Um balanço de 2014 e as perspectivas para 2015

Ao que tudo indica, 2014 deve ficar bem longe de 2013 em termos de ingressos vendidos e de market share. 2013 foi um bom ano: quase 28 milhões de ingressos vendidos, representando 18,6% do total – um salto em relação a 2011 e 2012. Mas 2014 deve nos levar de volta a esses patamares inferiores, bem abaixo das expectativas. Até o fechamento desta matéria, o cinema brasileiro vendeu por volta de 15 milhões de ingressos, representando 12% do total – com estimativa de aumentar e de se aproximar dos 20 milhões de ingressos com o lançamento de filmes, como as cinebiografias “Tim Maia”, de Mauro Lima, “Irmã Dulce”, de Vicente Amorim, e “Trinta”, de Paulo Machline, o religioso “A Palavra”, de Guilherme de Almeida Prado, e as comédias “Made in China”, de Estevão Ciavatta, “A Última Festa do Ano”, de Fábio Mendonça, e “Os Cara de Pau”, de Felipe Joffily.

As expectativas para 2015 é que o ano se aproxime de 2013 em termos de público e de participação. Como nos últimos anos, a comédia, em geral com apoio da Globo Filmes, deve reinar. São as campeãs de bilheteria em 2014, por exemplo: “Até que a Sorte nos Separe 2”, de Roberto Santucci, fez 4 milhões (sendo 3 em 2014, já que o filme estreou na última semana de 2013); “O Homens São de Marte… E É pra Lá que Eu Vou!”, de Marcus Baldini, fez 1,8 milhão; “S.O.S. Mulheres ao Mar”, de Cris D’Amato, também 1,8 milhão; “Muita Calma Nessa Hora 2”, de Felipe Joffily, fez R$ 1,4 milhão; “Vestido pra Casar”, de Gerson Sanginitto, fez 1,3 milhão; “O Candidato Honesto”, de Roberto Santucci, fez, até o momento, pouco mais de um milhão, alcançado em apenas duas semanas de exibição e com potencial para crescer bastante ainda.

“Irmã Dulce”, de Vicente Amorim, é mais uma aposta em cinebiografias. © Ique Esteves

Star system garante sucesso nas continuidades das comédias 

Ainda que as comédias sejam as únicas em 2014 a ultrapassarem a marca de um milhão de espectadores, talvez haja um desgaste do gênero em relação ao interesse do público. Especialmente, considerando que a única a ultrapassar os 2 milhões seja uma continuação, lançada em 2013. O sucesso fez com que mais comédias buscando grande público fossem feitas, inundando os cinemas com filmes do mesmo estilo. Ao que tudo indica, o star system e a vinculação a franquias (TV, teatro, filme anterior etc.) devem fazer a diferença. Dos seis primeiros, três são protagonizados pelo comediante Leandro Hassum (“Até que a Sorte nos Separe 2”, “Vestido pra Casar” e “O Candidato Honesto”), um vem do teatro (“O Homens São de Marte… E É pra Lá que Eu Vou!”) e outro também é continuação (“Muita Calma Nessa Hora 2”). Outras comédias também figuram entre os mais vistos no ano, mas com resultados mais modestos, como “Confissões de Adolescente – O Filme”, de Daniel Filho e Cris D’Amato, com 815 mil espectadores, “Copa de Elite”, de Vitor Brandt, com 645 mil, e “Julio Sumiu”, de Roberto Berliner, com 180 mil.

“O cinema brasileiro vive do star system. Os grandes comediantes estão conscientes da sua importância para os excelentes resultados dos filmes estrelados por eles. A consequência é uma participação cada vez mais intensa desses comediantes no processo criativo e econômico desses filmes”, afirma Bruno Wainer, da Downtow­n Filmes, responsável por quatro desses longas. Além de Hassum, que deve voltar às telas em 2015, outros nomes se consolidaram nos últimos anos, como Fábio Porchat, Ingrid Guimarães, Bruno Maz­zeo, Paulo Gustavo, entre outros.

