“O Tesouro do Pequeno Nicolau” chega aos cinemas para encantar crianças e adultos

Por Maria do Rosário Caetano

“O Pequeno Nicolau”, criação da dupla René Goscinny e Jean-Jacques Sempé, regressa às telas brasileiras depois de hiato de oito anos. O primeiro encontro do público com a meninada orgulhosamente unida na Bande des Vengeurs (literalmente Bando dos Vingadores, com escudo e tudo) estreou por aqui em 2009, com “O Pequeno Nicolau”, de Laurent Tirard.

As aventuras prosseguiram, em 2014, com “As Férias do Pequeno Nicolau”, também dirigida por Tirard. Agora chegou a vez de “O Tesouro do Pequeno Nicolau”, que estreia nos cinemas nessa quinta-feira, 22 de dezembro, sob o comando de outro realizador, Julien Rappeneau (“Meu Filho é um Craque”). Se no primeiro conhecemos Nicolau e sua trupe “vingadora”, no segundo o acompanhamos em viagem de férias praieiras.

O público contemporâneo poderá estranhar, no “Tesouro”, a ausência de celulares, correrias, sofreguidão, super-heróis e, principalmente, de crianças morenas ou negras, árabes ou africanas. O Bando dos Vingadores é formado só de crianças brancas.

O filme situa-se antes do processo de globalização, que vem mudando o perfil da Europa. Quem assistiu ao eletrizante jogo Argentina x França na final da Copa do Qatar, reparou que, na etapa final, só havia um branco (o goleiro) no selecionado francês. Todos os grandes companheiros do poderoso Kylian Mbappé eram negros. Para desespero da extrema-direita aglutinada no Front National.

“O Tesouro do Pequeno Nicolau” é um filme encantador. E ficará melhor ainda quando os “Vingadores” contarem com integrantes oriundos de famílias de imigrantes magrebianos e de outras partes da África.

A trama se desenvolve em tempos já idos (vide os carros, casas e utensílios domésticos). Seus protagonistas infantis (os personagens criados por Goscinny e Sempé em 1959) são vistos em suas brincadeiras cotidianas, jogos de futebol, na escola e nas relações com familiares e vizinhos. Até que o mundo amoroso e tranquilo do garoto sofre um abalo.

Seu pai, empregado em burocrático escritório (povoado por personagens que parecem saídos de um filme de Jacques Tati) chega em casa com uma novidade. Seu patrão comprou firma em outra cidade, no sul da França, e caberá a ele, o feliz papai de Nicolau, promovido, gerenciá-la.

A mamãe, orgulhosa da promoção do marido, aceita bem a novidade, mas o menino sofre imenso abalo. Terá que deixar sua residência, tão amada, sua escola e, o que mais o apavora, La Bande des Vengeurs (no Brasil, rebatizados Os Invencíveis) para trás.

Como viver sem seus amigos tão queridos? Sem Alceste, o comilão; Rufus, o filho do policial, louco por apito; Clotaire, o último da classe em termos de sapiência; Eudes, o líder dos “Invencíveis” e capitão do time de futebol; Geoffrey, o filhinho de papai, muito arrumadinho, pois tem pais muito ricos; Joachim, o mais sonhador e inventivo da trupe; Agnan, o “chouchou de la maîtraisse” (o queridinho da professora), pois o mais inteligente; Maixent, o de pernas compridas e ótimo corredor. E sem Marie-Edwige, a linda vizinha.

O filme vai girar em torno desse impasse: Nicolau perderá seus amigos? Ou os “invencíveis” o ajudarão a superar tal transtorno?

A querida mamãe (Audrey Lamy) e o papai (Jean-Paul Pouve) garantem que, chegando ao novo lar, no sul da França, ele fará novos amigos. Reconstruirá seu mundo, que ele vê como prestes a despedaçar. Com ajuda dos amigos inseparáveis, Nicolau embarcará em cativante jornada. Buscará um tesouro, o único capaz de evitar seu maior medo – mudar de cidade e romper laços de amizade tão profundos.

Como seguir em frente sem seus amigos?

Com ajuda deles, Nicolau buscará tesouro (nada a ver com moedas de ouro escondidas em navio naufragado) capaz de evitar seu maior medo – a mudança para cidade distante dos “Invencíveis”.

E como é do agrado dos franceses, até em filme infanto-juvenil (ou para “toda a família”), o filósofo Soren Kierkegaard entrará com citação que imprimirá charme especial à narrativa.

Quem cresceu lendo as histórias de Sempé e Goscinny (este formou com Uderzo a poderosa dupla de criadores de “Asterix e Obelix”), não se lembrará da trama de “O Tesouro do Pequeno Nicolau” por razão muito simples: o roteiro do filme é 100% original.

Ao engendrar a narrativa, o diretor Julien Rappeneau apostou em historia inédita. Mas respeitou as características originais dos personagens de Goscinny-Sempé. E os atores mirins, claro, são novinhos, novinhos. Não poderiam ser os de 2014, menos ainda os de 2009. Até porque os moleques espicham e mudam a voz de um ano para o outro. Mas os novos “Invencíveis” nos parecem os de outrora, redivivos.

No elenco de apoio, três nomes de peso do cinema francês – Pierre Arditi, como empresário-patrão de Moucheboume, louco por tênis; Noémie Lvovsky, como Madame Bouillaget, uma das professoras da escola onde estudam os “Invencíveis”, e o encantador Jean-Pierre Darroussin, de tantos filmes de Robert Guédiguian, na pele do divertido diretor do educandário.

Personagem feminina fundamental na narrativa é La Maîtraisse (Adeline d’Hermy, a professora da molecada), jovem, entusiasmada e compreensiva com seus alunos. Com queda especial, claro, por Agnan, que tem respostas para tudo, estudioso que é. Por isso, ele goza da condição de “chouchou de la maîtraisse”.

 

O Tesouro do Pequeno Nicolau
França, 2022, 103 minutos
Direção: Julien Rappeneau
Roteiro: Julien Rappeneau e Mathias Gavarry
Elenco: Ilan Debrabant, Jean-Paul Rouve, Audrey Lamy, Pierre Arditi, Jean-Pierre Darroussin, Noémie Lvovsky, Anton Alluin, Oscar Boissière, Léandre Castellano-Lemoine, Malo Chanson-Demange, Simon Faliu, Malick Laugier, Léonard Signoret,
Fotografia: Vincent Mathias
Trilha Sonora: Martin Rappeneau
Distribuição: Califórnia Filmes

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