Olhar de Cinema premia “Neirud”, a Mulher Gorila, e dois filmes colombianos

Foto: “Neirud”, de Fernanda Faya

Por Maria do Rosário Caetano, de Curitiba

O júri do Olhar de Cinema, o Festival Internacional de Curitiba, que reuniu os atores Fabrício Boliveira e Guilherme Weber a nomes internacionais, brilhou em suas escolhas. “Neirud”, o documentário de Fernanda Faya, foi realmente o que de melhor apresentou a recém-criada competição brasileira. E “Anhell69”, do colombiano Theo Montoya, sobre o a desesperançada juventude queer de Medellin, é realmente um filme inquieto e formidável.

Outro júri, o da competição Novos Olhares (destinada a produções que apostam na radicalidade estética), também foi certeiro. Reconheceu mais uma produção surpreendente vinda da Colômbia, o engenhoso “Mudos Testigos” (Mudos Testemunhos), concebido e roteirizado pelo inquieto e saudoso Luís Ospina (1949-2019) e desenvolvido e finalizado por Jerónimo Atehortúa. A Colômbia vem fazendo um cinema pulsante, plugado em seu tempo histórico, seja a partir de Cáli (e sua Caliwood), seja de Bogotá ou de Medellin.

“Neirud” abriu a competição brasileira e causou sensação com a história de mulher negra gaúcha, que fugiu com gente de circo, e fez de seu 1m90 e de sua força descomunal instrumentos de trabalho. Seja montando circos com dois imensos martelos manipulados ao mesmo tempo, seja como a Mulher Gorila, estrela de ringues de luta livre. Mais não se pode dizer desse filme, pois vê-lo é entrar numa espiral de revelações. A brilhante montagem de Yuri Amaral, por pleno merecimento, foi reconhecida. Ele estabeleceu notável parceria com Fernanda Faya, por longos anos. Ela, realizadora e professora paulistana, vive entre São Paulo e Nova York.

“Anhell69” fechou a competição estrangeira e também causou furor. E com toda razão. Seu “defunto-autor”, o jovem Montoya, em seu longa de estreia, mergulha nas pequenas vidas de jovens queer de Medellin, a metrópole que abrigou o mais famoso e violento dos narcotraficantes, Pablo Escobar.

O filme, sintético, lisérgico e desesperançado como seus personagens, caminha rumo à morte e a um grande cemitério. Mas tem pelo menos uma crença à qual se agarrar: a realização cinematográfica. Seja a colombiana, presentificada em imagens do mais famoso filme de Victor Gavíria (“A Vendedora de Rosas”), seja no mundo fantasmagórico do asiático Apichatpong Weerasethakul. Diálogos fertilizadores.

Cena do filme colombiano “Anhell69”, de Theo Montoya

“Mudos Testemunhos” é um tributo ao cinema da era muda colombiana, que lhe serviu de semente, e a Nossa Senhora do Contexto, a santa padroeira de Luís Fernando Veríssimo. Ospina (ausência muito presente) e Atehortúa constroem um melodrama, realmente com muito drama e música tonitruante e onipresente, como a que costumava acompanhar os filmes mudos. E o insere em riquíssimo contexto histórico-político, evocando a perda do Canal do Panamá pela indignada nação sul-americana, pátria assombrosa de Gabriel García Márquez, guerras e mais guerras, aventuras na selva e em locais inóspitos, sem esquecer que foi em solo colombiano, que um acidente aéreo ceifou a vida ‘tanguera’ de Carlos Gardel, então um astro planetário.

Que estes três filmes tenham longa vida em nosso circuito exibidor e em nossas Cinematecas.

Confira os vencedores:

Competitiva Brasileira (Longa)

. “Neirud”, de Fernanda Faya (SP): melhor filme, melhor montagem (Yuri Amaral)

. “Toda Noite Estarei Lá”, de Suellen Vasconcelos e Tati Franklin (ES): melhor direção, melhor atuação (Mel Rosário)

. “Quando eu me Encontrar”, de Amanda Pontes e Michelline Helena (CE): melhor roteiro, Prêmio Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema)

. “Zé”, de Rafael Conde (MG): melhor direção de arte (Oswaldo Lioi)

. “O Estranho”, de Flora Dias e Juruna Mallon: melhor fotografia (Camila Freitas), melhor som (Gustavo Nascimento, Léo Bortolin e Vitor Moraes)

Competitiva Brasileira (Curta)

. “Ramal”, de Higor Gomes: melhor filme do Júri oficial e Prêmio Abraccine (Crítica)

. “Cemitério Verde”, de Maurício Chades: Prêmio Especial do Júri

Competitiva Internacional

. “Anhell69” (Anjo69), de Theo Montoya (Colômbia): melhor filme do Júri oficial, Prêmio do Público

. “Lugar Seguro”, de Juraj Letotić (Croácia): Prêmio Especial do Júri

“Fuga de Visão, de Peng Zuqiang: melhor curta júri oficial

. “Uma Espécie de Testamento”, de Vuillemin Stephen: melhor curta pelo Júri Popular

Mostra Novos Olhares

. “Mudos Testigos” (Mudos Testemunhos), de Jerónimo Atehortúa e Luis Ospina (Colômbia)

Prêmio AVEC-PR Solange Stecz (para filmes da Mirada Paranaense)

. “Midríase”, de Eduardo Monteiro: melhor filme

. “A Trilha Sonora de um Bairro”, de Betinho Celanex, Danilo Custódio: menção honrosa

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