Câmeras digitais chegam à qualidade da película
O avanço tecnológico na captação e difusão de imagens se tornou um verdadeiro fetiche com a ascensão do digital, mas também uma expectativa entre os diretores de fotografia para o momento em que esses equipamentos alcançassem a qualidade de imagem da aposentada película cinematográfica. As novíssimas câmeras 4K surgem neste contexto. Elas começaram a ganhar notoriedade em feiras de eletrônicos durante o ano de 2013, chamando atenção por atingirem uma resolução quatro vezes maior que a do Full HD, até então considerado o padrão de excelência. O resultado é a aproximação com a qualidade da película. No Brasil, essa tecnologia já vem sendo utilizada no cinema brasileiro.
O primeiro filme a utilizar câmeras 4K no mundo foi a superprodução “Depois da Terra”, lançado em 2013, com direção de M. Night Shyamalan e fotografia de Peter Suschitzky. No Brasil, o pioneirismo tecnológico do equipamento não demorou e aportou já no mesmo ano, em outra produção de envergadura: o épico histórico “O Tempo e o Vento”, com direção de Jayme Monjardim e fotografia de Affonso Beato. O veterano fotógrafo utilizou uma Sony F65 e se aproveitou das belas paisagens gaúchas para compor imagens de resolução cristalina. Beato se disse “maravilhado” com o 4K, acreditando que muito do ofício teria que se adaptar à novidade para acompanhar a evolução, especialmente, com a acessibilidade crescente do equipamento.
O poder da fotografia digital
Além de Affonso Beato, outros diretores de fotografia de vasta trajetória estão se ajustando à novidade e aproveitando a eficiência técnica do equipamento. Lauro Escorel (diretor de fotografia de “A Suprema Felicidade”, de Arnaldo Jabor, “O Maior Amor do Mundo”, de Cacá Diegues, entre outros), por exemplo, está em processo de finalização de “Prova de Coragem”, novo longa-metragem de Roberto Gervitz, cujas imagens foram captadas em 4K com a câmera Sony F55. “Fiquei feliz com a qualidade da imagem que obtivemos”, diz ele, que também utilizou a câmera no documentário “Chico – O Artista e o Tempo”, de Miguel Faria Jr., ainda inédito.
Para Escorel, existem diferenças intransponíveis entre a película e o digital, por mais que uma tecnologia como o 4K pareça fazer diminuir consideravelmente a distância de um e outro suporte. O que ele defende é que cada especificidade de imagem seja mantida na hora de conceber a ideia do que seja uma imagem a ser captada. “O movimento aleatório do grão (película) e a rigidez do pixel (digital) geram imagens distintas para sempre. Isto não quer dizer que não consigamos ótima qualidade com o suporte digital. Hoje, o padrão que está sendo estabelecido é o 4K, e me pergunto por quanto tempo. Logo estaremos no 8K ou 12K. Essa evolução infinita da imagem digital garante aos diretores de fotografia cada vez mais liberdade e possibilidades expressivas”.
Carlos Ebert, outro grande diretor de fotografia, de filmes como “O Bandido da Luz Vermelha”, de Rogério Sganzerla, e “A Ilha do Terrível Rapaterra”, de Ariane Porto, acredita que o profissional deve estar atento à relação das câmeras 4K com o próprio entorno dos demais equipamentos para se compreender em que medida elas modificam o olhar do diretor de fotografia. “É bom esclarecer que a resolução espacial não é o único parâmetro para julgar a qualidade de uma imagem cinematográfica digital”, diz Ebert. “A resolução temporal (cadência) e a resolução cromática (espaço de cor) são tão ou mais importantes, dependendo do que se está gravando, do que a resolução espacial, que é determinada pelo número de pixels que forma a imagem. Dito isso, vale assinalar que o 4K como original de câmera tem um papel preponderante na qualidade da imagem, mesmo, como acontece na maioria dos casos, a projeção dos filmes sendo feita em 2K”.
Ebert explica que outra possibilidade proporcionada pelas novas câmeras está no chamado Aces (Academy Color Encoding System), processo de finalização para imagens cinematográficas digitais desenvolvido pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood. O sistema garante, tecnicamente, que toda a proposta original da fotografia, em cada detalhe de luzes, cores e matizes, seja mantida até o final do processo de edição sem qualquer tipo de perda e independente do programa a ser utilizado na pós-produção. Ebert cita um colega, o estadunidense Francis Kenny, para esclarecer a importância do Aces: “A diferença não é apenas nas altas luzes e nas sombras. Existe uma gama nos meios tons onde se pode ver uma diferença nas gradações e tons de cinza. Uma é como o meu pequeno chihuahua pode perceber as cores, a outra é como um pavão as percebe”.