“Até que a Sorte nos Separe 2”, de Roberto Santucci, fez 4 milhões de espectadores em 2014

Para 2015, diversas comédias já estão programadas e devem ser lançadas buscando ultrapassar o milhão de espectadores: “Loucas para Casar”, de Roberto Santucci, “De Pernas pro Ar 3”, também de Santucci, “220 Volts”, de André Pellenz, “Divã 2”, de Paulo Fontenelle, “Superpai”, de Pedro Amorim, “Tudo Bem Quando Termina Bem”, de José Eduardo Belmonte, “Ponte Aérea”, de Julia Rezende, “Qualquer Gato Vira-Lata 2”, de Tomás Portella, “Meu Passado me Condena 2”, de Julia Rezende, “Até que a Sorte nos Separe 3”, de Roberto Santucci, “Tô Ryca”, de Pedro Antonio, “Linda de Morrer”, de Cris D’Amato, “Minha Mãe É uma Peça 2”, de André Pellenz, e “O Herdeiro”, de Roberto Santucci. “2015 será marcado pela consolidação das franquias. A tendência é a consolidação das comédias como o gênero numero um na preferência popular”, comenta Wainer. Ao menos cinco continuações devem estrear no ano que vem, fora a adaptação de produtos televisivos, entre outros.

“Enquanto houver dinheiro no bolso da população, a comédia vai imperar. Sempre foi assim, historicamente, no cinema nacional, desde as chanchadas da Atlântida, Mazzaropi, Cinédia e depois na primeira fase das ditas pornochanchadas. A interrupção destes ciclos se deu sempre por motivos alheios aos filmes em si (crise econômica, recrudescimento da censura etc.). As comédias atuais só fazem dar continuidade ao processo histórico”, explica Wainer.

Leandro Hassum em “O Candidato Honesto”, em mais uma parceria com Santucci, em seu terceiro filme lançado em 2014. © Páprica Fotografia

Policial e biografias se destacam enquanto infanto-juvenil e horror continuam em baixa  

Em 2014, alguns outros gêneros deram as caras, com maior ou menor sucesso. O que mais se deu bem foi o policial, com “Alemão”, de José Eduardo Belmonte. O longa fez 955 mil espectadores. Por ser um gênero mais trabalhoso, em geral mais caro, não há nada parecido previsto para ser lançado em breve. Outro que se deu bem foi o drama biográfico de figuras não musicais – que representam os melhores resultados de bilheteria, conseguindo ultrapassar a barreira do um milhão de espectadores. “Getúlio”, de João Jardim, sobre o ex-presidente Getúlio Vargas, conseguiu honrosos 500 mil espectadores. Bem abaixo, “Não Pare na Pista”, de Daniel Augusto, sobre o escritor Paulo Coelho, chegou aos 100 mil. “‘Alemão’ provou que esse gênero é vencedor, só precisamos entregar ao público o que ele espera. O maior exemplo é o ‘Tropa de Elite’. As biografias, o mesmo caso. São dois gêneros consagrados, porém de execução mais elaborada, orçamentos mais altos, então não conseguem ser entregues na velocidade das comédias. Mas estarão cada vez mais presentes nos próximos anos”, comenta Wainer. Em 2015, o ator Wagner Moura deve passar para trás das câmeras com a cinebiografia de Carlos Marighella, e o montador Daniel Rezende deve estrear no longa com “Vida de Palhaço”, sobre a vida de Arlindo Barreto, mais conhecido pelo sua personificação do palhaço Bozo. Bruno Barreto deve rodar ainda “João – O Milagre das Mãos”, sobre o maestro João Carlos Martins.

Novo filme de Julia Rezende, “Ponte Aérea”, é mais um lançamento previsto para 2015. © Páprica Fotografia

Outro gênero que tentou emplacar no circuito brasileiro foi o horror. O filme do gênero que obteve melhor resultado foi “Isolados”, de Tomas Portella, com 81 mil espectadores. Outros, como “Quando Eu Era Vivo”, de Marco Dutra, “Gata Velha Ainda Mia”, de Rafael Primot, e “Mar Negro”, de Rodrigo Aragão, tiveram resultados insipientes, abaixo dos 10 mil espectadores. “O gênero horror é mais complicado. Não temos tradição e o público vê com desconfiança. Mas é um gênero viável economicamente e é uma questão de investir, pois creio que, em algum momento, poderá conquistar a confiança do público”, pontua Bruno Wainer. Para 2015, devem estrear “Terapia do Medo”, de Roberto Moreira, distribuído pela Warner, e os independentes “As Fábulas Negras”, com episódios de Rodrigo Aragão, Petter Baiestorf, Joel Caetano e José Mojica Marins, e “A Sinfonia da Necrópole”, de Juliana Rojas.

