“Abá e sua Banda” mostra príncipe-músico que defende a democracia, a justiça e a diversidade no Reino de Pomar
Por Maria do Rosário Caetano
A animação brasileira segue em sua luta pela afirmação do produto nacional e pela conquista de seu público potencial. Não tem sido fácil. Nos últimos anos foram lançados diversos longas-metragens animados. Três se destacaram — “Arca de Noé”, baseado em canções de Vinicius de Moraes (quase 400 mil espectadores), “Teca e Tuti: Uma Noite na Biblioteca”, de Doimo, Perdido e MAL (15 mil, boa marca para uma produção alternativa), e “Placa Mãe “, de Igor Bastos, vencedor do Festival do Novo Cinema Latino-Americano de Havana.
Agora chegou a vez de “Abá e sua Banda”, de Humberto Avelar, produção de Silvia Frahia, com retaguarda de peso (Gloob-Globo e Riofilme), cuja estreia está programada para o próximo dia 17 de abril. E tal estreia se dá escorada na participação em quinze festivais e conquista de três prêmios (melhor filme de animação no Epic Fest-EUA, no Kids Festival, em Málaga-Espanha, e no brasileiro EcoCine – Festival Internacional de Cinema Ambiental).
Claro que infantes, o público-alvo de “Abá e sua Banda”, não estão interessados em prêmios, mas sim em história plena de aventuras e ritmo ágil. Por isso, o experiente Humberto Avelar, que ainda dubla o vilão da trama (Dom Caraguatá), cercou-se de importantes colaboradores, como o diretor de animação Alan Camilo e o músico André Mehmari, agregando vozes de atores como Zezé Motta, Robson Nunes, Filipe Bragança e Rafael Infante.
“Abá e sua Banda” foi construído com muito zelo e belos desenhos (em 3D e 2D), por uma trupe de vinte animadores. Por tratar-se de aventura musical protagonizada por banda das mais ecléticas — Abá (de abacaxi, um príncipe-guitarrista de coroa verde, como o da fruta tropical), Juca, um caju-gaitista, e Ana, uma banana-baterista cheia de atitudes —, Avelar contou com a importante contribuição artística de André Mehmari, autor da trilha incidental, além de parceiro de Silvia Frahia e Milton Guedes nas canções. Juntos, os três compuseram letras e melodias dos números executados pelo príncipe de 13 anos, que deseja ser reconhecido como músico e, ao lado de Ana e Juca, apresentar-se no Festival da Primavera.
Como o soberano de Pomar, o Rei Caxí, já está cansado, ele deseja que o filho adolescente assuma o trono. O garoto, porém, está mais interessado em sua carreira musical que em assumir precocemente tamanha responsabilidade. Por isso, ele troca seus trajes principescos por descolado vestuário de músico plebeu. E vai arriscar-se nas pelejas sonoras.
O Rei Caxí não desconfia que há um vilão entre seus ajudantes, o militar Dom Caraguatá, ambicioso como ele só. Sua guarda, formada por um verdadeiro exército de cocos verdes, está pronta para destronar o monarca.
Ao invés de realizar seu sonho musical e tocar com os amigos, o príncipe assumirá o lugar do pai? O fará, tão cedo, aos 13 anos? Sua omissão resultará no triunfo do autoritário Dom Coco, que pretende acabar com a diversidade que reina em Pomar?
Abá encontrará, na própria Natureza (o filme sustenta-se na utopia do equilíbrio ecológico), a solução para o impasse. E, claro, contará com a ajuda de Ana e do grande músico Juca. Todos enfileirados no campo que luta pela democracia e pela justiça social. Operosas abelhas assumiram momento de protagonismo.
Humberto Avelar iniciou sua carreira de animador com os festejados curtas-metragens das séries “Juro que Vi”, “Cantigas de Roda” e “Que Medo”, premiados em diversos festivais de cinema. A beleza de seus desenhos o levou para a TV e Publicidade, suportes de mais de uma centena de trabalhos por ele assinados. Para a TV Globo, realizou storyboards e animações. Foi professor da disciplina Animação e Quadrinhos na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Dirigiu, para a produtora Mixer (e TV Globo), três temporadas da série animada “Sítio do Picapau Amarelo”. Criou a série de animação “Vai dar Samba”, cujo piloto foi exibido pelas TVs Cultura e Ra-Tim-Bum. E dirigiu a série “Mundo Ripilica, as Aventuras de Lilica, a Coala” (Discovery Kids). Depois, codirigiu a série “Diário de Pilar” (Nat Geo Kids/Disney). Teve importante atuação na produtora Multirio, da prefeitura carioca.
