Cinema de animação

Porto Alegre, 2002. O casal Camila Gonzatto e Frederico Pinto resolvia abrir uma produtora voltada para TV e, especialmente, para o cinema. Armazém de Imagens foi o nome escolhido. Naquele mesmo ano, a produtora estrearia seu primeiro curta-metragem (“Bolinhos”, sobre um amor proibido entre dois docinhos de aniversário), além de um trabalho para a RBS TV (“24 horas”, sobre uma atriz de sucesso e um tipinho qualquer que ficam presos em um banco 24 horas). Desde então, nunca pararam. Já somam cinco curtas-metragens em 35mm (“Docinhos”, “Intimidade”, “Os Olhos do Pianista” e “De La pra Cá”), produziram diversos programas de TV (“Salão Aurora”, “Foi Onde Deu pra Chegar de Bicicleta” e “Tom e Tom-Tom”, entre outros) e ganharam os principais editais de fomento para o setor (Fumproarte, BNDES, Petrobras Cultural e Ministério da Cultura).

“A Camila é minha esposa e minha sócia. Ela também é roteirista e diretora. Na produção, fazemos uma dobradinha. Ela produz os meus projetos e eu produzo os dela. Somos uma dupla de criadores, focados em produzir apenas os nossos projetos. Já ganhamos os principais editais nacionais e nossos curtas participaram de diversos festivais no Brasil e no exterior, recebendo prêmios”, diz Frederico, às voltas com o primeiro longa-metragem da empresa, a animação infantil “As Aventuras do Avião Vermelho”, coproduzido com a Okna Produções e codirigido com o amigo e animador José Maia.

“As Aventuras do Avião Vermelho” é uma adaptação animada do livro homônimo de Érico Veríssimo, publicado originalmente em 1936, e que conta a história de um aviãozinho vermelho e seu pequeno comandante, o travesso Fernandinho, de 8 anos. Ao lado de um urso de pelúcia e um boneco chamado Chocolate, Fernandinho vive por conta própria as aventuras que havia lido em um livro. Sua missão? Salvar o Capitão Tormenta, famoso aviador protagonista da obra, que está preso no Kamchatka.

O personagem Fernandinho e seus amigos voando pelo espaço sideral em “As Aventuras do Avião Vermelho”

“A minha vontade de contar histórias surgiu através da literatura e dos quadrinhos. Por isso, queria trabalhar com uma adaptação e com animação. Para que aqueles que leram o livro vejam o filme e para quem viu o filme leia o livro”, conta Frederico. “O Maia tinha uma experiência de mais de 30 anos em animação, mas nunca tinha dirigido um longa. Em 2002, ele dirigiu comigo o ‘Docinhos’, um curta em stop motion. Daí surgiu a vontade de fazermos um longa”, continua o diretor, citando, em seguida, suas principais influências, “em animação, acompanho o trabalho da Aardman, da Folimage e do estúdio Ghibli. Já na ficção, tenho gostado dos irmãos Dardenne, de filmes argentinos (‘Histórias Mínimas’, ‘Las Acacias’), uruguaios (‘Whisky’, ‘Gigante’) e asiáticos (‘Nobody Knows’, ‘Casa Vazia’, ‘Be with Me’)”.

Crianças é o foco do filme

Para Frederico, o livro de Veríssimo já era cinematográfico, com um apelo visual forte e cheio de ação. A maior dificuldade do projeto foi trabalhar com um livro de 1936. “Era um mundo completamente diferente. Neste sentido, foi bem importante o trabalho de consultoria do Miguel Machalski (consultor de roteiros argentino, radicado na França). Como ele leu o roteiro sem conhecer o livro, as observações dele foram pensando apenas no filme. Isso foi importante para que o longa se sustentasse para quem não leu o livro”.

Como toda animação, o trabalho começou pelo roteiro e, logo depois, pelo conceito visual e o design dos personagens. Em seguida, Frederico, Maia e equipe animaram em papel na mesa de luz, em um processo que começou analógico e terminou digital. “Os animadores fazem as posições chave, aí os intervaladores completam essa animação e o calque passa a limpo os traços do desenho. Depois esse desenho é digitalizado, colorido no photoshop e a animação é editada em after. Também trabalhamos com alguns elementos em 3D, como o avião, os carros e alguns cenários. Esses elementos são integrados na edição da animação”.

“As Aventuras do Avião Vermelho” se encontra agora na etapa de finalização. É hora de finalizar a edição, mixar as músicas e trabalhar no desenho de som. O filme já teve seus primeiros 15 minutos exibidos no Festival Internacional de Cinema de Animação de Annecy (França) e no BUFF Film Festival de Malmö (Suécia). Para Frederico, ótimas oportunidades para, claro, ter uma ideia de como o filme se comunica com o público, e também encontrar algumas parcerias.

Preparação pedagógica

“No BUFF, conversamos com educadores que destacaram a universalidade dos temas. Alguns se identificaram com o pai da nossa história, que cada vez tem menos tempo para dedicar aos filhos. Em Annecy, a apresentação foi uma palestra de duas horas sobre o processo de produção, desde os primeiros esboços, passando por testes de animação e chegando ao resultado final. Como o público era bem especializado, as perguntas foram focadas no processo de produção”, explica o diretor, sublinhando que foi em outro evento internacional que “As Aventuras do Avião Vermelho” ganhou distribuição no Brasil. “O Abrão Scherer da Imagem Filmes conheceu o projeto no Cartoon Connection, em Buenos Aires. Depois disso, conversamos na Mostra Infantil de Florianópolis. A partir daí, fizemos algumas reuniões e fechamos a parceria”.

A Revista de CINEMA teve acesso a estes 15 minutos e o resultado tem qualidade para agradar seu público. Fernandinho é um menino travesso, o terror dos bichos da casa. Chocolate é um boneco de pouca paciência e um tanto resmungão, ao contrário do dócil e devagar Ursinho. E o filme é sutil, como poucas animações por aí. “As Aventuras do Avião Vermelho” entra em cartaz em outubro, mas deverá estrear em algum festival internacional pelo mundo. Frederico se diz ansioso: “É um filme sobre descobertas: da imaginação, da leitura, da relação pai e filho. Então, espero que o público também faça essas descobertas e embarque nessa aventura”.

Mas este não é o único projeto do Armazém de Imagens. A empresa desenvolve o projeto de seu segundo longa-metragem “Alice” (sobre uma fotógrafa de 35 anos que não consegue estabelecer relações afetivas duradouras), dirigido por Camila Gonzatto, e ainda ganhou um edital (Histórias que Ficam, da Fundação CSN) para a realização de um documentário, “50 aniversários”, um filme de imagens de arquivo sobre a passagem do tempo e a celebração da vida através das festas de aniversário. Uma animação, uma ficção e um documentário. Este Armazém é uma produtora no mínimo diferente. “Mas isso aconteceu naturalmente”, diz Frederico. “A história que quero contar acaba determinando se vai ser um documentário, uma ficção ou uma animação. Além disso, cada vez mais essas fronteiras estão borradas”.

 

Por Julio Bezerra

One thought on “Cinema de animação

  • 13 de julho de 2012 em 07:48
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    Assisti pelo canal brasil um excelente desenho animado sobre a guerra de canudos feito por um gaucho q não lembro seu nome. Muito bom…

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