O dilema das Film Commissions: o custo-benefício de um incentivo
Por Steve Solot
Atualmente existe uma concorrência feroz entre as Film Commissions (FC’s) de todos os países. Todos procuram oferecer um leque variado de incentivos e “rebates” (reembolsos) atrativos para baratear o custo da produção de filmes, programas de TV e comercias e, assim, atrair produtores internacionais a fim de promover o desenvolvimento econômico, emprego e turismo, assim como outros objetivos políticos. Os benefícios econômicos são muito atraentes. Nos EUA, por exemplo, a filmagem de uma produção cinematográfica “em locação” gera uma média de U$200.000 por dia em atividade econômica e arrecadação de impostos, de acordo com dados da Motion Picture Association of America (MPAA).
Porém, o que antes era visto como um mecanismo ideal para atrair filmagens de cinema e televisão agora está sob ataque como fonte de um possível prejuízo econômica, fazendo com que programas de incentivo sejam revistos em todo o mundo.
O clima econômico atual está fazendo com que muitos governos reavaliem os custos e benefícios de incentivos à produção audiovisual. Nos EUA, programas de saúde, educação, transporte e outros serviços públicos estão sendo cerceados por causa da contínua recessão econômica. Uma vez que muitos governos estaduais são controlados por legisladores que estão empenhados em evitar o aumento de impostos, eles já estão cortando ou reduzindo os programas de incentivos cinematográficos.
Um dos desafios para as FC’s criar ou manter tais programas de incentivo tem sido a de medir adequadamente os seus custos e benefícios. Para fazer isso, as FC’s precisam coletar dados detalhados sobre todos os aspectos dos gastos de produção e emprego, e também realizar estudos de impacto econômico anual utilizando a metodologia tradicional do chamado “multiplicador econômico.” Na América Latina, onde a coleta desses dados e estudos de impacto não são comuns, é pouco provável que as autoridades concordem em implementar um incentivo à produção, que significa um gasto do governo, sem entender seus reais benefícios para a economia local.
INCENTIVOS PARA A PRODUÇÃO NA AMÉRICA LATINA
Na maioria dos países latino-americanos, falta uma política nacional de incentivos fiscais e financeiros para promover filmagens em locação. Durante o recente encontro da Rede Latino-Americana de Film Commissions em São Paulo, o tema dos incentivos e o conceito do estudo de impacto econômico foram altamente debatidos. Na medida em que a Rede se move em direção à consolidação, o estudo de incentivos adequados e sua implementação certamente será um tema importante e polêmico.
Na América Latina, o único país que tem realizado a façanha de criar um incentivo significativo destinado a atrair produções internacionais é o México. O novo incentivo de 17,5% chamado de “alto impacto”, anunciado pelo Presidente Felipe Calderón no ano passado, junta um reembolso em dinheiro aplicado sobre os gastos comprovados, e a devolução do Imposto de Valor Agregado (IVA) gerado no país. Outra vantagem do mecanismo é a de não prejudicar o sistema de incentivos de apoio ao cinema nacional mexicano, já que o gasto total na produção no país deve alcançar um valor mínimo de 70 milhões de pesos (US$ 5,6 milhões), o que automaticamente exclui as produções de cinema nacional mexicanas, que têm orçamento médio de dois milhões de dólares.
Como muitas FC’s na América Latina estão agora considerando um incentivo à produção audiovisual, os formuladores de políticas publicas devem considerar todos os formatos de incentivos mais comuns listados abaixo, embora muitos prefiram o Rebate e Crédito Fiscal, conforme mostra o gráfico anexo de jurisdições selecionadas por todo o mundo.
1. Abatimentos/reduções: oferecem reduções de impostos para os investidores.
2. Isenções: remover o imposto sobre as atividades de negócios;
3. Programas fiscais geográficos: direcionar a criação de emprego para áreas com dificuldades econômicas.
4. Créditos fiscais: a empresa de produção recebe de volta uma percentagem do orçamento de produção na forma de redução de impostos. Créditos fiscais podem ser: reembolsável, não-reembolsáveis ou transferíveis.
Outros incentivos à produção são: Rebates/grants (concessões), isenção da taxa de vendas, créditos fiscais ao investimento, programas de empréstimo, bens ou serviços gratuitos ou com desconto, e zonas isentas de imposto.
Independentemente do tipo de incentivo, é fundamental criar alianças para apoiar não apenas o programa de incentivo, mas todas as atividades da Film Commission com:
1) Profissionais em sindicatos, estúdios, associações de produtores, serviços de apoio.
2) Departamentos governamentais, e grupos de interesse especial.
3) Tomadores de decisão, legisladores e líderes políticos de nível sênior.
O CASO DE INCENTIVOS PARA FILMAGENS NO BRASIL
No Brasil atualmente existem mais de 15 FC’s em vários estágios de formação e atividade, visando à atração de produções audiovisuais internacionais e o posicionamento do Brasil como provedor de locações de forma competitiva no mercado global de entretenimento.
Mas, no Brasil, além de carecer de incentivos significativos (a Rio Film Commission é a única que oferece um incentivo especificamente para produtores nacionais de fora do estado e internacionais), a taxa de câmbio desfavorável penaliza ainda mais o setor, fazendo com que os serviços fiquem relativamente caros, comparados a outros países, como Argentina, Colômbia e México.
O recente caso de Velozes e Furiosos 5, sequência da franquia de ação estrelada por Vin Diesel, Paul Walker e Jordana Brewster, é emblemático. Embora o roteiro do filme aponte o Rio de Janeiro como cenário específico, apenas cenas para os trailers e algumas tomadas panorâmicas foram rodadas na Cidade Maravilhosa, enquanto que a maior parte das filmagens foi feitas em Porto Rico, que oferece um crédito fiscal transferível de 40% dos gastos efetuados na jurisdição.
Foi justamente a proliferação de FC’s que levou o governo federal em 2009 a criar um Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), formado por representantes dos ministérios da Cultura, Relações Exteriores, Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fazenda, entre outros, para determinar ações necessárias para organizar o setor, e também garantir um mínimo de profissionalismo e atendimento qualitativo ao produtor estrangeiro que venha filmar no Brasil. O resultado foi a decisão de que a Agência Nacional do Cinema (Ancine) seria incumbida com a tarefa de regulamentar a atividade.
Entre as ações em estudo pela Ancine, estariam previstas medidas estratégicas como a criação de uma política nacional de incentivos fiscais e financeiros para promover a produção “on-location” de conteúdo nacional e internacional, o que é considerado relevante, dada a atual ausência de tal política.
Steve Solot é Presidente, Filme Rio – Rio Film Commission (Secretaria de Cultura, Governo do Estado do Rio de Janeiro) e Presidente, Latin American Training Center – LATC (Centro Latino-Americano de Treinamento e Assessoria Audiovisual)
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