Globo de Ouro festeja Viola Davis, valoriza “Emilia Pérez” e “Ainda Estou Aqui”, mas esnoba “O Quarto ao Lado” e Pedro Almodóvar

Foto: “Tudo que Imaginamos como Luz”, de Payal Kapadya

Por Maria do Rosário Caetano

A octogésima-segunda edição do Globo de Ouro acontecerá na noite desse domingo, 5 de janeiro, direto de Hollywood, com seu badalado (e ressuscitado) ritual festivo-celebratório. E com transmissão garantida por duas emissoras de TV (TNT e Max) e redes sociais.

O salão de festas do hotel Beverly Hilton, de Los Angeles, será palco de jantar regado a champanhe e da entrega dos troféus aos laureados. Antes, o tapete vermelho funcionará como palco de verdadeiro desfile de vestidos de alta costura e jóias de grife.

Como é de praxe, o octogenário Globo de Ouro abrirá o calendário de festas da indústria cinematográfica e, tudo indica, fará, finalmente, valer a origem de seus eleitores — jornalistas e críticos internacionais baseados nos EUA. Um símbolo da nova postura (mais cosmopolita): o filme com maior número de indicações, o melodrama-noir queer “Emilia Pérez”, é francês e falado em espanhol.

Até a crise de credibilidade que nocauteou, dois anos atrás, a Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood, criadora do Globo de Ouro, seus integrantes pareciam mais aferrados ao cinema norte-americano que a própria Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, criada por profissionais estadunidenses. Estes elegeram o francês “O Artista” (Michel Hazanavicius, 2012) e — causando verdadeiro furor — o coreano “Parasita” (Bong Joon-ho, 2020) como os melhores filmes do ano. E, de quebra, atribuíram o Oscar também a seus diretores.

Depois da crise de credibilidade, seguida de humilhante leitura dos nomes dos premiados pela internet (como se viu em 2023), a cerimônia do Globo de Ouro promete reviver seus anos de maior glamour e prestígio. A demonstração de força foi antecipada em janeiro de 2024. Afinal, as empresas Eldridge Industries e Dick Clark Productions, novas proprietárias do combalido prêmio, aplicaram, nele, verdadeiro choque de eficiência capitalista.

A cerimônia de premiação dos melhores filmes e programas de TV lançados em 2024 será transmitida pelo canal TNT (por assinatura) e pelo Max (streaming). Anotem o horário: 22h. No ano de maior penúria — vale a redundância —, nenhuma emissora quis arranhar seu prestígio com a festa “branca” e de “moral duvidosa” da Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood. Também conhecida como Associação dos Correspondentes Estrangeiros.

A atriz Viola Davis, de 59 anos, receberá o Prêmio Cecil B. De Mille por sua trajetória. E astros (afro-americanos como ela) — caso dos concorrentes Denzel Washington e Cynthia Erivo — somar-se-ão ao filme black “Nickel Boys”, de RaMell Ross, para mostrar que o Globo de Ouro corrigiu uma das falhas que macularam sua credibilidade – promover edições que ignoravam filmes e artistas negros. Outro problema grave: os associados estariam aceitando mordomias aliciadoras de produtores e distribuidores de filmes e programas de TV.

Depois do Globo de Ouro, virão, ao longo do mês de fevereiro, os Prêmios Goya, da Espanha (dia 8), o Bafta, o “Oscar britânico” (dia 16) e o César francês (dia 28). O David di Donatello italiano só deve acontecer em abril ou maio.

No dia dois de março, será a vez do mais badalado (e aguardado) de todos os prêmios cinematográficos – O Oscar da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, já quase centenário (essa será sua edição número 97, o que fez dele o mais antigo troféu cinematográfico do mundo).

Os organizadores do Globo de Ouro fazem questão de anunciar seus premiados antes que a Academia hollywoodiana anuncie seus finalistas ao Oscar. Este ano, o fará com 12 dias de antecedência.

O Brasil está bem na fita: teve duas indicações, o dobro do filme que o derrotou na disputa pelo Leão de Ouro em Veneza — “O Quarto ao Lado”, primeiro longa-metragem falado em inglês do espanhol Pedro Almodóvar.

“Ainda Estou Aqui” concorre a melhor filme estrangeiro e a melhor atriz de drama (Fernanda Torres). Nessa categoria, a intérprete de Eunice, companheira do engenheiro, ex-deputado e desaparecido político Rubens Paiva, disputará o troféu com mais cinco atrizes, uma delas, a britânica Tilda Swinton, responsável pela única indicação do vencedor do Leão de Ouro veneziano ao Globo de Ouro.

