Cine Ceará premia o uruguaio “Milonga” e os brasileiros “Fenda”, “Raposo” e “Antônio Bandeira”
Foto ® Luiz Alvez Arte e Foto
Por Maria do Rosário Caetano, de Fortaleza (CE)
O longa uruguaio “Milonga”, de Laura González, conquistou o Troféu Mucuripe de melhor filme ibero-americano na trigésima-quarta edição do Cine Ceará.
A cerimônia, realizada no Cineteatro São Luiz, contou, além da entrega do Troféu Mucuripe aos vencedores, com homenagem ao ator Gero Camilo (Prêmio Eusélio Oliveira por sua trajetória) e exibição hors concours do vigoroso e complexo “Baby”, de Marcelo Caetano. Uma história de amor homoafetivo como nunca se vira num longa-metragem brasileiro.
“Milonga”, filmado na cidade de Montevideo, conquistou também o Mucuripe de melhor roteiro, escrito pela diretora Laura González, e prêmio em dinheiro no valor de R$40 mil, a serem obrigatoriamente investidos em seu lançamento no circuito de arte brasileiro.
O filme platino, protagonizado pela chilena Paulina García (“Glória”), coadjuvada pelo uruguaio César Troncoso (“O Banheiro do Papa”) e pelo argentino Jean-Pierre Noher (“Um Amor de Borges”), acompanha a vida de Rosa, uma viúva tomada pela melancolia. Ela tem um filho recém-encarcerado, que não quer vê-la de jeito nenhum.
Uma eufórica amiga, Margarita (Layla Reys), tentará tirar Rosa da solidão em que se encontra. Quem, porém, conseguirá motivá-la a ir a uma Milonga para ouvir (e dançar) tango será Juan, um modesto pintor de paredes e prestador de serviços hidráulicos.
Laura González, que constrói sua narrativa com sutileza e pegada minimalista, reflete sobre os muitos revezes somados à vida de Rosa. Uma pergunta — a viúva conseguirá libertar-se das marcas de seu passado opressivo? — sedimenta a segunda parte de “Milonga”, ópera prima (obra de estreante) da realizadora uruguaia.
Além da competição ibero-americana de longas-metragens, o Cine Ceará premiou — com economia de troféus e sem distributivismo caridoso — títulos das competições de curtas brasileiros e de longas-e-curtas cearenses.
Os premiados foram “Fenda”, de Lis Paim, produção cearense com DNA baiano (melhor curta brasileiro), o longa documental “Antônio Bandeira – O Poeta das Cores”, de Joe Pimentel, e o curta “Raposa”, de Margot Leitão e João Fontenele. Estes dois últimos foram os eleitos da mostra Olhar do Ceará.
“Fenda” foi o escolhido do júri nacional por suas evidentes qualidades, não por ser uma produção prata-da-casa. O curta-metragem, que já fôra selecionado e premiado no Festival de Gramado (Prêmio da Crítica e melhor atriz para Edvana Carvalho), promove acerto de contas entre uma professora universitária (a baiana Edvana) e sua mãe já idosa e com problemas respiratórios (Noélia Montanhas). As duas atrizes afro-baianas dão um show de interpretação. E, com sutileza, revelam as fissuras afetivas que distanciaram mãe e filha.
“Antônio Bandeira – O Poeta das Cores” resgata a trajetória do pintor cearense (1922-1967 ), que viveu em Paris e causou sensação com seus quadros em diálogo permanente com o abstracionismo lírico. Morte prematura, aos 45 anos, em solo francês (lá vivia e lá foi enterrado) interrompeu a importante trajetória de Bandeira. Mas o artista deixou obra vasta, composta de mais de 5 mil pinturas, gravuras, desenhos e cartazes (incluindo o da Bienal de São Paulo, de 1954).
Os restos mortais do pintor foram trazidos para Fortaleza nas comemorações de seu centenário (de nascimento) e o estado nordestino tem se empenhado na divulgação de sua obra. O filme de Joe Pimentel chega como significativo estímulo à revalorização do artista.
“Raposa”, o curta que se destacou na mostra Olhar do Ceará, vem de Aracaú, cidade interiorana. A estreante Margot Leitão uniu-se a João Fontenele para contar a história de uma mulher de pequena cidade, conhecida como Raposa. Ela, com seu jeito peculiar, chamará atenção de Lelé, diarista que trabalha na casa vizinha. A relação entre os dois mudará por causa de estranhos ruídos sonoros vindos do lar de Raposa.
