Jorge Amado por Marcos Jorge

Agora falta pouco para que um dos livros menos famosos de Jorge Amado “Os Velhos Marinheiros”, talvez porque nunca tenha virado filme ou novela, ganhe finalmente os cinemas sob o nome “As Fantásticas Aventuras de um Capitão”. Lançado em 1961, o romance, um dos preferidos do autor baiano, teve seus direitos comprados pela gigante norte-americana Warner Brothers. O tempo, contudo, foi passando, passando, e nem um filme foi feito. Nenhuma gravação para a TV. Nada. Finalmente, Walkíria Barbosa, produtora da Total Filmes, resolveu tomar o desafio para si. E isso já faz bem uns dez anos.

“Pra mim, o projeto começou em 2009”, revela Marcos Jorge, diretor do filme. “A Total Filmes me telefonou perguntando se poderia me interessar realizar um filme a partir do romance do Jorge Amado. Fiquei imediatamente intrigado, pois apesar de ter lido o autor baiano na minha adolescência, só me lembrava muito vagamente deste romance”.

Cineasta paranaense, com formação em Roma, alguns trabalhos na publicidade, e um filme de grande sucesso, “Estômago”, um dos mais premiados nos últimos dez anos, Marcos Jorge pediu alguns dias para reler a obra. E ao chegar ao fim do livro, no exato momento em que o navio do Comandante Vasco chegava ao Cais de Belém, ele teve o que os cientistas chamam de “paramnésia” e os franceses de “déjà vu”: “Eu revivi, com detalhes, o momento em que, adolescente, me emocionara ao ler a cena magistralmente escrita por Amado. Pensei que se conseguisse fazer com que os espectadores sentissem a mesma comoção que eu, naquele momento, estava sentindo pela segunda vez, poderia fazer um filme muito especial”, revela.

Roteiro precisou de versão do inglês para o português

O convite foi então aceito, embora com uma condição: era preciso reescrever o roteiro. A Warner Brothers e a Total Filmes haviam dado a Marcos Jorge um roteiro em inglês, escrito por um americano quando da compra dos direitos. Para o cineasta, havia no texto certo distanciamento em relação ao romance, além de um olhar francamente estrangeiro sobre a história. Pois em janeiro de 2010, Marcos Jorge viajou para a Bahia, fez muitas pesquisas e retornou com um novo roteiro.

“Foi um período maravilhoso. Entre as várias coisas que me propus a fazer para escrever o filme, reli toda a obra do Jorge Amado, cronologicamente. A primeira versão ficou pronta em poucos meses, mas a que filmamos (a quarta), acabou sendo finalizada em meados de 2011. Assino o roteiro sozinho, mas durante todo o tempo em que o escrevi foi como se tivesse tido o mestre baiano ao meu lado. Eu parto do princípio básico de querer fazer os filmes que eu gosto de ver. E os filmes que eu gosto de ver são aqueles que conseguem me emocionar e divertir de maneira inteligente. Nesse sentido, posso dizer que me identifico bastante com a literatura de Jorge Amado, que consegue ser extremamente popular e ao mesmo tempo sofisticada”, diz ele.

Romance de aventura no começo do século XX

“As Fantásticas Aventuras de um Capitão” conta a história da chegada do comandante Vasco Moscoso de Aragão à vila de Periperi. Ele conquista rapidamente não somente os homens, que fazem roda para ouvir suas incríveis aventuras, como também as mulheres, seduzidas pelo charme do forasteiro. Logo surgem algumas inimizades, especialmente o fiscal Chico Pacheco que, até então, era o cidadão mais admirado do local. Pacheco desconfia de Aragão e começa a investigar a vida do comandante.

O romance de Jorge Amado situa a história nos primeiros anos do século XX. Marcos Jorge, no entanto, se decidiu por outro espaço-tempo. “Preferi, por diversas razões, situar a história num tempo pouco definido, somente anterior ao surgimento da internet, e terminá-la no Rio de Janeiro. Inicialmente, tratou-se de uma escolha estilística, uma atualização, perfeitamente justificada pelo fato do romance ser, dentre os escritos por Jorge Amado, um dos mais universais e atemporais”, confirma o cineasta, que teve certeza do que estava fazendo quando visitou a verdadeira Periperi, nos arredores de Salvador, que Jorge Amado descrevia como um bucólico e sonolento balneário, e hoje deu lugar a “um subúrbio degradado”.

Uma das grandes atrações do filme é seu elenco. José Wilker vive Chico Pacheco. Claudia Raia, Marcio Garcia, Mauricio Gonçalves, Milton Gonçalves, Patrícia Pillar, Sandro Rocha e Tainá Muller também estão no projeto. E o papel de Vasco Moscoso de Aragão ficou a cargo do astro português Joaquim de Almeida. O ator mora há décadas nos EUA e já participou de uma dezena de filmes americanos, como “Velozes & Furiosos 5 – Operação Rio” (2011), e de outras tantas séries de sucesso, como “CSI: Miami”, “24 Horas” e “The Mentalist” – ele ainda estrelou o brasileiro “O Xangô de Baker Street” (2001). Marcos Jorge conta que Joaquim de Almeida estava na primeira lista de atores que elaborou quando ainda escrevia o roteiro e que sua participação no filme foi viabilizada por uma coprodução com Portugal.

“Joaquim é um ator extraordinário, um dos melhores com quem já trabalhei. Disciplinado ao extremo, tem um comportamento irrepreensível, seja na preparação seja nas filmagens. Experiente, possui uma incrível noção de cinematografia e atua sabendo como a câmera o está filmando. E é capaz de atuações brilhantes. Em contrapartida, é muito exigente com a produção e com a direção, o que ajudou a imprimir um alto nível de profissionalismo em nosso set. Em relação ao sotaque, que não queríamos que fosse muito forte (mesmo tendo o personagem, no filme, nascido em Portugal) contamos com um ‘coach’ que ajudou Joaquim na preparação”, conta Marcos Jorge, sublinhando que o ator português não era o único estrangeiro do set.

Efeitos especiais e maquiagem para trazer o passado à tela

A produção dos muitos efeitos especiais ficou nas mãos do espanhol Juan Tomicic, vencedor de oito prêmios Goya, e a maquiagem nas da argentina Lucila Robirosa, a mesma de “O Segredo dos seus Olhos” – vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro em 2010. Sem contar com Diego Saura, filho do consagrado diretor Carlos Saura, que também trabalhou no visual do filme. As filmagens aconteceram entre março e maio deste ano. Periperi se transformou em uma mistura cinematográfica de Tiradentes, São João del Rei e de praias distantes do Rio de Janeiro. A cidade maravilhosa ainda serviu de set para a chamada Capital, onde se passa a história do então jovem comandante Vasco. Para Marcos Jorge, tratou-se de uma experiência desafiadora:

“Tínhamos um Plano de Filmagem apertado, uma quantidade enorme de atores e cenários, e muitas cenas complexas. Mas, com o empenho de todos os departamentos e a paixão que os profissionais brasileiros conseguem colocar no trabalho do cinema, conseguimos cumprir com nosso roteiro”, revela o cineasta, às voltas com a montagem e a complexa finalização do longa. “Estamos todos trabalhando e correndo para lançá-lo no final do ano”, finaliza.

 

Por Julio Bezerra

 

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