Há que se lembrar que o filme do cineasta espanhol não foi levado em consideração para a disputa de melhor filme estrangeiro, por razão óbvia — sendo falado em inglês, estava inabilitado nessa categoria. Poderia, sim, concorrer a melhor drama. Mas os responsáveis pelas indicações do Globo Awards o esnobaram.

“Emilia Pérez”, de Jacques Audiard

O brasileiro “Ainda Estou Aqui” vai enfrentar parada dura na noite desse domingo. Além de “Emilia Pérez”, que pode ser sua “pedra no sapato” também na futura disputa pelo Oscar, há outro candidato fortíssimo pisando em seu calcanhar — o indiano “Tudo que Imaginamos como Luz”, de Payal Kapadya, que vem emocionado público e críticos. Este filme tem figurado em diversas listas de “melhores do ano”. E, nesse mesmo Globo de Ouro, a jovem Payal Kapadya foi indicada em categoria das mais cobiçadas — melhor direção.

No Brasil, “Tudo que Imaginamos como Luz” causou sensação na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Há um porém digno de nota: ele estará ausente da categoria melhor filme internacional do Oscar. Isto porque o grande país asiático indicou outro competidor — “Laapataa Ladies” — que caiu fora na primeira eliminatória da Academia, pois foi excluído da lista de 15 pré-finalistas.

Os outros concorrentes ao longa de Walter Salles no Globo de Ouro continuam firmes na disputa pelo Oscar internacional: o iraniano “A Semente do Fruto Sagrado”, de Mohammad Rasoulof, aceito sob bandeira germânica; o italiano “Vermiglio”, de Maura Delpero, de beleza arrebatadora, e o dinamarquês “A Garota com a Agulha”, de Magnus von Horn.

As bolsas de aposta apontavam (e continuam apontando) os representantes da França, Alemanha e Brasil como favoritos a encabeçar a lista de cinco finalistas ao Oscar internacional. No quarto lugar estaria “Vermiglio”. Em quinto, o irlandês “Kneecap – Música e Liberdade”, de Rich Peppiatt. Mas novas especulações passaram a apontar o letão “Flow”, animação dirigida por Gints Zilbalodis, e o tailandês “Como Ganhar Milhões Antes que a Avó Morra”, de Pat Bonnitipat, como títulos capazes de figurar na lista que será divulgada no próximo dia 17 de janeiro. A categoria longa internacional costuma, porém, trazer surpresas. Quem imaginaria que “A Felicidade das Pequenas Coisas”, do pequenino Butão, desbancaria cinematografias consagradas da Europa e da Ásia? Pois desbancou!

O Globo de Ouro reconheceu as qualidades do cada vez mais festejado “Flow”, inventiva animação vinda da Letônia, ao indicá-lo na categoria melhor longa animado. Mas o filme de Zilbalodis vai enfrentar parada dura. Afinal, tem pela frente três poderosos blockbusters estadunidenses: “Divertidamente 2”, “Moana 3” e “Robô Selvagem”.

Por sorte, o colegiado de votantes do Globo de Ouro abriu espaço para outra maravilha off-Hollywood — o australiano “Memórias de um Caracol”, de Adam Elliot, vencedor do Festival de Annecy, na França, e cult instantâneo na Mostra Internacional de SP. O filme foi aplaudido calorosamente em sessão na imensa Sala Petrobras, na Cinemateca Brasileira, e acumulou pontuação altíssima. Além de render a Adam Elliot, por decisão do júri oficial, o troféu Bandeira Paulista de melhor direção.

O sexto concorrente da categoria longa de animação no Globo de Ouro — “Wallace & Gromit: Vengeance Most Fowl”, de Nick Park e Merlin Crossinghan — vem de verdadeira usina de criatividade europeia, os Estúdios Aardman, da Inglaterra.

Juntam-se ao campeão de indicações do Globo de Ouro — o francês “Emilia Pérez”, de Jacques Audiard, acumula vaga em dez categorias — “O Brutalista”, de Brady Corbet (com sete), “Conclave”, de Edward Berger (com seis), e “Anora”, de Sean Baker, e “A Substância”, de Coralie Fargeat (com cinco cada um).