O pianista André Mehmari, de 47 anos, que abriu, na Sala São Paulo, poucos anos atrás, o belíssimo concerto dos cubanos Chucho Valdez e Gonzalo Rubalcaba, é um dos grandes nomes da chamada música criativa brasileira contemporânea. Sua pegada vai do jazz à ópera, do choro à música orquestral e de câmara, sem esquecer as canções populares. Com dezenas de álbuns lançados nos últimos 25 anos, ele traz um ponto em comum com a trupe de “Abá e sua Banda”: o amor pela Natureza. Mehmari mantém seu estúdio — o Monteverdi — no coração da Mata Atlântica. Está, portanto, mais que explicada a escolha do artista como trilheiro dessa animação de “alma verde”.
Outro nome essencial na retaguarda de Humberto Avelar é o da produtora Silvia Frahia, que acaba de lançar, nos cinemas, seu primeiro longa solo, o documentário “Todo Dia é Dia de Feira”. Mas ela chegou à direção depois de dedicar-se, por anos, às funções de produtora executiva e/ou produtora. Soma dez longas-metragens no currículo, entre eles “Não Quero Falar sobre isso Agora”, vencedor de seis prêmios no Festival de Gramado, “Duas Vezes com Helena” e “O Enfermeiro”, todos de Mauro Farias, e “Antes que Eu Esqueça, de Tiago Arakilian. Produziu, ainda, três longas de outro integrante do clã cinematográfico Farias, Maurício: “Veronica”, com Andréa Beltrão, e Vai que Dá Certo (1 e 2), que venderam, juntos, mais de 4 milhões de ingressos.
Será que a criançada vai se envolver com a singela estória do Príncipe Abá (Caxi)?
Uma coisa se pode afirmar: o filme é dotado de grande beleza plástica e bem movimentado. Seus cenários são tão bonitos quanto aqueles que, outrora, foram criados por Walbercy Ribas, para as campanhas da Sharp (aquelas protagonizadas pelo Grilo Feliz). E, sem didatismo, consegue motivar os pequeninos a amar a Natureza e acessar rudimentos da luta democrática. Um país pode ser um reino ou uma república, desde que pautado pela igualdade de direitos e luta pela justiça social.
Detalhes curioso: o singelo roteiro de “Abá e sua Banda” subverte o lugar-comum que nosso idioma associa a algumas frutas. A banana Ana não é uma “banana”. Muito pelo contrário. É esperta, atirada e cheia de energia. O Abá-caxi não é sinônimo de coisa ruim. Ele luta por seu sonho (ser guitarrista e cantor) e será um governante que lutará pelo bem de todos. Vale prestar atenção nos outros personagens que representam frutas de pomar: caju, morango, melão, pitanga, melancia, manga e jabuticaba (Zezé Motta), a sábia narradora.
Abá e sua Banda
Brasil, 2025, 84 minutos
Direção: Humberto Avelar
Produção: Silvia Frahia, com coprodução da Studio Z, Gloob-Globo, Riofilme
Roteiro: Silvia Fraiha, Sylvio Gonçalves, Daniel Fraiha
Direção de Fotografia: Studio Z
Direção de Animação: Alan Camilo
Concept LookDev: Pedro Conti
Direção de Arte: André Leão
Trilha musical: André Mehmari, Silvia Fraiha, Milton Guedes
Trilha sonora original: André Mehmari
Personagens e suas vozes: Abá (Filipe Bragança), Juca (Robson Nunes), Ana (Carol Valença), Rei Caxí (Mauro Ramos), Mel Melancia (Monica Martins), Dom Caraguatá (Humberto Avelar), Melão Rosa (Rafael Infante), Titikaba (Zezé Motta), Fusário (Marco França), Quibaba (Italo Luiz), Mangazumba (Matheus França), Moranqueen (Monica Martins), Pitagandhi (Hugo Picchi), Major Kleber Kiwi + Guarda 2 (Italo Luiz), Guarda Caraguatá 1 (Hugo Picchi ) e Jabutikabinha Coquinhos (Gabriel Avellar)
Distribuição: Manequim Filmes