Clássico soviético “Vá e Veja” abre a 5ª Mostra Mosfilm

“Vá e Veja”, de Elem Klimov, eleito por críticos internacionais reunidos pela BBC londrina como um “um dos cem melhores filmes de língua não-inglesa de todos os tempos”, será exibido na noite inaugural da 5ª Mostra Mosfilm de Cinema Soviético e Russo, na Cinemateca Brasileira, em São Paulo.

O evento, promovido pelo CPC-UMES, acontecerá desta quinta-feira, 29 de novembro, até dia 5 de dezembro. Além de apresentar ao público paulistano dez filmes inéditos ou restaurados, a 5ª Mosfilm se complementará com a exposição “As Matryoskhas” e com feira de comidas, bebidas e artesanatos típicos do Leste Europeu.

As matryoskhas são criações da artista Nadia Ramirez Starikoff e compõem série de bonecas inspiradas na tradição russa. Elas serão mostradas em tamanhos diversos e pintadas segundo a imaginação da escultora-pintora. Só para lembrar, as matryoskhas (o termo já vem sendo aportuguesado como “matriosca”) nasceram como brinquedo infantil formado por rechonchudas bonecas feitas de madeira e colocadas umas dentro das outras, da maior à menor.

Todas as sessões e atividades da Mostra Mosfilm serão gratuitas. Além de “Vá e Veja” (noite inaugural, dia 29, às 19h30), serão apresentados filmes contemporâneos e um da era muda (“Bola de Sebo”, de 1934, sonorizado décadas depois). E outros que passaram por restauro sob as mais novas técnicas, caso de “Quando Voam as Cegonhas” (1957), de Mikhail Kalatozov, “Cidade Zero” (1988), de Karen Shakhnazarov, e a épica adaptação do romance “Guerra e Paz”, de Liev Tolstoi.

O que teria levado “Vá e Veja”, um filme realizado há 33 anos, a ganhar vigor na memória de centenas de votantes convocados pela BBC de Londres? Primeiro, suas qualidades, que são mesmo imensas. Segundo, sua exibição, há dois anos, no Festival de Veneza, na sessão de clássicos restaurados. O filme foi louvado como “a mais importante” das restaurações entre as muitas apresentadas pelo festival italiano.

O diretor Elem Klimov (1933-2007) não viveu para festejar a redescoberta de seu épico, obra perturbadora e cheia de mistérios, primeiro no segmento Veneza Classics e, depois, pela lista BBC dos Cem Melhores Filmes do Mundo (de Expressão Não-Inglesa).  “Vá e Veja” é o resultado do poder de criação do cineasta que encontrou um jeito novo de voltar a assunto por demais explorado, a 2ª Guerra Mundial. Durante o conflito que conflagrou o mundo, principalmente a Europa e a Ásia, o adolescente Floria, morador de uma aldeia bielorrussa, encontra um velho fuzil e se junta, como guerrilheiro, à resistência contra o invasor. Os russos gostam de lembrar que “a ocupação da Bielorrússia foi de selvageria sem precedentes, fato comprovado pela aniquilação de mais de 600 vilas e saldo de mais de 2 milhões de mortos”. O filme ganhou o principal prêmio do Festival de Moscou, em 1985, e o foi o escolhido pelo Júri Fipresci (Federação Internacional dos Críticos de Cinema). Agora recebe recompensa especial ao ser eleito para o Top 100 da BBC (há poucos russos, seja da era soviética ou pós-soviética na lista londrina).

“Guerra e Paz”, a monumental adaptação do épico de Tolstoi, que totaliza mais de seis horas e conquistou o Oscar de melhor filme estrangeiro, em 1969, será exibida, na Mostra Soviética e Russa, em quatro partes. Há que se lembrar que este filme marcou época na história dos poderosos Estúdios Mosfilm, que, em seu auge, eram considerados o maior e mais produtivo da Europa.

A sequência mais notável de “Guerra e Paz” – a reconstituição da Batalha de Borodino – contou com 300 atores, 120 mil figurantes, 200 canhões e 100 mil rifles. Naquela época, não se usavam os milagres da multiplicação digital, que tanto barateiam, hoje, os custos de superproduções. Sua realização consumiu quase sete anos (de 1961 a 1967). Seu lançamento, em partes, se deu em 1966 e 1967.

