Festival de Brasília premia “Temporada”, de André Novais Oliveira

Por Maria do Rosário Caetano, de Brasília (DF)

Minas Gerais conquistou, pela terceira vez consecutiva, o troféu Candango de melhor longa-metragem no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. Este ano, o vencedor foi “Temporada”, de André Novais Oliveira, ano passado, “Arábia”, de Afonso Uchôa e João Dumans. Em 2016, “A Cidade onde Envelheço”, de Marília Rocha.

“Temporada” levou cinco troféus Candango, incluindo o de melhor atriz, para Grace Passô, e ator coadjuvante para Russão APR. Mas os diversos júris do festival tomaram rumos bem diferentes. O público preferiu “Bixa Travesty”, de Cláudia Priscila e Kiko Goifman, protagonizado pela dupla transexual “preta e perifética” Linn da Quebrada e Jup do Bairro. Já a Crítica (Prêmio Abraccine), preferiu “Los Silencios”, de Beatriz Seigner, reconhecida pelo júri oficial como a melhor diretora.

O documentário “Torre das Donzelas”, junto com “Bixa Travesty”, o filme mais aplaudido do festival, ganhou Prêmio Especial do Júri. “Ilha”, segundo longa-metragem da dupla baiana Ary Rosa e Glenda Nicásio, viu um de seus protagonistas, o ator Aldri Anunciação, sagrar-se com melhor ator. Vieram, portanto, do teatro, os dois grandes intérpretes do festival: Grace Passô e Aldri. Curioso notar que ambos são também dramaturgos e dedicados à reflexão sobre o papel de corpos e peles negras em nossa história social. Passô é autora, entre outros textos, de “Preto”, e Aldri, de “Namíbia, Não!”.

Em “Temporada”, segundo longa-metragem de Novais Oliveira (o primeiro foi “Ela Volta na Quinta”), a atriz interpreta agente sanitária que vem do interior para atuar no combate à dengue, num município da Grande BH. Enquanto aguarda a chegada do marido, ela trabalha em equipe e vê sua vida passar por significativas transformações.

Já Aldri Anunciação interpreta cineasta sequestrado por jovem da periferia, que vive em modesta ilha. Este jovem obriga o sequestrado a construir narrativa que dê conta de sua vida (a do jovem ilhéu).

Os prêmios de coadjuvantes ficaram com Luciana Paes, atriz que brilhara nos longas “Sinfonia da Necrópole” e “O Animal Cordial”, e com o gordo Russão APR, uma força da natureza, dono de irresistível senso de humor.

No terreno do curta-metragem, os filmes mais premiados foram “Mesmo com tanta Agonia”, de Alice Andrade Drummond, de São Paulo, e “Guaxuma”, animação da pernambucana Nara Normande. Mas o melhor filme foi “Conte Isso àqueles que Dizem que Fomos Derrotados”, dirigido por quatro cineastas (Camila Bastos, Aiano Bemfica, Cristiano Araujo e Pedro Maia de Brito), vibrante narrativa em busca de visibilidade para o MBL (Movimento de Luta por Moradia). Este movimento, de grande força nas periferias de BH, luta para que milhares de brasileiros sem-teto conquistem suas casas.

Outro título de curta duração que alcançou significativo reconhecimento foi o carioca (realizado no Morro do Salgueiro) “Eu, minha Mãe e Wallace”, dos irmãos Eduardo e Marcos Carvalho. O filme foi o preferido do público e do júri, formado com cinco mulheres, que atribuiu o Prêmio Zózimo Bulbul. Esta nova láurea, fruto de parceria da APAN (Associação dos Profissionais Negros) com o festival brasiliense, busca a valorização de realizadores afro-brasileiros e subjetividades negras.

Na Mostra Brasília, que distribuiu os troféus Câmara Legislativa do DF, o maior número de prêmios foi conquistado pelo ótimo documentário “O Outro Lado da Memória”, sexto longa-metragem do baiano-brasiliense André Luiz Oliveira. Além de conquistar o Júri Popular e fazer jus ao Troféu Petrobras no valor R$100 mil (que devem ser gastos em sua distribuição comercial), o filme acumulou mais três prêmios do júri oficial (direção, trilha sonora e direção de arte) e dois especiais (Troféu Marco Antônio Guimarães e o Cine Memória de melhor documentário). Mas o vencedor do prêmio de melhor filme foi a ficção “New Life”, de André Carvalheira. Que rendeu, ainda, o prêmio de melhor ator a Murilo Grossi.

