Fest Gramado – Ator de “El Mate” e “O Roubo da Taça” em debate

Por Maria do Rosário Caetano, de Gramado

O ator argentino-brasileiro FÁBIO MARCOFF (foto) é dono de raro senso de humor. Ele, que disputa o Kikito de ator protagonista por EL MATE, dirigido por Bruno Kott, e coadjuvante por O ROUBO DA TAÇA, de Caíto Ortiz, avisou (e arrancou tantas risadas quanto suas participações nos dois filmes) que, se ganhar o troféu KIKITO, vai derretê-lo e devolver a Taça Jules Rimet aos brasileiros. A brincadeira nasce, claro, de seu papel no filme de Caíto Ortiz, que estreia na próxima semana. Afinal, com enorme peruca, ele interpreta o argentino que atuou como receptador da taça Jules Rimet, roubada da sede da CBF, em 1983.

Em EL MATE, Marcoff interpreta um argentino que se expressa na totalidade de seus diálogos em espanhol portenho. Já no O ROUBO DA TAÇA, ele fala “portunhol”. O cineasta e ator Bruno Kott, de 33 anos, dirigiu o ator argentino, de 51, em série para o Canal Brasil (O DIVÃ DO DR. KURTISMAN). Da grande amizade dos dois, nasceu o desejo de fazer um filme escrito por ambos. Pois EL MATE tem a dupla MARCOFF-KOTT na função de roteiristas e protagonistas. O filme, que custou apenas R$ 300 mil, nos motiva a prestar atenção em futuros trabalhos do cineasta, por seu humor e senso anárquico. O talento histriônico de Fábio Marcoff é contagiante.

O diretor é, também, um bom ator. Quando elaborar mais seus roteiros e tiver o que dizer, fará filmes de grande valor. Desta vez, em 70 minutos e inspirado nos filmes de Tarantino (ele prefere dizer que seu diálogo se dá mais com os Irmãos Coen), Bruno Kott cria narrativa promissora. Um marginal portenho guarda, numa determinada casa, um homem de origem russa, que será entregue a quem fez a “encomenda”. A história, marcada no relógio, se passa num único dia (de manhã até altas horas da madrugada). Outros personagens vão se inserir nesta locação única: um jovem pregador evangélico (o próprio Kott), um funcionário da Sabesp (Eduardo Gomes, de “Sinfonia da Necrópole”), duas fogosas mulheres dispostas ao prazer e ao sexo (Carlota Joaquina e Michelle Boesche), o mafioso (Rodrigo Fregon) e seu motorista (Mauro Vedia).

Dois ingredientes perturbam a narrativa que, por mais anárquica que seja, trabalha com elementos realistas (a marca temporal e os serviços públicos paulistanos). O funcionário da Sabesp (Serviço de Água e Esgoto de SP) vai fiscalizar o relógio da residência, uniformizado, já noite, fechada. Quem conhece o funcionalismo público sabe muito bem que estes serviços são prestados em horários burocráticos. O personagem ARMANDO (Fábio Marcoff) é muito bem desenhado, seus diálogos são saborosos e o ator, muito carismático. Já o personagem de Bruno Kott (o pregador evangélico) fica à deriva e não consegue estabelecer um perfil orgânico. O ator-diretor, muito simpático e atento ao debate, admitiu que seu pregador funciona como “escada” para as graças do argentino. Mas defendeu-se dizendo que queria que seu personagem fugisse do estereótipo do evangélico que vemos na mídia e na TV e que, como realizador e roteirista, quis subverter a gramática da narrativa realista. Neste caso, deveria ter apagado marcas temporais rígidas e também evitado siglas como Sabesp e assemelhadas.

O filme, uma comédia de erros, conta com fecho arrebatador: um “tanguero” canta CAMBALACHE, de Enrique Discépolo, o maior clássico – na verdade um hino – da marginalidade portenha (e latina). É animador ver um jovem cineasta, em seu longa de estreia, dialogando de forma tão apaixonada com a América Hispânica. Filmes como EL MATE e como O SILÊNCIO DO CÉU (este de Marco Dutra, produzido por RODRIGO TEIXEIRA) mostram que, finalmente, o cinema brasileiro une as América Hispânica e Lusitana de forma orgânica, sem esperar que dinheiros dos dois países se juntem.

E VALE registrar fala de TEIXEIRA, no debate de O SILÊNCIO DO CÉU, depois de lembrar que ele se iniciou na produção cinematográfica brasileira com a adaptações de obras literárias nacionais e, depois, rumou para os EUA, onde estabeleceu parcerias no cinema independente, com sucessos como FRANCES HA e A BRUXA. Agora, finalmente, produziu o denso filme de MARCO DUTRA a partir de romance argentino, com dois protagonistas portenhos (Leo Sbaraglia e Chino Darín), com locações em Montevideo e com duas atrizes (Carolina Dieckman e Paula Cohen) e dinheiro 100% brasileiros. A FALA de TEIXEIRA, NO DEBATE: “Produzi, para a HBO, a série O HIPNOTIZADOR, na qual se falava espanhol ou português, sem que nos preocupássemos com isto. Vamos agora para a segunda temporada. No nosso filme, também se fala espanhol e português e temos atores de três países – Argentina, Brasil e Uruguai. E vamos estabelecendo novas parcerias”.

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