“Anora” sagrou-se o grande vencedor da Palma de Ouro, em Cannes. Berger, vale lembrar, é a nova aposta dos produtores europeus desde o êxito do remake de “Nada de Novo no Front”, bem aquinhoado pela Academia dois anos atrás.

“Flow”, de Gints Zilbalodis

O Globo de Ouro premia também os melhores da TV e do streaming. Continua, porém, ignorando o documentário, segmento cada vez mais importante da indústria audiovisual, por encontrar na TV e no streaming grandes escoadouros. Sem esquecer os festivais (Cannes, Veneza e Berlim seguem antenados com o formato) e as salas de cinema.

Outra característica do Globo de Ouro: seus organizadores teimam em separar Drama de Musical-Comédia. Esse ano, doze filmes preenchem as vagas das duas categorias. “A Substância”, terror, que se pretende feminista, entrou na lista de Musical-Comédia. Não é uma coisa, nem outra.

Notem que este filme francês, falado em inglês e protagonizado por Demi Moore, tem mais três importantes indicações ao Globo de Ouro: direção (Coralie Fargeat), atriz de musical ou comédia  (Demi Moore), coadjuvante (Margaret Qualley) e roteiro original (também de Coralie Fargeat).

 

Globo de Ouro 2025 (Ano 82)
Data:
nesse domingo, 5 de janeiro
Horário: 22h
Apresentadora: Nikki Glaser
Homenageada: Viola Davis
Transmissão: TNT (TV por assinatura) e Max (streaming) + redes sociais
Organização: Eldridge Industries e Dick Clark Productions

 

FINALISTAS

CINEMA

Melhor filme – drama:

  • “O Brutalista”, de Brady Corbet (EUA)
  • “Um Completo Desconhecido”, de James Mangold (EUA)
  • “Conclave”, de Edward Berger (Inglaterra/EUA)
  • “Duna: Parte Dois”, de Denis Villeneuve (EUA-Canadá)
  • “Nickel Boys”, de RaMell Ross (EUA)
  • “September 5”, de Tim Feulbaum (Alemanha/EUA)

Melhor filme – musical ou comédia:

  • “Emilia Pérez”, de Jacques Audiard (França)
  • “Anora”, de Sean Baker (EUA)
  • “Rivais”, de Luccas Guadagnino (EUA-Itália)
  • “A Verdadeira Dor”, de Jesse Eisenberg (EUA)
  • “A Substância”, de Coralie Fargeat (França-EUA)
  • “Wicked”, de Jon M. Chu (EUA)

Melhor diretor:

  • Payal Kapadia (Tudo que Imaginamos como Luz, Índia)
  • Jacques Audiard (Emília Pérez -França)
  • Sean Baker (Anora, EUA)
  • Edward Berger (Conclave, Inglaterra-EUA)
  • Brady Corbet (O Brutalista, EUA)
  • Coralie Fargeat (A Substância, França)

Melhor filme estrangeiro:

  • “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles (Brasil)
  • “Tudo que Imaginamos como Luz”, de Payal Kapadya (Índia)
  • “Emilia Pérez”, de Jacques Audiard (França)
  • “A Garota com a Agulha”, de Magnus von Horn  (Dinamarca)
  • “A Semente do Fruto Sagrado”, de Mohammad Rasoulof (Alemanha)
  • “Vermiglio”, de Maura Delpero (Itália)

Melhor filme de animação:

  • “Memórias de um Caracol”, de Adam Elliot (Austrália)
  • “Flow”, de Gints Zilbalodis (Letônia)
  • “Divertidamente 2”, de Kelsey Mann (EUA)
  • “Moana 2”, de David Derrick e Jason Hand  (EUA)
  • “Robô Selvagem”, de Chris Sanders (EUA)
  • “Wallace & Gromit: Vengeance Most Fowl”, de Nick Park e Merlin Crossinghan (Reino Unido)

Melhor atriz – drama:

  • Fernanda Torres (Ainda Estou Aqui)
  • Pamela Anderson (The Last Showgirl)
  • Angelina Jolie (Maria)
  • Nicole Kidman (Babygirl)
  • Tilda Swinton (O Quarto ao Lado)
  • Kate Winslet (Lee)

Melhor ator – drama:

  • Adrien Brody (O Brutalista)
  • Timothée Chalamet (Um Completo Desconhecido)
  • Daniel Craig (Queer)
  • Colman Domingo (Sing Sing)
  • Ralph Fiennes (Conclave)
  • Sebastian Stan (O Aprendiz)