Ao mesmo tempo em que celebram um alto nível de imagem com o 4K, tanto Lauro Escorel quanto Carlos Ebert pondera sobre o outro lado da questão. “A grande conquista do digital traz consigo um aspecto perverso, que é o da obsolescência programada”, detecta Escorel. “Quanto mais o processo se sofistica, mais recursos precisamos investir para acompanhar os novos caminhos que nos são indicados pelos fabricantes, caminhos estes que nem sempre correspondem a uma necessidade da comunidade criativa”. Ebert, por sua vez, reforça a importância de o diretor de fotografia estar sempre ciente do que, afinal, ele realmente precisa. “Cada fabricante e cada modelo de câmera tem os seus pontos altos e suas deficiências. Vai muito também do gosto do diretor de fotografia e do tipo de captação. O mais importante é o olhar e a concepção do fotógrafo para cada filme em particular.”
O avanço da tecnologia da imagem
As câmeras 4K são chamadas assim porque possuem 4.096 por 2.160 linhas de resolução para cinema e 3.840 por 2.160 na TV, chegando à visualização de 8.000 pixels de uma imagem. A sopa de números é decifrada em poucas palavras por Alexandre Giglio, do marketing da Sony no Brasil: “O 4K nos proporciona algo que chamamos de ‘imersão de imagem’, em que pode parecer que estamos dentro da imagem, com uma profundidade de campo muito maior que o HD”. Ou, conforme Yuri Nieto, executivo de contas da Canon: “Representa o aumento das possibilidades de captação, corte e edição. Por ter quatro vezes mais resolução que as imagens em HD, além do ganho em qualidade de imagem, o 4K oferece possibilidade viável de ‘crop’ (corte na edição) e finalização do material em HD”.
A impressão hiperbólica de que o 4K revolucione o mercado naquilo que se oferece em câmeras e captação não surge à toa. O grande trunfo é a forma como as câmeras foram modeladas para potencializar ao máximo a sensibilidade à luz, permitindo a elaboração de composições visuais próximas à forma como se trabalhava com a película, tendo de aliada a praticidade do manejo com o digital através do imediatismo em relação ao que se filma e a uma maior agilidade na edição. “Seguimos aprendendo que qualidade de imagem vai bem além da especificação de resolução, mas o 4K acaba afetando outras variáveis, como espaço de cor, por exemplo, interferindo mais efetivamente na qualidade de imagem conforme o perfil da produção”, destaca Roberta Tennenbaum, executiva de contas da Canon.
Ela detecta que o mercado se mobilizou para receber o 4K, pela exigência sempre maior de qualidade acima da média, em especial, com a popularização da TV digital. “Há alguns poucos anos, havia a promessa silenciosa, mas eufórica, sobre a tecnologia 4K migrar para os variados nichos do mercado audiovisual. Os entraves de fluxograma de trabalho nos diferentes estágios de produção e, principalmente, de entrega e exibição, eram grandes, enquanto as opções de equipamento para captação eram limitadas”, afirma Roberta. “Como a maioria das transições tecnológicas, os fabricantes e o mercado consumidor aceleraram a chegada de soluções e acesso à realização 4K. Com isso, novos questionamentos surgem, como por exemplo, o quanto e em que situações a resolução de imagem se faz necessária”.
A variedade de modelos das câmeras é tanta quanto os preços. Uma câmera 4K pode ser adquirida a partir de R$ 10 mil, mas há modelos que atingem dez vezes este valor. “Dependendo da produção, este investimento aumenta, pois se o produtor quiser fazer algo ‘hollywoodiano’, vai precisar de mais recursos”, explica Alexandre Giglio. “As câmeras com sensores 35mm podem ser encontradas por volta de R$ 15 mil ou R$ 20 mil. Em comparação com as câmeras que não são 4K, os preços estão quase os mesmos”.
Fabricantes atendem diretamente o mercado brasileiro
As empresas fabricantes têm se mobilizado no mercado, de forma a estarem atualizadas com as demandas e possibilidades tecnológicas disponibilizadas. Alexandre Giglio conta que, no Brasil, já foram vendidas mais de 100 unidades da PMW-F5 e PMW-F55 da Sony, o que configura um sucesso. “Sem contar as NEX-S700 e a nova PXW-FS7, câmeras 4K com sensores super 35mm, também utilizadas em produções cinematográficas e de TV”, completa.
Para Mário Jannini, diretor técnico da Arri, a chegada da ALEXA Mini, uma câmera 4K mais leve e compacta, com 2,3 kg, tem sido celebrada pela facilidade de uso. “Ela poderá ser utilizada em drones, gimbals ou mesmo como uma câmera única no set de filmagem”, descreve. No caso da Canon, a novidade mais recente veio em abril, com a C300 Mark II.
Por Marcelo Miranda
Não acredito e aceito de forma nenhuma essa informação, um 16mm e não estou falando de ultra 16mm ou s16mm se bemn fotografados passam tranquilamente dos 5 ks. Uma grande jogada de marketing dos fabricantes…francamente…..
Não entendi o comentário do responsável pelo marketing da Sony, Alexandre Giglio, quando diz que “…com uma profundidade de campo muito maior que o HD”.
Gostaria que ele esclarecesse qual a relação da “pixel resolution” com a profundidade de campo.
Também acredito que ele tenha se confundido quando fala de câmeras 4k com sensor “35mm”. Imagino que ele tenha confundido com sensor “super 35mm”.