As novas faces do cinema

A Revista de CINEMA selecionou 10 novos diretores de maior destaque na estreia em longa-metragem, para mostrar quem são, o que fazem, suas influências e seus projetos futuros. Uma geração pluralista e autoral. São eles, Eduardo Nunes (“Sudoeste”), Tiago Mata Machado (“Os Residentes”), Kleber Mendonça Filho (“O Som ao Redor”), André Ristum (“Meu País”), Vinícius Coimbra (“A Hora e a Vez de Augusto Matragra”), Helvécio Marins Jr. (“Girimunho”), Flávia Castro (“Diário de uma Busca”), Julia Murat (“Histórias que Só Existem Quando Lembradas”), Marco Dutra e Juliana Rojas (“Trabalhar Cansa”) e Sérgio Borges (“O Céu sobre os Ombros”).

Acompanhe, a cada semana, cada um desses diretores.

Os encontros de Sérgio Borges

Um travesti que se revela um estudioso sobre a prostituição. Um monge Hare Krishna que é também skatista, pichador de muro e fã fervoroso do Atlético Mineiro. Um homem pobre, que caminha por sua casa vestindo meias cor-de-rosa, e se mostra um pai de família e um escritor de tendência suicida. Estes são Everlyn, Murari e Lwei, os personagens mutantes de um dos melhores filmes brasileiros dos últimos anos, “O Céu sobre os Ombros” (2011), dirigido pelo escritor, roteirista e cineasta Sérgio Borges. Para ele, o cinema tem o potencial de condensar nossos sentimentos e desejos, além da capacidade de criar uma relação íntima, porém misteriosa com a experiência de estar vivo.

“Não sei exatamente o que me levou ao cinema, a gente não tem tanto controle das coisas. Mas provavelmente tinha uma intuição, e uma experiência pessoal enquanto espectador, do potencial expressivo da imagem. Eu me lembro, por exemplo, o quanto foi forte assistir a ‘Pinóquio’ da Disney quando criança. Aquele boneco inocente, seguindo seu instinto de prazer e se ferrando, se tornando culpado… Pedi pra minha mãe pra sair no meio. Uma imagem na tela tem o poder de uma flecha no arco, pode matar ou salvar uma pessoa, disse-me uma vez um pajé. E sempre me interessou mais dialogar sobre as coisas que nós não temos tantas certezas, que usamos menos a lógica e mais a expressividade”, diz Sérgio. “Vivo para ir de encontro ao belo, ao simples, ao que é encantado, como todo artista”.

Nascido em Belo Horizonte em 1975, Sérgio chegou a fazer algumas aulas em publicidade na PUC, mas acabou migrando para um curso de extensão em cinema, quando realizou seu primeiro curta, “Sonhos” (1998). De lá pra cá, dirigiu outros sete curtas (“Mira”, “Através”, “Joãos”, “O Caminho”, “Capitais do Tempo”, “Silêncio” e “Perto de Casa”), publicou dois livros (“O Guerrilheiro Nuclear e o Pacifista a Conversar” e “Solar”), e fundou com amigos a produtora Teia. “A ideia era unir forças para realizar filmes. A Teia nunca teve uma relação de sociedade de lucros e dividendos. Sempre dividimos as contas da casa e cada um teve autonomia para fazer aquilo que queria da vida. Ao longo desses 10 anos, pudemos nos influenciar uns com os outros, criar um selo em que as virtudes do trabalho de um reverberaram nos trabalhos dos outros e nos mantivemos sempre abertos a novas parcerias. Foram mais de 50 trabalhos realizados”, conta.

“O Céu sobre os Ombros”, seu primeiro longa-metragem, parte de um material documental para aderir a determinadas convenções ficcionais, especialmente no que diz respeito à noção de personagem. Seguimos três anônimos por alguns dias. Não há nada de concreto os conectando, a não ser o olhar do próprio filme, aberto, sem objetivos aparentes, que mais parece flagrar seus protagonistas em estruturas dramáticas surpreendentes. “O filme teve uma trajetória rica, para além das expectativas, dentro e fora do circuito comercial. Cerca de 100 mil pessoas já viram o longa. Isso pra mim é o mais importante: criar a possibilidade do filme ser visto pelas mais variadas pessoas. ‘O Céu sobre os Ombros’ ainda será lançado em DVD (em parceria com a Lume) e no circuito de cineclubes do Cine Mais Cultura (1400 pontos de exibição)”, revela o cineasta, feliz também pelo filme ter atingindo em cheio a academia, com uma enorme profusão de ótimos textos sobre a obra. “Mas definitivamente o meu desejo de fazer filmes não parte disso e sim de me expressar com as ‘pessoas comuns’, mesmo que possa soar paradoxal, já que o filme não tem uma narrativa comum”.

O Céu sobre os Ombros

Sérgio trabalha agora em dois novos projetos que têm como tema a sexualidade ou como a sociedade impõe barreiras para a vivência do amor e do sexo. “Os filmes serão uma ode a importância do orgasmo para a saúde das pessoas. Não posso dar muitos detalhes, pois um deles envolve a negociação de direitos autorais que ainda estão em andamento”.

 

Por Julio Bezerra

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