Melhor atriz – musical ou comédia:

  • Amy Adams (Nightbitch)
  • Cynthia Erivo (Wicked)
  • Karla Sofía Gascón (Emilia Pérez)
  • Mikey Madison (Anora)
  • Demi Moore (A Substância)
  • Zendaya (Rivais)

Melhor ator – musical ou comédia:

  • Jesse Eisenberg (A Verdadeira Dor)
  • Hugh Grant (Herético)
  • Gabriel LaBelle (Saturday Night)
  • Jesse Plemons (Tipos de Gentileza)
  • Glen Powell (Assassino por Acaso)
  • Sebastian Stan (Um Homem Diferente)

Melhor atriz coadjuvante:

  • Ariana Grande (Wicked)
  • Zoe Saldaña (Emília Pérez)
  • Selena Gomez (Emilia Pérez)
  • Felicity Jones (O Brutalista)
  • Margaret Qualley (A Subustância)
  • Isabella Rossellini (Conclave)

Melhor ator coadjuvante:

  • Yura Borisov (Anora)
  • Kieran Culkin (A Verdadeira Dor)
  • Edward Norton (Um Completo Desconhecido)
  • Guy Pearce (O Brutalista)
  • Jeremy Strong (O Aprendiz)
  • Denzel Washington (Gladiador II)
  • Melhor roteiro original:
  • Jacques Audiard e parceiros (Emília Pérez)
  • Sean Baker (Anora)
  • Brady Corbet e Mona Fastvold (O Brutalista)
  • Jesse Eisenberg (A Verdadeira Dor)
  • Coralie Fargeat (A Substância)
  • Peter Straughan (Conclave)

Melhor canção original:

  • Beautiful That Way (The Last Showgirl)
  • Compress/Repress (Rivais)
  • El Mal (Emilia Pérez)
  • Mi Camino (Emília Pérez)
  • Forbidden Road (Um Homem Diferente)
  • Kiss The Sky (Robô Selvagem)

Melhor trilha original:

  • Conclave
  • O Brutalista
  • Robô Selvagem
  • Emilia Pérez
  • Rivais
  • Duna: Parte 2

Melhor realização cinematográfica e de bilheteria:

  • Alien: Romulus, de Fede Alvarez (EUA)
  • Os Fantasmas Ainda se Divertem —Beetlejuice Beetlejuice, de Tim Burton (EUA)
  • Deadpool & Wolverine, de Shawn Levy (EUA-Reino Unido)
  • Gladiador II, de Ridley Scott (EUA- UK)
  • Divertidamente 2, de Kelsey Mann (EUA)
  • Twisters, de Lee Isaac Chung (EUA)
  • Wicked, de  Jon M. Chu (EUA)
  • Robô Selvagem, de Chris Sanders (EUA)

TELEVISÃO

Melhor série de TV (drama):

  • “O Dia do Chacal”
  • “The Diplomat”
  • “Mr. and Mrs. Smith”
  • “Shōgun”
  • “Slow Horses”
  • “Squid Game” (Netflix)

. Melhor série (comédia ou musical):

  • “The Bear”
  • “The Gentlemen”
  • “Hacks”
  • “Nobody Wants This”
  • “Only Murders in the Building”
  •  “Abbott Elementary”

Melhor ator em série de TV (musical ou comédia):

  • Jeremy Allen White, “The Bear”
  •             Adam Brody, “Nobody Wants This”
  • Ted Danson, “A Man on the Inside”
  • Steve Martin, “Only Murders in the Building”
  • Jason Segel, “Shrinking”
  • Martin Short, “Only Murders in the Building”

Melhor ator em série limitada, antologia ou filme feito para TV:

  • Andrew Scott, “Ripley”
  • Colin Farrell, “The Penguin”
  • Richard Gadd, “Baby Reindeer”
  • Kevin Kline, “Disclaimer”
  • Cooper Koch, “Monsters: The Lyle and Erik Menendez Story”
  • Ewan McGregor, “A Gentleman in Moscow”

Melhor atriz em série de TV (drama):

  • Kathy Bates, “Matlock”
  • Emma D’Arcy, “House of the Dragon”
  • Maya Erskine, “Mr. and Mrs. Smith”
  • Keira Knightley, “Black Doves”
  • Keri Russell, “The Diplomat”
  • Anna Sawai, “Shōgun”

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