A cozinha do chefe

Ao ler a sinopse do filme “Chef”, logo se pensa numa comédia romântica das mais convencionais: após brigar com seu patrão, famoso chef de cozinha decide montar seu próprio negócio. Ao mesmo tempo, tenta se reconciliar com o filho, de quem está ausente desde sua separação.

Nada mais batido, certo? Errado. Para usar a terminologia do tema do filme, há um sabor diferente em “Chef”. Não é um sabor destes que se sente imediatamente. Demora um pouco. Em fogo brando, percebe-se que o filme não segue aquelas formulazinhas “sydfieldeanas” tradicionais do gênero, com virada de roteiro aos 30 minutos, etcétera, etcétera. Tampouco existem vilões caricatos, nem momentos destinados ao clipe da canção tema. O patrão não é um capitalista sem coração, e a ex-esposa não é uma megera vingativa. Os personagens são mais críveis e, consequentemente, mais passíveis de identificação junto ao público.

Numa determinada cena, o personagem título (Carl Casper, vivido por Jon Favreau, também roteirista e diretor do filme) se desentende com o patrão Riva (Dustin Hoffmann), porque quer alterar o menu do restaurante. A ideia é surpreender um famoso crítico gastronômico que comanda um blog de grande poder de persuasão junto aos clientes. Porém, o tradicionalista Riva desdenha a crítica, e exige que Carl faça o menu de sempre, “que tem funcionado há dez anos”, trazendo boa clientela. Carl argumenta que não tem mais prazer em preparar os velhos pratos, e Riva fecha questão lembrando-lhe, afinal, quem é o dono do restaurante. O rompimento é inevitável, e aí está a chave para o filme: Favreau (que também é o famoso e bem sucedido diretor dos dois primeiros “Homem de Ferro”) dá aqui o seu recado que está cansado de fazer o mesmo filme com as formulações que têm funcionado há anos. Seu personagem, que faz questão de afirmar que cozinha por prazer, faz as vezes de seu próprio alter ego, e percebe-se aí que o diretor busca apenas fazer um filme que lhe seja prazeroso. De certa maneira, Favreau renega aqui os seus próprios “Homens de Ferro”.

Não que “Chef” seja um filme esteticamente ousado ou revolucionário, longe disso. Mas suas pequenas alterações estilísticas são capazes de provocar algum estranhamento em paladares mais acostumados com as comédias românticas convencionais, com o tal “mais do mesmo”. Só para dar um exemplo, “Chef” nem termina com movimento de grua, vejam só que sacrilégio!

Além da tradicional história de superação, tão grata ao cinema comercial norte-americano, o filme também levanta outras questões interessantes, como o poder das redes sociais para o pequeno empreendedor, o fenômeno da fama imediata proporcionada pelo excesso de exposição e a enorme importância do sempre excluído e coadjuvante “chicano” na sociedade americana. Com direito a um punhado de boas cenas para John Leguizamo.

De qualquer maneira, deve ser bom ser Jon Favreau, que conseguiu atrair para este projeto tão despretensioso nomes de peso como Scartlet Johansson, Dustin Hoffmann e o próprio Homem de Ferro, Robert Downey Jr. O garoto Emjay Anthony também é um achado, interpretando um garoto cheio de veracidade no olhar, e não mais um pequeno gênio hollywoodiano.

“Chef” não é o filme que vai mudar sua vida, mas é um entretenimento acima da média dentro das comédias românticas americanas.

 

Chef
EUA, 101 min., 2013
Direção: Jon Favreau
Distribuição: Vitrine Filmes
Estreia: 14 de agosto

 

Por Celso Sabadin

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