As surpresas e os fracassos

2013 foi um bom ano para o cinema brasileiro. Com estimados 25 milhões de ingressos vendidos (até o fechamento desta edição, já estava na casa dos 22 milhões) e um market share entre 18 e 19%, o filme brasileiro supera 2010 – ano de “Tropa de Elite 2” – e tem seu melhor ano desde a Retomada – só perde, no market share, para 2003, quando chegamos a 22%. E, como não podia deixar de ser, as comédias mais uma vez reinaram. Oito filmes ultrapassaram, até o momento, um milhão de ingressos vendidos em 2013, dois dos quais seis são comédias: “De Pernas pro Ar 2”, de Roberto Santucci, com 4,8 milhões, que estreou em 28 de dezembro de 2012; “Minha Mãe É uma Peça – O Filme”, de André Pellenz, com 4,5 milhões; “Vai que Dá Certo”, de Maurício Farias, com 2,75 milhões; “O Concurso”, de Pedro Vasconcelos, com 1,3 milhão; “Meu Passado me Condena”, de Julia Rezende, com 1,2 milhão; e “Mato sem Cachorro”, de Pedro Amorim, com 1,1 milhão – sendo que os dois últimos continuam a carreira. Até o final de 2013, outros dois filmes com muito potencial estreiam: “Crô”, de Bruno Barreto, e “Até que a Sorte nos Separe 2”, de Roberto Santucci.

“As comédias são preferência nacional, assim como as cinebiografias, os filmes de cunho religioso/espiritual e os filmes de ação. Basta ver o ranking dos mais vistos. Acontece que o gênero comédia é o primeiro a se profissionalizar. Tem muitos talentos na frente e atrás das câmeras – roteiristas – e um orçamento relativamente baixo, o que permite uma produção constante. E assim vai-se criando um círculo virtuoso, com o aprimoramento do gênero”, conta Bruno Wainer, à frente da distribuidora de filmes brasileiros Downtown Filmes.

Em 2013, o grupo de humor Porta dos Fundos se consolidou, transpondo as telinhas dos computadores, tablets e celulares, e inundou as publicidades. No cinema, alguns de seus integrantes viraram bilheteria garantida, em especial Fábio Porchat, que está a frente do elenco de “Vai que Dá Certo” (com Gregório Duvivier, também do Porta dos Fundos), “O Concurso” e “Meu Passado Me Condena”. Um filme do Porta dos Fundos também já foi anunciado.

As comédias prometidas para 2014

Wainer espera um 2014 ainda melhor. “2014 será um ano de ouro. Vamos ultrapassar com folga os 30 milhões de ingressos vendidos. E espero que a grande novidade seja o início da implantação do Vale Cultura [o benefício governamental que dará R$ 50,00 para serem gastos mensalmente em cultura]”, comenta.

Para o ano que vem, estão programadas as comédias: “Confissões de Adolescente”, de Daniel Filho e Cris D’Amato; “Julio Sumiu”, de Roberto Berliner; “Muita Calma Nessa Hora 2”, de Felipe Joffily; “Meus Dois Amores”; de Luiz Henrique Rios; “Divã 2”, sem diretor definido ainda; “Os Cara de Pau”, de Felipe Joffily; “Doidas e Santas”, sem diretor definido ainda; “Os Homens São de Marte”, de Marcus Baldini; “O Candidato Honesto”, sem diretor definido ainda; “Minha Mãe É uma Peça 2”, sem diretor definido ainda; e “Vestido para Casar”, de Gerson Sanginitto, entre outras, que devem aparecer ao longo de 2014. As continuações, nota-se, permanecem em alta. “Franquia é sinal de amadurecimento da indústria e as que forem baseadas em sucessos, se apresentarem novidade, têm tudo para não só repetirem o sucesso original, mas amplia-lo”, explica Bruno Wainer.

A comédia “Confissões de Adolescentes”, de Daniel Filho e Cris D’Amato, é promessa de boa bilheteria

Algumas dessas comédias devem vir a fracassar, ficando muito abaixo do esperado, como ocorreu em 2013 com comédias como “Odeio o Dia dos Namorados”, de Roberto Santucci, com 450 mil espectadores, “Se Puder… Dirija”, de Paulo Fontenelle, com 360 mil, “Giovanni Improtta”, de José Wilker, com 200 mil, e “A Casa da Mãe Joana 2”, de Hugo Carnava, com 150 mil.

Acertos e fracassos

Se as comédias são soberanas no cinema nacional e a expectativa é que isso se mantenha em 2014, alguns filmes de outros gêneros teimam na resistência à completa dominação. Quem tem se saído melhor nisso são os filmes derivados do universo da música brasileira. Em 2012, a única não-comédia a fazer mais que um milhão de espectadores foi “Gonzaga – De Pai para Filho”. Em 2013, dois filmes adaptados de Renato Russo, o líder da banda Legião Urbana, tiveram esse papel: “Somos Tão Jovens”, de Antônio Carlos da Fontoura, cinebiografia de Russo até a formação da Legião, fez 1,7 milhão; e “Faroeste Caboclo”, de René Sampaio, adaptação da música homônima da Legião, fez 1,5 milhão.

