Almodóvar e Amenábar lideram lista de concorrentes aos Prêmios Goya

Por Maria do Rosário Caetano

A Academia de Cinema da Espanha entrega, no sábado, 25 de janeiro, os Prêmios Goya aos melhores do cinema de língua castelhana. A estatueta, um busto de Francisco Goya, um dos maiores artistas do mundo ibérico, reunirá, em festa malaguenha-andaluza, nomes badalados como Pedro Almodóvar, Penélope Cruz, Antonio Banderas, Alejandro Amenábar e Antonio de la Torre.

Os principais concorrentes da cerimônia, que acontecerá na cidade natal de Banderas e de Pablo Picasso (Málaga), são os filmes “Dor e Glória”, de Almodóvar, “Mientras Dure la Guerra”, de Amenábar, “Intempérie”, de Benito Zambrano, “Lo que Arde”, de Olivier Laxe, e “La Trinchera Infinita”, de Aitor Arregi, Jon Garaño e José Maria Goenaga.

Um filme muito especial, o longa-metragem “Buñuel no Labirinto das Tartarugas”, híbrido de animação e documentário, conseguiu quatro indicações ao Goya. Além de melhor animação, disputa a estatueta de melhor diretor estreante (Salvador Simó), melhor música e melhor roteiro adaptado.

“Buñuel no Labirinto das Tartarugas” é uma adaptação de graphic novel de mesmo nome e realiza uma espécie de making of póstumo das filmagens de “Las Hurdes”, documentário que Luis Buñuel (1900-1983) realizou anos depois de causar sensação com os vanguardistas “O Cão Andaluz” e “A Idade do Ouro” e sair em busca de novos rumos para sua carreira.

Para triunfar na noite dos Goya, a saga buñuelina (ambientada num tempo – o começo da década de 1930 –, em que Las Hurdes chocava a consciência espanhola pela pobreza de seus habitantes) terá que derrotar “Klaus”, de Sergio Pablos, animação badaladíssima, com vagas garantidas no Oscar e no Bafta. E que recebeu uma segunda indicação ao Goya (melhor canção). O terceiro concorrente é “Elkano y Magallanes en la Primera Vuelta al Mundo”, de Ángel Alonso.

Sobre este terceiro longa animado, vale um registro, já que surgiram, no Brasil, bizarros e extemporâneos defensores da “terra plana”. O filme espanhol narra a aventura do Comandante Fernão de Magalhães (1480-1521), que navegou rumo ao desconhecido. A viagem, em cinco navios, que partiram de Sevilha e enfrentaram terríveis tormentas, foi concluída por Juan Sebastián Elkano. Depois de três anos, este navegante e sua tripulação completaram sua desafiadora aventura náutica e provaram que a terra é redonda.

O público brasileiro, em especial os cinéfilos, conhece três dos seis filmes espanhóis mais cotados para o Goya. “Dor e Glória”, que rendeu a Antonio Banderas a Palma de Ouro de melhor ator, em Cannes, foi lançado em nosso circuito de arte e vendeu 230 mil ingressos. “Lo que Arde” tornou-se objeto de culto na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro passado. Os diretores Alejandro Amenábar e Benito Zambrano, cujos novos filmes seguem inéditos em nossos cinemas, são conhecidos por aqui, pelo menos nos circuitos culturais.

Nascido no Chile, Amenábar, de 47 anos, chegou à Espanha na primeira infância. Seu primeiro longa-metragem a repercutir no Brasil foi “Tesis – Morte ao Vivo”, apresentado no Festival de Gramado. Depois, três de seus filmes, tiveram difusão significativa no circuito expandido de arte: “Abre los Ojos” (Preso na Escuridão, com Penélope Cruz), “Os Outros”, com Nicole Kidman, e “Mar Adentro”, este com Javier Bardem, que lhe rendeu o Oscar de melhor produção estrangeira (em 2005). O cineasta tem dois Goya de melhor filme na estante (por “Os Outros” e “Mar Adentro”).

Depois de realizar longas-metragens em língua inglesa (os obscuros “Regressão” e “Ágora”), Amenábar regressou ao idioma materno e à história da Espanha. “Mientras Dure la Guerra” se passa na década de 1930, período que assistiu à trágica eclosão da Guerra Civil Espanhola, vencida pelas falanges franquistas. O filósofo Miguel de Unamuno (1864-1936) apoiou, no nascedouro, as forças golpistas que combateram a República. Forças socialistas e comunistas, eleitas democraticamente, não resistiram (mesmo com auxílio de Brigadas Internacionais) ao poderio da reação.

Anos mais tarde, Unamuno teria se reposicionado politicamente e proferido célebre discurso na Universidade de Salamanca, contra o General Millán Astray. Fato que lhe valeu demissão da reitoria da instituição e que o levaria a passar seus derradeiros dias em prisão domiciliar. Por contar esta história, Amenábar teve número recorde de indicações ao Goya, 17. “Dor e Glória”, o franco favorito da competição, ficou com 16.