Serguei Bondarchuk (1920-1994), grande ator soviético, assina a direção, o roteiro (com Vassily Salovyov) e é um dos protagonistas do épico tolstoiliano. O custo total desta superprodução, em valores atuais, corresponde a US$ 60 milhões. Falado em russo, francês e alemão, “Guerra e Paz” retrata o confronto entre a França de Napoleão Bonaparte e a Rússia, relacionando-o às vidas das famílias Bolkonsky, Rostov e Bezukhov. O que começa como um desastre bélico para os russos terminará, sete anos mais tarde, com uma reviravolta, à medida em que a união contra o inimigo comum dissolve o antagonismo entre aristocracia e campesinato. Em 1805, o príncipe Andrei Bolkonsky alista-se no Exército Russo. Gravemente ferido na Batalha de Austerlitz, na qual os seus soldados são esmagados, o príncipe é erroneamente dado como morto. Pierre Bezukhov, filho bastardo de um dos homens mais ricos do país, é apresentado à alta sociedade. Muitos fatos se seguirão até o triunfo dos russos sobres os bonapartistas.

O “Bola de Sebo” soviético constitui-se na mais fiel (e bela) entre as muitas recriações do longo e complexo conto do francês Guy de Maupassant. Protagonizado pela rechonchuda Galina Sergeeva, o filme se passa, em sua maior parte, dentro de uma carruagem, veículo que conduz burgueses em fuga de Rouen, na França, até destino mais seguro. Eles fogem do exército prussiano, que ocupara partes do território francês, no anos de 1870. Já iniciada a viagem, uma prostituta, conhecida como Bola de Sebo, junta-se à comitiva. Realizado no começo dos anos 1930 como um filme silencioso, “Bola de Sebo” foi sonorizado em 1955, sob a supervisão de seu diretor, Mikhail Romm. A música traz a assinatura de Mikhail Chulaki.

Confira a programação da Mostra Mosfilm:

Quinta-feira, 29 de novembro

19h30 – “Vá e Veja”, de Elem Klimov (1985, drama de guerra, 145 minutos)

Sexta-feira, 30 de novembro

19h00 – “Cidade Zero”, de Kare Shaknazarov (comédia, 101 minutos)
21h00 – “Decisão: Aniquilação”, de Aleksandr Aravin(2018, filme de ação, 97 min)

Sábado, 1º de dezembro

15h00 – “Guerra e Paz – Parte I – Andrei Bolkonsky”, de Sergei Bondarchuk (1966, épico, 142 minutos)
17h45 – “Guerra e Paz – Parte II – Natasha Rostova”, de Sergei Bondarchuk (1966, épico, 94 minutos)
19h40 – “A Ascensão”, de Larissa Shepitko (1977, drama, 111 minutos)
21h40 – “Criança Abandonada”, de (1939, comédia, 68 minutos)

Domingo, 2 de dezembro

15h00 – “Guerra e Paz III – O Ano de 1812”, de Sergei Bondarchuk (épico, 78 min.)
17h00 – “Guerra e Paz IV – Pierre Bezukhov”, de Serguei Bondarchuk (épico, 92 min.)
20h00 – “Quando Voam as Cegonhas” (drama, 97 min.), exibição ao ar livre, no pátio da Cinemateca Brasileira

Segunda-feira, 3 de dezembro

19h15 – “O Incógnito de São Petersburgo”, de Leonid Gayday, inspirado em “O Inspetor Geral”, de Gogol (1977, comédia, 91 minutos)
21h00 – “Quando Voam as Cegonhas”, de Mikhail Kalatozov (1958, drama premiado com a Palma de Ouro, em Cannes, 97 minutos)

Terça-feira, 4 de dezembro

19h15 – “Circus”, de Grigory Aleksandrov (1936, comédia musical, 89 minutos)
20h45 – “A Ascensão”, de Larissa Shepitko (1977, drama,111 minutos)

Quarta-feira, 5 de dezembro

19h15 – “Vá e Veja”, de Elem Klimov (1985, épico, 145 min.)
21h45 – “Bola de Sebo”, de Mikhail Romm (1934, drama, 63 minutos)

 

Por Maria do Rosário Caetano

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.