Mostra SP traz o melhor do cinema mundial e Brasil tem representação recorde

A 42ª edição da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, que acontece de 17 a 31 deste mês de outubro, em mais de 30 salas, beneficiou-se da crise que empurrou o Festival do Rio para o mês de novembro. Manteve a exigência do ineditismo e será vitrine para mais de 300 filmes, 70 deles brasileiros e quase 30 hispano-americanos.

A capital paulista, com extensão simultânea em Campinas, assistirá a poderosa seleção dos melhores filmes do mundo, liderada pela trinca “Roma”, do mexicano Alfonso Cuarón, “Assunto de Família”, do japonês Hirozaku Kore-Eda, e “Não me Toque”, da romena Adina Pintilie. Os três venceram os mais importantes festivais planetários (Veneza, Cannes e Berlim, respectivamente), que só aceitam filmes 100% inéditos.

O festival paulistano exibirá, ainda, os novos filmes de Jean-Luc Godard (“Imagem e Palavra”), Lars Von Trier (“A Casa que Jack Construiu”), Spike Lee (“Infiltrado na Klan”), Nuri Bilge Ceylan (“A Árvore dos Frutos Selvagens”), Margarethe von Trotta (“Procurando por Ingmar Bergman”), Olivier Assayas (“Doubles Vies”), Jia Zhang-Ke (“Amor até às Cinzas”), Corneliu Porumboiu (“Futebol Infinito”), Carlos Reygadas (“Nuestro Tiempo”), Pablo Trapero (“La Quietud”), entre muitos e muitos outros, oriundos de 56 países dos cinco continentes.

A diretora do festival, Renata de Almeida, não quer alimentar rivalidades com o Festival do Rio. Em encontro com a imprensa, para divulgar a imensa programação da Mostra SP 2018, ela fez questão de enfatizar o vigor da programação e os parceiros, que apoiam o evento, mesmo em tempo de crise econômica e política. Fez questão de ponderar que, em encontro com Vilma Barbosa, uma das diretoras do festival carioca, lembrou a ela a necessidade de insistir e realizar o evento, custasse o que custasse.

O que fica claro, para quem examinar a imensa e variada programação do festival paulistano, é que a cidade será a primeira vitrine de centenas de filmes estrangeiros e brasileiros. Quando o adiamento do Festival do Rio foi anunciado, uma questão se colocou: os realizadores e produtores brasileiros deixariam de exibir seus filmes na Mostra SP para mantê-los inéditos em competições cariocas como a Première Brasil, a Novos Rumos e Cinema Documental?

A resposta é categórica: não. Praticamente, todos os filmes que serão exibidos no Rio (em mostras competitivas, hors concours ou informativas) passarão primeiro pelas telas paulistanas. Caso de “Deslembro”, de Flávia Castro, “Rasga Coração”, de Jorge Furtado, “O Olho e a Faca”, de Paulo Sacramento, “Sequestro Relâmpago”, de Tata Amaral, entre muitos outros.

Renata de Almeida até admitiu, embora sutilmente, que desta vez o Brasil pode conquistar espaço entre os finalistas da “Competição Novos Diretores”. Anos atrás, o encantador “Cinema, Aspirinas e Urubus”, de Marcelo Gomes, venceu a disputa, derrotando candidatos de diversos países. Depois, a presença brasileira (a mostra só aceita filmes que não participaram de outras competições nacionais e sejam o primeiro ou segundo longa do realizador) passou a contar com pouquíssimos (e na maioria frágeis) representantes.

Este ano, dez filmes brasileiros tentarão passar, primeiro, pelo crivo do público (que escolhe os melhores) e, depois, pelo júri (formado com a lusitana Tereza Villaverde, a francesa Astrid Adverbe, o brasileiro Sérgio Machado, o turco Ferzan Oztetek e o argentino Edgard Tenembaum). São eles: “Humberto Mauro”, de André di Mauro, “Azougue Nazaré”, de Tiago Melo, “Cravos”, de Marco del Fiol, “Filme Ensaio”, de Maria Flor, “Meio Irmão”, de Eliane Coster, “O Samba é meu Dom”, de Cristiano Abud, “Sócrates”, de Alex Moratto, “Um Dia para Susana”, de Giovanna Giovanini e Rodrigo Boecker, “Gilda Brasileiro – Contra o Esquecimento”, de Viola Scheurerer e Roberto Reis (coprodução com a Suíça e Alemanha), e “Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos”, de Renée Nader Messora e João Salaviza (coprodução com Portugal).

Entre os filmes brasileiros espalhados por outras mostras, há que se destacar “Rio da Dúvida”, de Joel Pizzini (sobre saga amazônica que uniu Rondon e Roosevelt), “As Quatro Irmãs”, de Evaldo Mocarzel, sobre as manas Holtz, incluindo a atriz Vera, nascidas na interiorana Tatuí (os dois, 100% inéditos), a animação laertiana “A Cidade dos Piratas”, de Otto Guerra, “Bando, um Filme De:”, sobre o Bando de Teatro Olodum, comandado por Lázaro Ramos e Thiago Gomes, “Temporada”, de André Novais Oliveira, “Torre das Donzelas”, de Susanna Lira, “Domingo”, de Clara Linhart e Fellipe Barbosa, e “Mormaço”, de Marina Meliande (lembrando que há 80 filmes internacionais e nacionais com nomes femininos na direção).

