepiar-se ao ouvir a cozinheira Dona Thereza narrar (a Coutinho, em “Santo Forte”) o destino de amiga tomada/fulminada por entidade (a Pomba Gira) em plena agência bancária, quando receberia certa (e necessária) soma em dinheiro.

Do cinema internacional, são mostrados trechos de filmes (os primeiros documentários da história) dos irmãos Lumière, passando por Robert Flaherty (“Nanook”), por Dziga Vertov (“O Homem e sua Câmara”, considerado o maior documentário de todos os tempos) e chegando aos filmensaios de Chris Marker (destaque para “O Último Bolchevique”, sobre o soviético Alexander Medvedkine). Imagens do mais fino trato.

Abaixo, a descrição de cada episódio:

. Dia 26 de maio (22h): O Real e a Ficção (30 minutos) – O documentário se instala numa fronteira entre ficção e realidade. Uma zona de risco, na qual as questões não estão bem definidas. Trabalhar em zona de risco nem sempre é fácil, mas torna-se fundamental para quem quiser produzir obra de valor artístico. Com Carlos Nader e Eduardo Coutinho.

. Dia 2 de junho (22h): A Linguagem (28 minutos) – Fazer documentários é atribuir linguagem, é moldar a realidade dentro de uma narrativa linguística. Carlos Nader discute a gramática audiovisual e o rigor necessário para estruturar um filme e transformar o que é percebido do mundo em linguagem. Com Carlos Nader e Eduardo Coutinho.

. Dia 9 de junho (22h): A Ética e a História (26 minutos) – Muitas são as razões para um autor realizar um documentário. Pode ser uma razão investigativa, uma razão política, existencial ou identitária. Mas seja ela qual for, um bom documentarista sempre estará a serviço de uma boa história. E uma história deve oferecer transcendência para o espectador, para que ele possa se relacionar com ela e ver naquilo uma verdade da vida. Não uma verdade dos fatos, mas uma verdade dos grandes temas da vida. Com Carlos Nader, Bill Nichols e Glenn Greenwald.

. Dia 16 de junho (22h): O Autor e a Obra (26 minutos) – Nos últimos anos de sua vida, Eduardo Coutinho inaugurou um cinema baseado em entrevistas. Neste episódio, ele explica as regras e o dispositivo que desenvolveu e aplicou em seus filmes. Essas regras, no entanto, não são dogmas. Carlos Nader dialoga com a obra do Coutinho para explicar seu dispositivo e alertar para momentos em que é preciso se despir de dogmas para se aproximar do real.

 

FILMOGRAFIA

Liliana Sulzbach (Blumenau, SC, 27 de dezembro de 1965, radicada em Porto Alegre)

2021 – “O Método” (série de TV)
2015 – “Notas de Amor” (série de TV)
2012 – “A Cidade” (curta)
2012 – “Sonho de Guri” (série de TV)
2004 – “O Cárcere e a Rua” (longa documental)
2000 – “Branco” (curta)
1997 – Continuidade (curta)

Carlos Nader (videomaker e cineasta, São Paulo – SP, 1965)

Longas-metragens:

2019 – “Ópera Aberta: Os Pescadores de Pérolas” (finalista ao Emmy Internacional)
2015 – “A Paixão de JL” (vencedor do É Tudo verdade)
2015 – “Eduardo Coutinho: 7 de Outubro”
2014 – “Homem Comum” (vencedor do É Tudo Verdade)
2012 – “Soberano 2 – A Heróica Conquista do Mundial de 2005”
2010 – “Soberano – Seis Vezes São Paulo”
2009 – “Pan-Cinema Permanente” (vencedor do É Tudo Verdade)
2004 – “Preto e Branco”

Curtas e Média-metragens:

2012 – “Tela”
2009 – “Chelpa Ferro” (média-metragem)
1998 – “Carlos Nader”
1996 – “O Fim da Viagem”
1994 – “Trovoada”
1992 – “Beijoqueiro”

One thought on “Liliana Sulzbach debate método de criação de Carlos Nader e Eduardo Coutinho

  • 13 de março de 2022 em 21:16
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    Criar é estar livre para isso. Sobretudo da conexão e dependência das políticas de patrocínio de partidos políticos e de Brasília. E, claro!, sobretudo, do PT!

    E… a:
    Arte.
    Literatura.
    Com ficam?

    Saúde & educação. Geral. E irrestrita. Isso sim.

    O Brasil precisa urgente voltar a qualidade de sua vida diária boa. Educação nas Escolas. Ter músicas realmente boas no dia a dia. E bons hospitais. O Brasil precisa urgente voltar a qualidade de sua música. PT venera a Indústria Cultural. Melhor para dominar. Literatura e alta cultura é de que o Brasil necessita a tempo nas nossas escolas e na educação das curuminhas. E de música boa. Esteticamente boa. A frente de tudo a qualidade de 1ª. Estética.

    O Jogo de Cartas da Educação Infantil: Seria o bom gosto nas escolas. Tal qual Tarkovsky. Ou como o cinema antigo (de qualidade brasileiro).

    Eis: 1º lugar educação dos mais jovens, para se ter solidez no futuro próximo. Necessitamos muito de bons hospitais. E escolas boas para os curumins. Precisamos de alta-cultura. Alta literatura; Kafka, Drummond, Dostoievski, Machado de Assis, Aluísio Azevedo do Maranhão. De arte autônoma. E educação verdadeira nas escolas dos pequenos. O que não houve. O Brasil vive consequência de nosso passado político bem atual (2 décadas). Fome, falta de moraria, atraso, breguices, escolas ruins, falta de hospitais: concreto… O resto são frasinhas® poderosas: Eis aí a pura e profunda realidade sociológica e filosófica: A “Copa das Copas®” do PT® em vez de se construir hospitais, construiu-se prédios inúteis! A Copa das Copas®, do PT© e de lula©. Nada se fez em 13 anos para esse mal brasileiro horroroso. Apenas propagandas e propagandas e publicidade. Frasinhas. Qual o poder constante da propaganda ininterrupta do PT®?

    Apenas um frio slogan, o LUGAR DE FALA do Petismo® (tal qual “Danoninho© Vale por Um Bifinho”/Ou: “Skol®: a Cerveja que desce Redondo”/Ainda: “Fiat® Touro: Brutalmente Lindo”). Apenas signos dessubstancializados. Sem corporeidade. Aqui a superficialidade do PETISMO®: Signos descorporificados. Sem substância. Não tem nada a ver com um projeto de Nação. Propaganda pura. O PT é truculento.
    PT = desonra. Ignomínia. Indigno. Poluição. Realidade crua.

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