André Luiz Oliveira desenvolve sua carreira entre o cinema e a música

Por Maria do Rosário Caetano

O baiano-brasiliense André Luiz Oliveira, diretor de “Meteorango Kid, o Herói Intergalático” e de “Loucos por Cinema”, vem conciliando, com raro jogo de cintura, dois ofícios: o de diretor de cinema e o de músico e compositor. Em setembro último, ele lançou seu sétimo longa-metragem, “O Outro Lado da Memória”, revisita à conturbada (e interrompida) saga em que se transformou o projeto “Viva o Povo Brasileiro”. Por uma década, ele se propôs a transformar em filme o romance épico de João Ubaldo Ribeiro.

Na Mostra Brasília (ex-Câmara Distrital, atual BRB), realizada há 26 anos dentro do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, ele apresentou o novíssimo “Mito e Música – A Mensagem de Fernando Pessoa”, longa documental dirigido em parceria com a filha Rama Oliveira. E, de quebra, lançou novo CD: “Ser Fã”.

“Mito e Música” registra a saga do cineasta-compositor ao longo de três décadas consumidas na criação e gravação de três CDs dedicados ao conjunto de poemas “Mensagem”, único livro que Fernando Pessoa (1888-1935) publicou em vida. O grande escritor português consumiu 22 anos (de 1912 a 1934) na geração dos 44 poemas de “Mensagem”, considerados “nacionalistas e herméticos”. André Luiz consumiu quase 30 para transformá-los em música. Mas valeu a pena, pois nos três CDs estão belas melodias interpretadas por ótimos músicos e nas poderosas vozes de Gilberto Gil, Caetano Veloso, Cyda Moreira, Zambujo, Mônica Salmaso, Ney Matogrosso, Carlinhos Brown, entre outros.

Em 2020, André Luiz e Rama Oliveira vão cuidar do lançamento do documentário “Mito e Mensagem” e do CD “Ser Fã”. O novo disco é bem mais acessível que a trilogia pessoana. Afinal, suas doze faixas compõem, em seu conjunto, refinada ode à grande música popular brasileira, de Dorival Caymmi e Luiz Gonzaga, passando por João Gilberto, Tom Jobim, Caetano Veloso, Gilberto Gil e desaguando em Itamar Assumpção (a faixa mais inventiva do disco), Moraes Moreira, Armandinho, Carlinhos Brown e Djavan.

Na faixa que abre o CD, André explica o que é “Ser Fã”: “é padecer de uma saudade vã/ desde o início demorais no coração/ de um súdito de vossa majestade poetinha/ Ser fã é se entregar a uma fé pagã/ amanhecendo entre os acordes seus/ neste momento eles também são meus (…)”

As onze faixas seguintes trabalharão deliciosas aliterações e neologismos (“eu vim Cayminhando”, “itamaravilha”, “freveloso”, “morada do Moreira”) e construirão amplo painel dos principais ritmos brasileiros, com destaque para os nordestinos (frevo, xote, baião, axé olodúnico), sem esquecer o samba-enredo e o samba-exaltação e, claro, a Bossa Nova de João. João Gilberto, o baiano de Juazeiro, ganha delicada e sintética reverência como violonista único, intérprete idem e compositor, mesmo que de pérolas raras.

Entre “Ser Fã” (parceria com Costa Netto) e a elegíaca “Vinheta Nordestina”, vamos nos encantando com “Rei Luiz” (Gonzaga, claro!), “Poeta do Mar” (o oceânico Caymmi), João (“é só isso meu baião”), “Babá Gil” (o Gilberto), “Freveloso” (aquele que foi atrás do Trio Elétrico), “Nós no Peito” (djavânico), “Quem me Consola” (Paulinho da Viola?), “Morada de Moreira” (além de Moraes, evocação aos Novos Baianos e a Dodô & Osmar), “La Zumbi Canta” (a Lazzo Matumbi, ao Oldoum, Ilê Ayê e a todos os blocos afro-baianos), sem esquecer a Londrina-Tietê-São Paulo de Itamar Assumpção (“Itamaravilha”, uma maravilha das mais singulares). Ah, Luiz Tatit e sua Palavra Cantada também têm vez. Assim como Sivuca, Hermeto, Jackson do Pandeiro, Elomar, Xangai, Capiba, Dominguinhos, Oswaldinho, Alceu, Belchior, Fagner, Zé & Elba Ramalho, “o finado Raimundinho do Bendegó”, Chico Science, Lenine, Zeca Baleiro, “os repentistas do Nordeste inteiro” e “todo povo do forró”.

André Luiz Oliveira, aos 71 anos, segue louco por cinema. E por música. E se sai muito bem nos dois ofícios.

FILMOGRAFIA DE ANDRÉ LUIZ OLIVEIRA (Salvador, 1948)

1968 – “Meteorango Kid, o Herói Intergalático”

1975 – “A Lenda de Ubirajara”

1994 – “Loucos por Cinema”

2009 – “Cozinheiro do Tempo”

2011 – “Sagrado Segredo”

2014 – “Renato Mattos – Ziriguidum Brasília”

2019 – “O Outro Lado da Memória”

2020 – “Mito e Música – A Mensagem de Fernando Pessoa” (em parceria com Rama Oliveira)

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