Em 2014, chega aos cinemas a cinebiografia “Tim Maia”, sobre o ícone do soul e funk brasileiro, com direção de Mauro Lima. Fora do escopo musical, duas outras cinebiografias tentam um lugar ao sol: “Trinta”, de Paulo Machline, sobre o carnavalesco Joãosinho Trinta, e “Irmã Dulce”, de Cesar Rodrigues, sobre a religiosa baiana.

“Tim Maia”, de Mauro Lima, é uma das três cinebiografias prometidas para 2014. © Páprica Fotografia

Gêneros como o policial e a ação têm dado resultado no cinema brasileiro, mas a produção é um tanto escassa, por isso, anos se passam sem que apareça um novo destaque. Em 2013, houve a tentativa fracassada de grande bilheteria com o gênero em “Serra Pelada”, de Heitor Dhalia, na casa dos 300 mil espectadores – e que deve apanhar para chegar aos 500 mil. A aposta para 2014 é “Alemão”, de José Eduardo Belmonte, sobre policiais infiltrados no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. Belmonte, um cineasta que tem se arriscado em diferentes gêneros, chega também com a comédia independente “Meu Mundo Quebrado”.

O ator Cauã Raymond, em “Alemão”: aposta no gênero policial de Eduardo Belmonte. © Páprica Fotografia

Filmes para a garotada

O cinema infanto-juvenil também tenta se colocar. “Tainá 3 – A Origem”, de Rosane Svartman, ficou abaixo dos 400 mil espectadores, ainda que represente um bom resultado para o gênero, fez bem menos que seus dois antecessores. Em 2014, devem aportar “O Segredo dos Diamantes”, de Helvécio Ratton, e “O Menino no Espelho”, de Guilherme Fiúza, adaptado do romance homônimo de Fernando Sabino.

Entre as animações, apesar da boa circulação mundial, “Uma História de Amor e Fúria”, de Luiz Bolognesi, ficou na casa dos 30 mil ingressos. Está prevista, para até o final de 2013, a estreia de “Minhocas”, de Paolo Conti e Arthur Nunes. Em 2014, devem estrear “O Menino e o Mundo”, de Alê Abreu, “Até que a Sbórnia nos Separe”, de Otto Guerra e Ennio Torresan Jr., ambos premiados em festivais brasileiros, e “Nautilus”, de Rodrigo Gava. Bruno Wainer vê com pessimismo o gênero no Brasil. “Animação brasileira, muito provavelmente, jamais será um gênero competitivo comercialmente, assim como a ficção científica ou qualquer gênero que tenha que ter como elemento principal a especialidade técnica aliada a um grande orçamento. Neste território (e somente neste), as majors reinam absolutas”, comenta.

O gracioso “Minhocas”, de Paolo Conti e Arthur Nunes, é a novidade na animação brasileira em stop motion

O drama, que triunfa como gênero produzido no país, tem alçado voos em busca de maiores bilheterias. “A Busca”, de Luciano Moura, conseguiu respeitáveis 350 mil espectadores, enquanto a superprodução “Flores Raras”, de Bruno Barreto, ficou na casa dos 275 mil, bem abaixo do esperado. Em 2014, filmes como “Confia em Mim”, de Michel Tikhomiroff, e “Entre Nós”, de Paulo Morelli, tentam esse caminho.

Lançamento regional

Algo que chamou a atenção do mercado cinematográfico brasileiro foi o sucesso de lançamentos regionais pontuais. “O Tempo e o Vento”, de Jayme Monjardim, adaptado do épico gaúcho de Érico Veríssimo, teria sido um fracasso monumental – esperava-se milhões do filme, e até o momento o longa contabiliza 650 mil espectadores – se não fosse a excelente carreira no Rio Grande do Sul, onde fez mais da metade de seu público. Lá, a estreia do filme foi antecipada em uma semana para coincidir com a comemoração da semana farroupilha. “Repeti em ‘O Tempo e o Vento’ o que já tinha feito no ‘Gonzaga’ (outro filme da Globo Filmes): programar um circuito muito maior nas suas regiões de ‘origem’ (Nordeste e Sul) do que os lançamentos nacionais normais. Foi uma estratégia em função da certeza que estas áreas teriam uma resposta muito melhor do que no restante do Brasil”, explica Bruno Wainer.