Benito Zambrano, de 55 anos, estudou Cinema na Escola Internacional de Cinema e TV de San Antonio de los Baños, em Cuba. Dois de seus filmes passaram por festivais brasileiros (ele venceu uma edição do Cine Ceará) e chegaram ao nosso circuito comercial: “Solas” (1999) e “Habana Blues” (2005). “Intempérie”, seu sétimo longa-metragem, disputa apenas seis estatuetas e o realizador ficou fora da lista de finalistas na categoria melhor direção.

“Intempérie”, que um crítico espanhol definiu como “um western ambientado na Espanha do pós-Guerra” e outro viu como “soma de road movie, thriller e drama rural”, baseia-se em romance de Jesús Carrasco e tem em Luis Tosar, ator de grande prestígio na Espanha, seu coprotagonista.

Um menino foge de seu povoado e adentra terras despovoadas da Andaluzia, devastada pela Guerra Civil. Durante sua fuga, o garoto encontra um silencioso pastor de cabras, que o ajudará a escapar de seus perseguidores (um capataz e seus ajudantes).

O drama de época “La Trinchera Infinita”, com elenco liderado por duas estrelas espanholas, Antonio de la Torre (o Pepe Mujica de “Uma Noite de 12 Anos”) e Belén Cuesta, recebeu 15 indicações ao Goya. Inclusive para sua trinca de diretores. Mais um filme ambientado nos anos 1930. Baseado em fatos reais, “La Trinchera”conta a história de Higino e Rosa, casados há poucos meses, que, atônitos, tomam conhecimento do estalar do conflito bélico entre Republicanos e Falangistas. Sentindo-se ameaçados, eles resolvem cavar um buraco dentro da própria casa, que sirva de abrigo (a trincheira do título).

O medo de represálias e o amor que une Higino e Glória os condenará a longo enclausuramento, que durou mais de três décadas. O filme participou da competição oficial do Festival de San Sebastián (a trinca Arregi, Garaño e Goenaga ganhou a Concha de Ouro de melhor direção) e foi bem recebido pela crítica, que o definiu como “obra notável e hipnótica, claustrofóbica, angustiante e nunca tediosa”.

“Lo que Arde”, o quinto concorrente ao Goya de melhor filme é uma obra singular. Dirigido pelo galego Oliver Laxe, a narrativa, de acontecimentos rarefeitos, se constrói com refinamento visual, inquietação experimental e fotografia perturbadora (de Mauro Arce). Selecionado para a mostra Un Certain Regard, em Cannes (vencida pelo brasileiro “A Vida Invisível”, de Karim Aïnouz), o filme conquistou o Prêmio do Júri. No Festival de Mar del Plata, na Argentina, foi eleito o melhor longa.

Num pequeno povoado, cravado nas montanhas da Galícia, ambienta-se “O que Arde”. Um rapaz, tido como incendiário, volta para casa depois de cumprir pena na prisão. Os dias transcorrem, sem maiores incidentes, com este homem e sua mãe, já idosa, cuidando da difícil sobrevivência. Até que sucede o que mais se temia: um incêndio de imensas proporções alastra-se pela região de forma apavorante. Quem será o culpado?

No campo dos intérpretes, dois dos mais conhecidos atores da Espanha (Penélope Cruz e Antonio Banderas – o terceiro é Javier Bardem) estão na disputa pelo Goya. Banderas pelo protagonista de “Dor e Glória”, um de seus trabalhos mais belos e profundos. Penélope concorre a atriz principal, pelo mesmo filme, ainda que seu papel não seja tão grande (ela interpreta a mãe do personagem de Banderas, quando criança). Suas concorrentes são Belén Cuesta (La Trinchera Infinita), Marta Nieto (Madre) e Greta Fernán (La Hija del Ladrón).

Os concorrentes do favorito Banderas são Karra Elejalde, o Miguel de Unamuno de “Mientras Dure la Guerra”, Luis Tosar (Intempérie) e Antonio de la Torre (La Trinchera Infinita).

Na categoria diretor estreante, Salvador Simó, de “Buñuel no Labirinto das Tartarugas” (apresentado no Brasil pelo Festival Anima Mundi) concorre com Gualter Gaztelu-Irritia, por “El Hoyo”, Belén de Funes, por “La Hija de un Ladron”, e Aritz Moreno, por “Ventajes de Viajar em Tren”.

Ao contrário do Bafta, o Oscar britânico, o Goya não tem seus olhos voltados ao cinema dos EUA. Sua mira é, primeiro, o cinema espanhol, depois o europeu, sem esquecer o latino-americano. Ao invés de premiar o melhor filme estrangeiro, o Goya conta com duas categorias internacionais. Uma premia o melhor filme da Europa. Os finalistas deste ano são o perturbador “Border”, de Ali Abbassi (Suécia), o potente “Os Miseráveis”, do estreante francês Ladj Ly, o apenas simpático “Yesterday”, do britânico Danny Boyle, e o drama homofetivo “Retrato de Uma Mulher em Chamas”, da francesa Céline Sciamma.