Seguindo o diálogo do documentário brasileiro com nossa música popular, vale buscar sessões de “Clementina”, sobre a sambista-jongueira, de Ana Riper, “Com a Palavra, Arnaldo Antunes”, sobre o cantor, compositor e poeta paulistano, de Marcelo Machado, e “Inezita”, de Hélio Golsztejn, sobre a cantora telúrica que por anos apresentou o programa “Viola, minha Viola”.

A Mostra SP será aberta, para convidados, no Auditório do Ibirapuera, com o longa “A Favorita”, do grego Yorgos Lanthimos, falado em inglês. O filme participou do Festival de Veneza, no qual recebeu os prêmios Especial do Júri e a Copa Volpi de melhor atriz, para a britânica Olivia Colman. No encerramento, “Roma”, para muitos o melhor filme do mexicano Alfonso Cuarón, com carreira desenvolvida nos EUA (onde realizou “A Princesinha”, “Grande Esperanças” e o oscarizado “Gravidade”). O novíssimo “Roma”, que carrega o nome do bairro azteca onde o cineasta nasceu, marca sua volta a temas de sua origem e à língua materna, base de seu delicioso “E tua Mãe Também”, que revelou Gael García Bernal e Diego Luna.

Entre o filme de Lanthimos e o de Cuarón, acontecerão sessões de mais mais de 200 filmes estrangeiros, a maioria realizada nos últimos 18 meses, e alguns, em décadas passadas, pois a Mostra nunca descuidou-se de seu Núcleo Histórico. Este ano, a joia da coroa será a exibição, ao ar livre, no Parque do Ibirapuera, de “A Caixa de Pandora”, filme mudo do austríaco-alemão Georg Wilhem Pabst (1885-1967), realizado há 90 anos. A sessão terá acompanhamento ao vivo da Orquestra Jazz Sinfônica de São Paulo.

No terreno das homenagens, a Mostra SP vai entregar o Troféu Humanidades a um representante do japonês Kore-Eda, Palma de Ouro em Cannes e realizador de filmes de acentuada beleza, profundidade e valores humanistas, e ao médico e escritor Dráuzio Varella, que tem fornecido, ao cinema e à TV, histórias de densa carga social (“Carandiru”, de Hector Babenco, “Carcereiros”, de José Eduardo Belmonte e Aly Muritiba).

O Prêmio Leon Cakoff caberá ao realizador iraniano Jafar Panahi, de quem o público assistirá ao mais novo filme, “3 Faces”. Panahi, que já esteve em São Paulo outras vezes, também não estará presente, pois encontra-se em prisão domiciliar em Teerã.

Em tempos de intolerância política, Renata de Almeida destacou, na coletiva, mostra de filmes que homenagearão o bicentenário do filósofo alemão, Karl Marx. Fez, porém, questão de lembrar que “Marx 200 Anos – Um Olhar Através do Cinema” chegou ao festival paulistano como contribuição do Instituto Goethe, para promover o debate de ideias, jamais o proselitismo político. E acrescentou: “tanto que exibiremos o filme ‘Almas Mortas’, do chinês Wang Bin (produção suíço-francesa), que mostra visão extremamente crítica da experiência socialista” em seu país de origem.

A participação da América Latina na Mostra é das mais significativas. Tem sido assim há muitos anos. Neste, além do lugar nobre que coube ao mexicano “Roma”, o festival vai festejar Fernando Solanas, cineasta e senador argentino, de 83 anos (marido da atriz black brasileira Ângela Corrêa), comemorando os 50 anos do monumental “La Hora de los Hornos” (1968) e lançando “Viaje a los Pueblos Fumigados” (referentes ao fumigamento de lavouras com perigosos produtos químicos). E vai exibir mais duas dezenas filmes de origem hispano-americana, entre eles o argentino “El Angel”, de Luis Ortega, que além de estar bombando nas bilheterias, foi o indicado portenho ao Oscar de melhor filme estrangeiro.

E, por falar em Oscar, a Mostra SP vai exibir, este ano, 18 filmes dos pré-indicados à estatueta estrangeira. Além de “El Angel” e do brasileiro “O Grande Circo Místico”, de Cacá Diegues, serão apresentados o libanês “Cafarnaum”, o egípcio “Yomedine”, o macedônio “O Ingrediente Secreto”, o português “Peregrinação”, o islandês “Uma Mulher em Guerra”, o o sul-coreano “Em Chamas”, o eslovaco “O Intérprete”, o romeno “Eu Não me Importo se Entrarmos na História como Bárbaros” (que título arregimentador!), o dinamarquês “A Culpa”, o polonês “Guerra Fria”, o austríaco “A Valsa de Waldheim”, o tailandês “Malina: A Flor do Adeus”, o cambojano “Túmulos sem Nome”, o luxemburguense “Gutland”, o japonês “Assunto de Família”, e o turco “A Árvore dos Frutos Selvagens”.

 

Por Maria do Rosário Caetano

One thought on “Mostra SP traz o melhor do cinema mundial e Brasil tem representação recorde

  • 12 de outubro de 2018 em 10:04
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    Beleza Maria do Rosário,

    nos vemos na mostra.
    Por favor inclua-me em sua lista

    abraço
    Marcelo

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