Rosenbaum & Welles
O crítico e estudioso de cinema Jonathan Rosenbaum (foto) já havia causado furor entre cinéfilos brasileiros ao declarar a Alfredo Manevy (“Carta Capital”, 2004) que “todos os países, fora os EUA, deveriam taxar os filmes norte-americanos muito pesadamente e usar esta taxa para ajudar a financiar filmes independentes e locais. Isto deixaria Jack Valenti (na ocasião presidente da poderosa MPAA) e outros executivos muito irritados e o cinema mundial muito mais rico”. Ao visitar São Paulo, onde participou do festival É Tudo Verdade, Rosembaum, um norte-americano que viveu a efervescência de maio de 68 em Paris, demonstrou grande carinho pelo Brasil. Boa parte de sua palestra “Descobrindo Orson Welles” teve nosso país como foco. Depois de apresentar emissão radiofônica de oito minutos, feita por Welles, para divulgar Shakespeare (e “Noite de Reis”) junto ao grande público, Rosenbaum leu belo texto wellesiano sobre nosso carnaval. E evocou a epopeia tropical das filmagens do conturbado e inacabado “It’s All True” (1942).
Enquanto Norman Foster filmava “Bonito”, no México, Welles registrava o carnaval carioca e enfrentava a tragédia da perda de Jacaré, jangadeiro que chegara ao Rio, vindo do Ceará, depois de 61 dias no mar. Mesmo sem um dos quatro protagonistas do núcleo cearense de “It’s All True”, o cineasta encontrou argumentos para dobrar a RKO e seguir rumo a Fortaleza, onde filmaria “Jangadeiros”. Do carnaval, pouco sobrou. Será que ele filmou pouco ou o DIP e a RKO deram sumiço às imagens dos foliões brasileiros? A suspeita não é absurda, pois um gerente da produtora avisara à matriz que ao invés de filmar as belezas do grande vizinho latino-americano, o cineasta estava documentando a “negrada pulando para cima e para baixo”. Por sorte, da passagem de Welles pelo Brasil, restaram perto de 50 minutos de “Jangadeiros” e muitas fotos (o brilhante still do cearense Chico Albuquerque). E, claro, o excelente documentário “É Tudo Verdade – Baseado em um Filme Inacabado de Orson Welles”, de Bill Krohn, Myron Meisel e Richard Wilson (1993). O que não dá para entender é que, no ano do centenário de nascimento de Welles, este filme não seja exibido em nossa rede de TV aberta e canais a cabo. Um crime de lesa-pátria.