O novo incentivo para cinema independente do Reino Unido pode ser replicado na América Latina?

Por Steve Solot

O que é o IFTC do Reino Unido?

No dia 6 de março, o chanceler britânico Jeremy Hunt anunciou o novo e muito aguardado apoio para o cinema independente do Reino Unido, denominado IFTC (“Independent Film Tax Credit”), “Crédito Fiscal para Filmes Independentes”, em português.

De acordo com o IFTC, os filmes elegíveis poderão se aproveitar de um crédito a uma taxa de 53%, sobre suas despesas qualificadas, o que equivale a um incentivo de 40%, mas que, na realidade, é de 32,5% após a dedução do imposto para pessoas jurídicas.

O cinema independente, seja no Reino Unido ou nos países latino-americanos, é um segmento da indústria que se caracteriza pela produção de filmes que não estão ligados aos grandes estúdios, redes de TV, ou aos sistemas tradicionais de financiamento, distribuição e exibição. Esse tipo de cinema muitas vezes é feito com orçamentos reduzidos e envolve mais liberdade criativa, já que os realizadores não estão necessariamente presos às exigências comerciais ou estéticas das grandes distribuidoras ou patrocinadores. O cinema independente latino-americano, por exemplo, desempenha um papel crucial na representação da diversidade cultural e social de seus países, oferecendo novas perspectivas e reflexões sobre a realidade da região, além de ser um espaço para o surgimento de novos talentos e experimentações artísticas.

Por que um incentivo específico para filmes independentes?

Um novo relatório do British Film Institute-BFI indica que o boom geral no audiovisual do Reino Unido teve um impacto negativo no setor independente, que não conseguiu competir com produções nacionais e internacionais de maior orçamento, devido ao aumento nos custos de produção, sem poder garantir elenco e equipe e, em última análise, alcançar o público. Depois de cair 31% em 2022, os gastos com a produção audiovisual independente no Reino Unido em 2023 caíram mais 11%.

Agora, o novo IFTC pretende reverter esta tendência. Para serem elegíveis para o incentivo, os filmes devem ter orçamentos de até 15 milhões de libras (excluindo marketing e distribuição), um nível compatível com a maioria dos longas independentes.

De acordo com o BFI, os filmes elegíveis também precisarão atender a pelo menos uma das seguintes condições: ter um(a) roteirista britânico(a); um(a) diretor(a) britânico(a); ou ser certificado como coprodução oficial do Reino Unido, bem como já atender às condições do incentivo anterior: certificado como culturalmente britânico pelo BFI; produzido por uma empresa do Reino Unido; e pelo menos 10% das despesas básicas devem ser gastas no Reino Unido.

Além disso, o IFTC não estará disponível para programas de televisão. Para que um filme se qualifique para o incentivo, ele precisa ter lançamento nas salas de cinemas.

O novo incentivo já tem efeito positivo na indústria britânica

Vários filmes já estão recebendo luz verde ou retornando ao Reino Unido por causa do IFTC. O primeiro exemplo é o drama de boxe “Giant”, de Rowan Athale, estrelado por Amir El-Masry e Pierce Brosnan, que está se mudando de Malta de volta para o Reino Unido.

Os produtores locais acreditam que o IFTC terá um impacto significativo ao facilitar o financiamento, especialmente para filmes independentes na faixa orçamentária de 5 a 15 milhões de libras (6,5 a 19,6 milhões de dólares), como “O Discurso do Rei”.

Além disso, o incentivo está disponível para coproduções, o que é um fator importante após o impacto negativo do Brexit em algumas produções internacionais, uma vez que irá melhorar a relação entre o Reino Unido e outros países europeus.

Matando 4 coelhos com uma cajadada só!

O IFTC é uma iniciativa ambiciosa e sem precedentes na promoção do cinema independente. De uma única vez, “mata 4 coelhos com uma cajadada só”:

  1. Oferece forte apoio aos longas independentes de baixo e médio orçamento.
  2. Contém uma versão do conhecido “teste cultural europeu”, garantindo a inclusão de talentos e despesas locais.
  3. Oferece apoio ao setor de exibição, uma vez que o incentivo exige estreia nas salas de cinema.
  4. Atua como um incentivo nacional que atrai produções e coproduções internacionais.

Por que este novo incentivo britânico é relevante para os países da América Latina?

Em muitos países da América Latina, há um debate acalorado sobre a regulamentação dos serviços de streaming, bem como o interesse em criar um incentivo federal à produção de conteúdo audiovisual (como “cash rebate” ou crédito tributário transferível), o que traria benefícios consideráveis para a indústria nacional dos respectivos países. Essas importantes iniciativas também devem incluir medidas específicas de apoio à produção independente de longas com orçamentos pequenos e médios, como o IFTC. Trata-se de uma oportunidade de ouro que não pode ser desperdiçada.

 

Steve Solot é Presidente da Latin American Training Center-LATC e Senior Advisor da Albright Stonebridge Group – ASG/DGA

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