Coproduções estrangeiras que chegam ao Oscar

A lista dos indicados ao Oscar de 2019 foi divulgada nesta semana, chamando a atenção especialmente para “Roma”, de Alfonso Cuarón, que recebeu dez nominações, entre elas as de melhor filme, melhor diretor e melhor filme estrangeiro. Mesmo tendo a norte-americana Netflix como investidora majoritária na produção e na distribuição, o longa-metragem carrega o México como principal estandarte aos olhos do mundo, até porque foi rodado por lá e recompõe as memórias do diretor mexicano. É provável que acabe levando ao menos o troféu de obra “estrangeira”, mas o que de fato nos interessa nessa lista são outros atributos.

Os cinco finalistas apresentam indicativos importantes sobre como funcionam as coproduções e o mercado internacional. Três deles são coproduções com países europeus ou entre eles. Isso significa que, além dos editais nacionais de investimento em cada território, os sócios tiveram acesso aos fundos da União Europeia para o cinema e o audiovisual, que abarcam uma quantidade expressiva de recursos para produção, distribuição, exibição, e até para a circulação internacional.

Ao lado de “Roma”, competem pelo Oscar de melhor filme estrangeiro duas coproduções minoritárias francesas: “Cafarnaum” (Líbano/França/EUA), de Nadine Labaki, e “Guerra Fria” (Polônia/Reino Unido/França), de Pawel Pawlikowski. Os outros são: “Assunto de Família” (Japão), de Hirokazu Kore-eda, e “Never Look Away” (Alemanha/Itália), de Florian Henckel von Donnersmarck.

Todos eles, sem exceção, tiveram a sua première internacional em dois dos três maiores festivais de cinema do mundo. “Roma” foi exibido em Veneza e arrebatou o Leão de Ouro de melhor filme. Naquele mesmo festival, foi exibido “Never Look Away” na competição oficial. Os demais foram selecionados para a mostra principal do Festival de Cannes em 2018, sendo que “Assunto de Família” levou a Palma de Ouro, “Guerra Fria”, o troféu de melhor diretor, e “Cafarnaum”, o Prêmio do Júri.

Como esses dois últimos têm participação de empresas francesas na produção, cabe lembrar que a própria seleção para tal competição se torna mais provável do que se eles fossem apenas obras estrangeiras, isso porque Cannes claramente privilegia filmes franceses. A prévia participação de Nadine Labaki em outras edições do festival e o Oscar de melhor filme estrangeiro para Pawel Pawlikowski, com “Ida” (2015), igualmente favorecem bastante.

Sendo assim, apenas nessa shortlist do Oscar 2019 já é possível apontar para a magnitude de se ter um coprodutor europeu capaz de abrir caminhos desde o financiamento mais inicial até a influência junto aos agentes de vendas (sobretudo os franceses) para que o filme tenha mais chances de entrar em um grande festival e, se for realmente bom, conquistar os melhores prêmios, com eventuais reflexos no Oscar do ano seguinte.

Ao expandir ainda mais e olharmos para os filmes estrangeiros selecionados desde 2015, podemos enxergar melhor essa tendência. Dos 25 filmes escolhidos, nos últimos cinco anos, a França lidera as indicações com oito coproduções minoritárias (32%). Dito de outra forma, mesmo não tendo um grande filme majoritário na lista final, os produtores franceses apareceram em todos os anos. E isso não é pouca coisa.

Em 2018, foram três finalistas: “The Square” (Suécia/Alemanha/França/Dinamarca), exibido em Cannes e vencedor da Palma de Ouro no ano anterior; “Sem Amor” (Rússia/França/Alemanha/Bélgica), também exibido em Cannes; e “O Insulto” (Líbano/França/Bélgica/EUA), selecionado para o Festival de Veneza.

Em 2017, a França figurou na lista com “O Apartamento” (Irã/França), que inclusive levou o Oscar de melhor filme estrangeiro. Antes, o longa-metragem havia sido agraciado no Festival de Cannes com os prêmios de melhor roteiro e melhor ator. Em 2016, o minoritário selecionado foi “Cinco Graças” (Turquia/França/Alemanha/Qatar). Já em 2015, foi “Timbuktu” (Mauritânia/França), exibido na competição oficial de Cannes em 2014.

A última participação do Brasil entre os cinco finalistas ao Oscar de melhor filme estrangeiro foi há 20 anos, com “Central do Brasil”, de Walter Salles. Além de justamente ser uma coprodução com a França, a obra estreou no Festival de Berlim de 1998 e saiu de lá com o Urso de Ouro de melhor filme, o primeiro a ser concedido a um diretor brasileiro. O troféu também garantiu a venda do longa para distribuidores de todos os continentes e foi determinante para a estreia nos circuitos brasileiro e francês.

Para o Oscar deste ano, a aposta brasileira foi “O Grande Circo Místico”, de Cacá Diegues, que tem coprodução minoritária da França, mas acabou sendo exibido fora de concurso no Festival de Cannes 2018, sem chances de ganhar qualquer prêmio que alavancasse um destaque internacional de maior envergadura.

 

Por Belisa Figueiró, autora do livro “Coprodução de cinema com a França: Mercado e internacionalização”.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.