O policial “Alemão”, de José Eduardo Belmonte, beirou o milhão de espectadores, mas é um gênero que não terá sequências no ano que vem. © Páprica Fotografia

Também tem buscado seu espaço o infanto-juvenil. Em 2014, “Confissões de Adolescente”, já citado, foi o mais próximo, do juvenil, a alcançar um público respeitável. Outros tentaram, como a coprodução franco-brasileira “Amazônia”, de Thierry Ragobert, com 75 mil espectadores, e a animação “O Menino e o Mundo”, de Alê Abreu, premiada como melhor filme no Festival de Annecy, o maior do mundo para animações, com 30 mil. 2015 tem uma aposta sólida para esse nicho: “Carrossel, o Filme”, sem diretor definido, adaptação da versão brasileira da novela mexicana. Entre as animações, devem chegar “O Clube Secreto dos Monstros”, de Victor-Hugo Borges, e “Teca e Tuti em: uma Noite na Biblioteca”, de Diego Doimo.

Independentes revigoram a qualidade do cinema brasileiro

2014 foi um ótimo ano para alguns independentes. Dois em especial, que compartilham o fato de trabalharem com sensibilidade a questão homossexual. Tanto “Hoje Eu Quero Voltar Sozinho”, de Daniel Ribeiro, que fez 200 mil de público, quanto “Praia do Futuro”, de Karim Aïnouz, que teve 130 mil espectadores, estiveram no Festival de Berlim deste ano. O primeiro, na mostra paralela, ganhou vários prêmios, inclusive o Teddy de melhor filme, e depois emplacou a indicação brasileira para o Oscar; o segundo foi exibido na competição principal de Berlim. O filme gay talvez seja um caminho para o cinema independente conseguir chegar ao seu nicho – os únicos a ultrapassarem a barreira dos 100 mil espectadores.

“Hoje Eu Quero Voltar Sozinho”, de Daniel Ribeiro, fez 200 mil de público e conquistou uma indicação para disputar uma vaga ao Oscar

O cinema independente brasileiro teve filmes bastante comentados no círculo de festivais e de críticos, vários dos quais chegam ao circuito em 2014. Entre eles, “A História da Eternidade”, de Camilo Cavalcanti, “Casa Grande”, de Felipe Gamarano Barbosa, “Ausência”, de Chico Teixeira, “Obra”, de Gregorio Grasiozi, “Campo de Jogo”, de Eryk Rocha, “A Vida Privada dos Hipopótamos”, de Maíra Bülher e Matias Mariani, “Branco Sai, Preto Fica”, de Adirley Queirós, “Ela Volta na Quinta”, de André Novais Oliveira, “A Vizinhança do Tigre”, de Affonso Uchoa, “Periscópio”, de Kiko Goifman, “Sangue Azul”, de Lírio Ferreira, “Infância”, de Domingos de Oliveira, “A Luneta do Tempo”, de Alceu Valença, “Prometo um Dia Deixar essa Cidade”, de Daniel Aragão, “O Fim e os Meios”, de Murilo Salles, e “Brasil S/A”, de Marcelo Pedroso, entre outros.

“Prometo um Dia Sair dessa Cidade”, de Daniel Aragão, uma promessa do cinema independente

Outros filmes, se não estrearem, devem ao menos começar a fazer o circuito de festivais, como “SP É uma Festa”, de Vera Egito, “Obra-Prima”, de Daniel Filho, “Depois da Chuva”, de Cláudio Marques e Marília Hughes, “Mundo Cão”, de Marcos Jorge, “Mãos de Cavalo”, de Roberto Gervitz, “Big Jato”, de Cláudio Assis, “Valeu Boi!”, de Gabriel Mascaro, “Clarisse ou Alguma Coisa sobre Nós Dois”, de Petrus Cariry, “Dois Casamentos”, de Luiz Rosemberg Filho, “A Estrada do Diabo”, de André Moraes, “A Cidade onde Envelheço”, de Marília Rocha, “Cartografia do Prazer”, de Eduardo Kishimoto, “Califórnia”, de Marina Person, “Voltando para Casa”, de Gustavo Rosa, e “Elon Rabin Não Acredita na Morte”, de Ricardo Alves Jr.

“A História da Eternidade”, de Camilo Cavalcanti, foi o grande destaque do ano, premiados em vários festivais

 

Por Gabriel Carneiro

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