Na premiação de longas ibero-americanos, destacaram-se, além do vencedor “Milonga”, dois filmes: o documentário cubano “Reggaeton”, que rendeu inesperado Mucuripe de melhor direção a Fabien Pisani, e o brasileiro “Um Lobo Entre os Cisnes”, inspirado na trajetória do bailarino carioca Thiago Soares. Produção da TV Zero, empresa que comemora 30 anos de serviços audiovisuais, “Cisnes” chamou atenção por seu ótimo elenco e por suas qualidades técnicas.
O Cine Ceará já não premia atriz-ator principais e coadjuvantes. Mas sim, a “melhor atuação protagonista” e a “melhor atuação coadjuvante”. Independente se desempenhada por mulher, homem ou qualquer letra da sigla LGBTQI+.
Nessa edição, os homens levaram a melhor: o jovem Matheus Abreu, que aprendeu o básico (e um pouco mais) do ballet clássico para dar vida ao bailarino Thiago Soares, teve a “melhor atuação como protagonista”. E o argentino Dario Grandinetti conquistou seu segundo troféu brasileiro – o Mucuripe de atuação coadjuvante. Ele interpreta o “lobo” Dino Carrera, implacável preparador de bailarinos, de origem cubana, que viria a tornar-se o mentor do indisciplinado artista brasileiro.
Grandinetti, revelado nos filmes de Eliseo Subiela e consagrado pelo almodovariano “Fale com Ela”, atuou em apenas três filmes brasileiros (além de “Cisnes: “Bodas de Papel” e “Bem-Vinda, Violeta!”). Por este último ganhou o Troféu Redentor de melhor protagonista, no Festival do Rio. Pé-quente. Com apenas três títulos, conquistou duas láureas brasileiras.
Com a escolha de Matheus e Grandinetti para os dois troféus dedicados à atuação, as atrizes ficaram a ver navios. Caso da veterana Paulina García, a protagonista de “Milonga”, e da jovem Eugenia “China” Suárez, a Deolinda de “Linda”.
Confira os vencedores:
Longa ibero-americano
. “Milonga”, de Laura González (Uruguai-Argentina) – melhor filme, melhor roteiro (Laura González)
. “En La Caliente – Contos de um Guerreiro do Reggaeton”, de Fabien Pisani (Cuba-EUA) – melhor direção e melhor som (Lena Esquenazi, Valeria Mancheva, Jaime Baksht e Michelle Couttolenc)
. “Um Lobo Entre os Cisnes”, de Marcos Schetchman e Helena Varvaki (Brasil) – melhor atuação principal (Matheus Abreu), atuação coadjuvante (Dario Grandinetti), direção de arte (Dina Salem Levy)
. “Linda”, de Maria Wainstein (Argentina) – Prêmio da Crítica (Abraccine), melhor fotografia (Marcos Hastrup)
. “A Bachata de Biônico” (República Dominicana), de Yoel Morales – melhor montagem (Yoel Morales e Patrícia Pepen)
. “Brasiliana: o Musical Negro que Apresentou o Brasil ao Mundo” (Brasil) – melhor trilha sonora (Maestro José Prattes e Brasil Tropical)
Curta-metragem brasileiro
. “Fenda”, de Lis Paim (CE) – melhor filme e Troféu Samburá, do jornal O Povo
. “Dona Beatriz Ñsîmba Vita, de Catapreta (MG) – melhor direção
. “Cavaram uma Cova no meu Coração”(AL) – melhor roteiro (Ulisses Arthur e elenco), Prêmio Samburá, do jornal O Povo, pela melhor direção
. “Maputo”, de Lucas Abrahão (SP) – Prêmio da Crítica (Abraccine)
. “Eu Sou um Pastor Alemão”, de Angelo Defanti (RJ-SP) – Troféu Canal Brasil e prêmio no valor de R$ 15 mil
MOSTRA OLHAR DO CEARÁ
. “Antônio Bandeira – O Poeta das Cores”, de Joe Pimentel – melhor longa-metragem
. “Raposa”, de Margot Leitão e João Fontenele – melhor curta, Prêmio Unifor de Cinema (R$ 5 mil)
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