“Entre Nós”, de Paulo Morelli, representa os filmes dramáticos que buscará um espaço nas bilheterias de 2014

O destaque, porém, fica mesmo com o cearense “Cine Holliúdy”, de Halder Gomes. O filme, que circulou em festivais em 2012, estreou com lançamento apenas no Ceará. Lá, ficou mais de oito semanas como líder de bilheteria, sendo que nas primeiras alcançou a marca de mais de dois mil espectadores por sala – com sessões sempre esgotadas. Só no Estado, foram mais de 250 mil espectadores – mais outros 150 mil em praças nordestinas. Até o momento, o filme computa mais de 450 mil espectadores – e o longa acaba de ser lançado no Sudeste, e no Sul ainda sem previsão. “A experiência do ‘Cine Holliúdy’ foi especialmente saborosa e mostrou que existem muitos jeitos de se produzir e lançar um filme com sucesso, basta um pouquinho de conhecimento, criatividade e ousadia. Pré-vendi o filme para o Canal Brasil e com o recurso da pré-venda, fiz um lançamento local digno de blockbuster”, conta Bruno Wainer que também lançou o filme. “Já tenho um filme sergipano que gosto muito – “A Pelada” [de Damien Chemin, em coprodução Brasil-Bélgica] – primeiro filme produzido no Sergipe, e adotarei, lógico, a mesma estratégia”, complementa.

Filmes independentes

O dito cinema autoral raramente consegue uma bilheteria digna de nota. Resta a esses filmes um mercado de nicho, pequeno. Há público para esses filmes, a questão é saber como chegar a ele. O marco, em 2013, ficou por conta de “O Som ao Redor”, de Kleber Mendonça Filho, longa premiado pelo mundo e escolhido para representar o Brasil no Oscar 2014. O filme estreou em 12 salas e conseguiu, ao longo de sua carreira, dignos 95 mil espectadores. Infelizmente, “O Som ao Redor” parece ser uma exceção. Cada vez mais, filmes brasileiros independentes se veem com espaço reduzido e bilheterias minguantes, raras são às vezes em que ultrapassam a casa dos cinco mil espectadores.

“O Homem das Multidões”, de Cao Guimarães e Marcelo Gomes, é um dos filmes autorais que estreia no ano que vem

O cinema independente brasileiro teve filmes bastante comentados no círculo de festivais e de críticos, vários dos quais chegam ao circuito em 2014. Entre eles, “Avanti Popolo”, de Michael Wahrmann, “Os Dias com Ele”, de Maria Clara Escobar, “Èden”, de Bruno Sáfadi, “Os Amigos”, de Lina Chamie, “Amor, Plástico e Barulho”, de Renata Pinheiro, “De Menor”, de Caru Alves de Souza, “Depois da Chuva”, de Cláudio Marques e Marília Hughes, “Exilados do Vulcão”, de Paula Gaitán, “O Homem das Multidões”, de Cao Guimarães e Marcelo Gomes, “Jogo das Decapitações”, de Sérgio Bianchi, “O Lobo Atrás da Porta”, de Fernando Coimbra, “Quase Samba”, de Ricardo Targino, e “Riocorrente”, de Paulo Sacramento.

Outros filmes, se não estrearem, devem ao menos começar a fazer o circuito de festivais, como “Quando Eu Era Vivo”, de Marco Dutra, “Hoje Eu Quero Voltar Sozinho”, de Daniel Ribeiro, “Acorda Brasil”, de Sérgio Machado, “Praia do Futuro”, Karin Aïnouz, “Deserto Azul”, de Eder Santos, “Obra”, de Gregório Graziosi, “O Outro Lado do Paraíso”, de André Ristum, e “Brincante”, de Walter Carvalho. Agora, é esperar por 2014.

“Acorda Brasil”, de Sérgio Machado, retoma a parceria com Lázaro Ramos em um filme sobre superação social

 

Por Gabriel Carneiro

3 thoughts on “As surpresas e os fracassos

  • 31 de dezembro de 2013 em 12:02
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    Animações bem feitas não têm que ser caras. O que falta ao Brasil são bons roteiros. O caso do insosso “Uma História de Amor e Fúria” é típico da falta de uma boa idéia e principalmente de um bom roteiro. Um bom roteiro transforma idéias fracas em algo excelente.

    E esse desenho animado é péssimo com seu comunismo bocó e com seu ecochatismo manezão.

    Enquanto priorizarem desenhar e filmar ideologias babacas em detrimento de contar uma boa história a animação do Brasil será o nicho dos comunistinhas rançosos.

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  • 7 de fevereiro de 2014 em 17:43
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    Uma correção: “Até que a Sbórnia nos Separe” é uma animação adulta. Não é porque é animação que é voltado para o público infantil, e o mesmo vale para “Uma história de amor e fúria”. Acho uma pena essa opinião de que a animação não vai decolar no Brasil, e discordo veementemente. O gênero vem crescendo cada vez mais, e o próprio menino e o mundo tem feito um relativo sucesso visto que fez uma estréia modesta em poucas salas, além de estar ganhando em todos os festivais que participa (No Canadá, em Cuba, no Brasil, etc),. Essa animação do Alê Abreu também está com previsão de estréia nos EUA e França, sendo vista com muito bons olhos pela crítica internacional.

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  • 8 de abril de 2014 em 23:40
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    Produções bem feitas não têm que ser caras. O que falta ao Brasil são bons roteiros.

    E elas andam péssimas com seus neoliberalismo e ditaduras bocó e com seu ecochatismo manezão.

    Enquanto priorizarem desenhar e filmar ideologias babacas em detrimento de contar uma boa história a animação do Brasil será o nicho dos neoliberais e ditadores rançosos.

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