Suíça dá adeus ao diretor de “Jonas que Terá 25 Anos no Ano 2000”, “cult” setentista
Por Maria do Rosário Caetano
A morte do cineasta suíço Alain Tanner, aos 92 anos, em seu país natal, pode não dizer muito às novas gerações. Mas quem tinha quinze anos (ou mais), em 1975, quando ele realizou “Jonas que Terá 25 Anos no Ano 2000”, está de luto. O filme tornou-se um “cult” no Brasil e mostrou que a Suíça não era apenas a pátria de queijos furados e saborosos, de relógios de alta precisão e, como saberíamos mais tarde, de sistema financeiro “muito especial”. Lá havia um cinema pulsante, do qual Tanner e Claude Goretta eram os nomes mais importantes.
E, afinal, do que falava “Jonas”, filme que levaria Leon Cakoff, diretor da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e sua companheira Renata Almeida a darem ao filho (o hoje cineasta Jonas Chadaverian) o mesmo nome?
O cult movie evocava as manifestações revolucionárias de 1968. Os sonhos (e frustrações) delas resultantes. Um grupo de pessoas, oito no total, todos entre 20 e 30 anos, acreditava que, finalmente, o idealismo dos protestos de sua geração teria materialidade. Encontraria alternativas ao sistema capitalista, que “afundava em suas contradições” (ah, os deliciosos jargões da época!). Entre os oito moradores daquela colorida comunidade suíça, com algo de hippie, nascerá um bebê, que fará 25 anos no ano 2000. Ele se chamará Jonas.
O filme chegaria aos cinemas (ou aos cineclubes?) brasileiros algum tempo depois. E se transformaria numa febre. Um verdadeiro cult movie. Seria debatido, reprisado e motivaria a Embaixada Suíça no Brasil a promover mostras retrospectivas de Tanner, Goretta e outros realizadores que renovavam a produção helvética.
A obra tanneriana chegou com a força de “Charles Morto ou Vivo” (1969), vencedor do Leopardo de Ouro em Locarno, “A Salamandra” (71), “Amantes no Meio do Mundo” (74), “Messidor” (78), “A Anos Luz” (81), premiado em Cannes.
A partir do sucesso de “Jonas”, que colocou Tanner no mapa do cinema mundial, a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo passou a programar obras do realizador com significativa frequência. Em 1982, exibiu “Na Cidade Branca”, filmado em Lisboa, e em 1999, “Jonas e Lila, Até Amanhã”, sequência de “Jonas que Terá 25 Anos no Ano 2000”, mas o sucesso não se aproximou em nada do fulgor de sua matriz. Em 2017, a mostra paulistana promoveu retrospectiva de Tanner e lhe outorgou o Prêmio Leon Cakoff, por sua respeitável e longeva trajetória no audiovisual.
Alain Tanner formou-se, ao lado de Goretta, no BFI (British Film Institute), em Londres, trabalhou na França (recebeu um César por “Na Cidade Branca”), atuou no Groupe Cinque, associação de jovens e politizados realizadores suíços, influenciados por ideias de Bertoldt Brecht (em especial o distanciamento crítico).
O cineasta deixa legado de mais de 50 filmes, entre curtas-metragens, longas ficcionais e documentários, muitos destes feitos para a TV. Dirigiu grandes atores suíços (Bruno Ganz), franceses, entre eles Miou-Miou e Myriam Mézières (em “Jonas”), Jean-Louis Trintgnant (“O Vale Fantasma”) e italianos (Laura Antonelli, também em “O Vale Fantasma”).
O último trabalho significativo de Tanner foi a série de TV “La Faute à Rousseau” (A Culpa é de Rousseau), composta com 55 filmes curtos dedicados aos 300 anos do nascimento do filósofo francês Jean-Jacques Rousseau (1712-1778). Foi ao ar em 2012. Portanto, há dez anos.