Por que o Brasil ainda não tem um incentivo à produção audiovisual internacional?

Por Steve Solot

Esta é uma pergunta intrigante!

Talvez os formuladores de políticas no Brasil não estejam cientes dos benefícios de atrair produções internacionais de conteúdo audiovisual para o país, e de que a indústria local não é a única beneficiada. Na verdade, conforme amplamente divulgado pelos estudos da consultoria Olsberg•SPI, aproximadamente 67% dos gastos de uma produção audiovisual atingem setores fora da indústria cinematográfica, como mostra o gráfico a seguir.

As recomendações pela criação de tal incentivo no Brasil vêm de muitos anos. Por exemplo, no meu artigo publicado pela Revista de CINEMA, em 9 de janeiro de 2013, como então presidente da Rio Film Commission, avisei que o ano de 2012 foi marcado por grandes avanços na estruturação, criação de incentivos e promoção de film commissions na América Latina. O mesmo progresso, contudo, não foi compartilhado pelo Brasil.

Mais uma vez, em 28 de setembro de 2018, na minha apresentação para o Comitê Gestor do FSA da Ancine, como então diretor executivo da Rede Brasileira de Film Commissions-REBRAFIC, e presidente do LATC, comentei as recomendações do recém-criado Grupo de Trabalho Interministerial, e entre elas, “a realização de estudos específicos com vistas à adoção de medidas voltadas ao fortalecimento e ao aumento da competitividade das film commissions nacionais”, como a criação de incentivos. A apresentação destacou 12 diretrizes específicas para a criação de um modelo de incentivo para atender às produções estrangeiras.

Outro exemplo relevante para o Brasil é o recente estudo sobre o potencial de incentivo federal à produção audiovisual no México publicado pela Olsberg•SPI no mês passado, “Um Incentivo à Produção Audiovisual para o México”, que pode ser baixado em inglês ou espanhol aqui no site da Olsberg•SPI. O estudo examina o que a ausência deste incentivo significou para o setor audiovisual mexicano, e o que um incentivo deste tipo pode oferecer futuramente em termos de aumento de emprego e impacto econômico. Ele também examina os benefícios estratégicos mais amplos da produção de cinema e televisão no México.

Mais recentemente, em sua entrevista publicada no Tela Viva News, Juliana Funaro destacou a necessidade de um mecanismo de cash rebate no Brasil: Especialista em coproduções, Barry Company destaca necessidade de mecanismo de cash rebate no Brasil.

De fato, uma rápida observação no cenário de incentivos à produção internacional mostra que muitos países estão criando e/ou aumentando ou melhorando seus incentivos, justamente para atrair mais produções internacionais, devido ao impacto positivo que elas têm na economia como um todo e na indústria cinematográfica nacional especificamente. De acordo com o Índice de Incentivos Globais de maio da Olsberg•SPI, o número de incentivos em todo o mundo aumentou de 86 em 2017 para 111 em 2023.

E a Espanha é um dos melhores exemplos. Em 1º de janeiro de 2023, a província do País Basco introduziu novos incentivos fiscais com uma das maiores taxas (senão a maior) de dedução do mundo: até 70%. Também em 1º de janeiro, a Espanha continental elevou os limites de desconto em dramas de TV para 10 milhões de euros (cerca de 53 milhões de reais) por episódio, quantia que sobe para 18 milhões de euros (cerca de 95 milhões de reais) por episódio nas Ilhas Canárias.

Poucos países podem se igualar a esse nível de incentivo. Introduzidos em 2015 e aumentados em 2016 e 2020, os incentivos da Espanha continental chegam a 30% para um primeiro gasto de 1 milhão de euros, e 25% para os seguintes gastos. E o total de recursos disponíveis aumentaram de 19,5 milhões de euros em 2019 para 153 milhões em 2022.

A importância dos incentivos à produção internacional também foi destacada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento, na sua publicação “Criatividade e Investimento para a América Latina e no Caribe de 2021”: “Embora alguns países tenham desenvolvido marcos legais por meio de leis cinematográficas e programas estaduais e nacionais para acelerar o crescimento do setor, muitos outros estão em uma posição difícil para competir com centros audiovisuais mais consolidados no mundo, que oferecem talento, infraestrutura e incentivos diretos.”

No entanto, no Brasil, enquanto ainda não há incentivo federal à produção audiovisual, as prefeituras de São Paulo e do Rio de Janeiro tomaram a iniciativa de introduzir seus próprios incentivos à produção na forma de “cash rebate”, e outras cidades estão se preparando para fazer o mesmo.

No entanto, a nível nacional, a questão permanece: quando os formuladores de políticas do governo federal vão despertar para os impactos positivos que o Brasil está deixando de receber em termos de desenvolvimento econômico, geração de empregos e promoção da indústria cinematográfica nacional?

 

Steve Solot é Presidente da Latin American Training Center – LATC Rio de Janeiro (steve.latc@gmail.comwww.latamtrainingcenter.com) e Associado – América Latina Olsberg•SPI Londres (steve@o-spi.comwww.o-spi.com)

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