No terreno do curta brasiliense, o grande vencedor foi “Entre Parentes”, narrativa documental sobre a luta dos povos indígenas por suas terras, tomadas pelos fazendeiros do agronegócio. O filme teve reconhecida também sua bela fotografia em preto-e-branco, de autoria de Alan Schvarsberg. Em seu momento de maior intensidade, “Entre Parentes” mostra um grupo de indígenas conduzindo caixões negros com grandes cruzes ao espelho d’água que circunda o Palácio do Congresso Nacional. A polícia chega com cassetetes e balas de borracha para desocupar o lago. Enquanto os manifestantes corriam para livrar-se da força militar, o diretor de fotografia seguia em sua tentativa de documentar tudo o que se passava. “Um bala de borracha alojou-se no meu corpo”, contou Schvarsberg, com seu troféu e um microfone na mão. Mesmo assim, ele conseguiu documentar a barbárie, enquanto teve forças. Outro filme de temática indígena — “Terras Brasileiras”, de Dulce Queiroz — conquistou o Júri Popular.

Confira os vencedores:

Longa-metragem (Troféu Candango)

“Temporada”(MG) – melhor filme, atriz (Grace Passô), ator coadjuvante (Russão APR), fotografia (Wilssa Esser), direção de arte (Diogo Haiashi)

“Los Silencios”(Brasil-Colômbia) – direção (Beatriz Seigner), Prêmio da Crítica (Abraccine)

“Torre das Donzelas” (RJ) – Prêmio Especial do Júri

“À Sombra do Pai” (SP) – atriz coadjuvante (Luciana Paes), montagem (Karen Akerman), som (Daniel Turini, Fernando Henna e Sérgio Abdalla)

“Ilha” (Bahia) – ator (Aldri Anunciação), roteiro (Ary Rosa) e Prêmio Zózimo Bulbul

“Bixa Travesty”(SP) – Júri Popular – Prêmio Petrobras (R$200 mil), trilha sonora (Linn da Quebrada e Jup do Bairro), Prêmio Saruê-Correio Braziliense para Lynn da Quebrada e Jup do Bairro

Curta-Metragem (Troféu Candango)

“Conte Isso àqueles que Dizem que Fomos Derrotados” (MG-PE) – melhor filme, melhor som (Nicolau Domingues)

“Mesmo com Tanta Agonia” (SP) – Prêmio da Crítica (Abraccine), melhor atriz (Maria Leite), Prêmio Canal Brasil, melhor fotografia (Anna Santos)

“Eu, minha Mãe e Wallace”(RJ) – Juri Popular, atriz coadjuvante (Noêmia Oliveira), Prêmio Zózimo Bulbul

“Reforma”(PE) – melhor ator (Fábio Leal), roteiro (Fábio Leal)

“Guaxuma”(PE) – melhor direção (Nara Normande), direção de arte (Nara Normande), trilha sonora (para o canadense Normand Roger)

“Plano Controle”(MG) – melhor ator coadjuvante (Uirá dos Reis), montagem (Gabriel Martins e Luísa Lana)

“Liberdade”(SP) – Prêmio Especial do Júri

MOSTRA BRASILIA – Prêmio Câmara Distrital 

Longa-metragem:

“New Life”- melhor filme, melhor ator (Murilo Grossi)

“O Outro Lado da Memória” – melhor direção (André Luiz Oliveira), Juri Popular-Prêmio Petrobras (R$100 mil), direção de arte (Moacyr Gramacho), trilha sonora (Vinícius Jibhajan), Prêmio Marco Antônio Guimarães do Centro de Pesquisadores do Cinema Brasileiro (uso de arquivos cinematográficos), Prêmio Conterrâneos-CineMemória de melhor documentário

Curta-metragem:

“Entre Parentes”: melhor filme, Prêmio Aquisição Prime Box Brasil, melhor fotografia (Alan Schvarsberg)

“Terras Brasileiras” – Prêmio Juri Popular

“Presos que Menstruam”: melhor elenco feminino (para o coletivo liderado pela atriz Naiara Lira e preparado por Catarina Accioly)

“A Praga do Cinema Brasileiro”: melhor montagem (Zefel Coff)

“Para minha Gata Mieze”: melhor roteiro (Wesley Gondin)

“Riscados pela Memória”: edição de som (Olívia Hernandez)

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