Na categoria melhor filme ibero-americano (anualmente o Brasil, via Ancine, é convidado a apresentar candidato), competem o Darín movie “A Odisseia dos Tontos”, de Sebastián Borenstein (Argentina), “Araña”, de Andres Wood (Chile), “Monos”, de Alejandro Landes (Colômbia), e o costarriquenho “O Despertar das Formigas”, de Antonella Sudasassi, que chega ao circuito de arte brasileiro nesta quinta-feira, 15. Pena que “Bacurau”, de Kleber Mendonça e Juliano Dornelles, não esteja entre os finalistas desta categoria.

OS PRINCIPAIS CONCORRENTES AO GOYA:

Melhor filme

.“Dor e Glória”, de Pedro Almodóvar
. “Mientras Dure la Guerra”, de Alejandro Amenábar
. “Intempérie”, de Benito Zambrano
. “Lo que Arde”, de Olivier Laxe
. “La Trinchera Infinita”, de Arregi, Garaño e Goenaga

Melhor diretor

. Pedro Almodóvar
. Alejandro Amenábar
. Olivier Laxe
. Aitor Arregi, Jon Garaño e José Goenaga

Melhor diretor estreante

. Salvador Simó, por “Buñuel no Labirinto das Tartarugas”
. Gualter Gaztelu-Irritia, por “El Hoyo”
. Belén de Funes, por “La Hija de un Ladron”
. Aritz Moreno, por “Ventajes de Viajar en Tren”

Melhor atriz

. Penélope Cruz (Dor e Glória)
. Belén Cuesta (La Trinchera Infinita)
. Marta Nieto (Madre)
. Greta Fernán (La Hija del Ladrón)

Melhor ator

. Antonio Banderas (Dor e Glória)
. Antonio de la Torre (La Trinchera Infinita)
. Karra Elejalde (Mientras Dure la Guerra”)
. Luis Tosar (Intempérie)

Melhor atriz coadjuvante

. Julieta Serrano (Dor e Glória)
. Natalie Poza (Mientras Dure la Guerra)
. Mona Martínez (Adiós)

Melhor ator coadjuvante

. Leonardo Sbaraglia (Dor e Glória)
. Asier Etxeandia (Dor e Glória)
. Luis Callejo (Intempérie)
. Eduard Fernández (Mientras Dure la Guerra)

 Melhor filme de animação

. “Buñuel no Labirinto das Tartarugas” (Estúdios Glow e Hampa Studio)
. “Klaus” (Atresmedia Cine e Studio Sergio Pablos Animation)
. “Elkano y Magalhanes en la Primera Vuelta al Mundo” (Elkano Dibulitoon)

Melhor filme europeu

. “Border”, de Ali Abbassi (Suécia)
. “Os Miseráveis”, de Ladj Ly (França)
. “Yesterday”, de Danny Boyle (Grã-Bretanha).
. “Retrato de uma Mulher em Chamas”, de Céline Sciamma (França)

Melhor filme Ibero-Americano

. “A Odisseia dos Tontos”, de S. Borenstein (Argentina),
. “Araña”, de Andres Wood (Chile)
. “Monos”, de Alejandro Landes (Colômbia)
. “O Despertar das Formigas”, de Antonella Sudasassi (Costa Rica)

Melhor documentário

. Historias de Nuestro Cine (Enrique Cerezo P.C.)
. Auto-Retrato (Altube Filmeak e Urresti Producciones)
. Ara Malikian, Una Vida Entre las Cuerdas (Kokoro Films)
. El Cuardo (Mare Films, S.L.)

Melhor roteiro original

. Pedro Almodóvar (Dor e Glória)
. David Desola e Pedro Rivera (El Hoyo)
. José Maria Goenaga e Luis Bordejo (Trincheira Infinita)
. Amenábar e Alejandro Hernández (Mientras Dure la Guerra)

Melhor roteiro adaptado

. Eligio Montero e Salvador Simó (Buñuel no Labirinto…)
. Benito Zambrano, Daniel & Pablo Remón (Intempérie)
. Isabel Peña e Rodrigo Serogoyen (Madre)
. Javier Gullón (Ventajas de Vivir en Tren)

Melhor fotografia

. José Luis Alcain (Dor e Glória)
. Javi Aguirre Erauso (La Trinchera Infinita)
. Mauro Harce (Lo que Arde)
. Álex Catalán (Mientras Dure la Guerra)

Melhor trilha sonora

. Alberto Iglesias (Dor e Glória)
. Arturo Cardélus (Buñuel no Labirinto das Tartarugas)
. Alejandro Amenábar (Mientras Dure la Guerra)
. Pascal Gaigne (La Trinchera Infinita)

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