Em ritmo de fast-movies

O que diretores como o veterano Daniel Filho, os “marginais” Bruno Safadi e Julio Bressane e a estreante em longas Vera Egito têm em comum? Cansados de esperar anos pela captação via leis de incentivo para produzir seus filmes, eles pensaram projetos alternativos que pudessem ser executados de forma rápida e com um orçamento ultraeconômico.

Quando rodou “Sorria – Você Está Sendo Filmado – O Filme”, Daniel nem sabia se e quando o lançaria. Dono do quarto maior sucesso do cinema brasileiro, “Se Eu Fosse Você 2” (visto por 6 milhões de espectadores), ele tirou R$ 450 mil do próprio bolso para realizar um projeto oposto ao de seu blockbuster. Adaptou a história de um filme sérvio de que tinha gostado – “Morte de um Homem nos Bálcãs”, de Miroslav Momcilovic – para uma comédia ambientada no Rio de Janeiro. Filmou em poucos dias com uma das menores equipes técnicas de sua longa carreira – menos de dez pessoas – e um elenco de 15 atores globais, entre eles, Susana Vieira e Lázaro Ramos. O filme todo se concentra num único cenário, o apartamento de classe média baixa, cujo proprietário se suicidou, e foi rodado num único plano.

Diretor de filmes autorais como “Meu Nome é Dindi”, o carioca Bruno Safadi já tinha uma experiência bem-sucedida nesse esquema. Ele e o colega Ricardo Pretti filmaram três longas em apenas duas semanas, com o mesmo elenco de apenas três atores: Leandra Leal, Mariana Ximenes e Jiddu Pinheiro – projeto que batizaram de Operação Sônia Silk, em homenagem à personagem de Helena Ignez em “Copacabana mon Amour” (1970), de Rogério Sganzerla. Safadi rodou “O Uivo da Gaita”, Pretti filmou “O Rio nos Pertence”, e nos intervalos eles colhiam planos de Leandra e Mariana para um terceiro filme experimental, “O Fim de uma Era”, cuja narração em off foi escrita durante a montagem. Custo total dos filmes: R$ 470 mil, dos quais R$ 60 mil da própria Leandra e R$ 30 mil de outros colaboradores.

“Sorria – Você Está Sendo Filmado – O Filme” é o último longa rodado por Daniel Filho fora dos padrões de suas produções anteriores, com recursos próprios e equipe mínima. © Theodora Duvivier

Quatro filmes em quatro semanas

“Eu tento unir as duas coisas. O que me mantém são as verbas de editais, mas o ritmo desses projetos é outro. É um tempo de quatro ou cinco anos para realizar um filme com patrocínio estatal. São meses para receber uma resposta, mais meses para contratação e reembolso”, explica Bruno. Tanto que ele ainda espera um montante “preso” há nove meses para conseguir lançar “Éden”, longa que contou com verbas da Petrobras e do Fundo Setorial do Audiovisual. O filme só deve estrear em junho, depois dos filmes da Operação Sônia Silk.

Enquanto monta a engenharia financeira para seu próximo filme incentivado – “Lilith”, com a portuguesa Maria de Medeiros, que será rodado na Argentina –, Safadi embarcou antes em outro projeto rápido e independente: o projeto Tela Brilhadora, pacote de quatro filmes que foram rodados em uma semana cada um, a um custo total de R$ 150 mil. Apesar da economia, os diretores trabalharam com equipes distintas.

A atriz Mariana Ximenes, em cena do longa experimental “O Fim de uma Era”, em que ela contracenou nos intervalos das filmagens de “O Uivo da Gaita”, ambos de Bruno Safadi

O projeto surgiu de uma ideia de Julio Bressane, que assina um dos longas, “O Garoto”, inspirado num conto de Jorge Luís Borges. Filmado em cinco dias e em apenas quatro locações – duas no Leblon, no Rio, e duas na Paraíba – conta a história de dois jovens (Marjorie Estiano e Gabriel Leone) que vivem uma aventura espiritual e amorosa que tem um desfecho trágico quando chega uma tutora (Josié Antello, de “Educação Sentimental”).

O diretor Bruno Safadi chegou a realizar três longas em apenas duas semanas, aproveitando o mesmo elenco e equipe. © Mario Miranda Filho

Safadi filmou “O Prefeito”, sobre um prefeito do Rio (Nizo Neto) que decide separar a cidade do resto do Brasil. Ele passa a governar das ruínas do Elevado da Perimetral, na zona portuária da cidade, e lá encontra uma alma errante (Djin Sganzerla). “Numa das locações, lembro que o último dia de filmagem do Bressane coincidiu com o meu primeiro dia de filmagem”, diz. Os outros dois são estreantes na direção de longas: Rodrigo Lima (“O Espelho”, adaptação do conto de Machado de Assis) e Moa Batsow (o documentário “A Origem do Mundo”).

Uma festa de 17 dias 

Em São Paulo, Vera Egito, corroteirista de “À Deriva” que já teve seus curtas exibidos na Semana da Crítica de Cannes, vive processo parecido. Sua intenção era estrear em longas com um projeto desenvolvido há anos, “Maria Antônia – A Incrível Batalha dos Estudantes”. Mas a demora na captação fez com que passasse na frente um projeto independente e mais econômico, “São Paulo É uma Festa”, história de três amigos rodada inteira num apartamento da cidade.

“São Paulo É uma Festa” foi rodado em 17 dias com uma equipe de apenas 12 pessoas. “A economia foi total. Escrevi o roteiro já sabendo onde filmaria cada locação. Todas seriam emprestadas de amigos. Outra decisão foi não ter equipe de maquinária, elétrica, figurino e maquiagem”, conta Vera. “O filme coube nesse prazo porque foi concebido pra isso. E porque não havia tempo de afinar a luz, que era toda natural.”

O longa “São Paulo É uma Festa”, de Vera Egito, foi pensado para uma produção rápida e econômica desde a realização do roteiro, escrito já sabendo onde se filmaria cada locação

Para Vera, a filmagem em esquema rápido precisa ser parte do DNA do filme para dar certo. “Esse filme tinha que ser feito na urgência em que foi feito. Faz parte da personalidade dele. Com mais tempo, teríamos mais conforto, mas não um melhor filme necessariamente. Todos nós entramos na febre do projeto, e esse esquema de cooperativa com certeza contribuiu pra isso”, define.

Safadi, já “expert” nesses projetos, concorda que há pequenas regras a serem seguidas pelo cineasta. “Você não pode ter um roteiro maior do que o orçamento em mãos, porque vai se desgastar tendo que adaptá-lo à realidade na hora de filmar. Também é bom pensar em planos mais longos, para economizar tempo de filmagem”.

À espera da produção do longa “Maria Antônia”, a diretora Vera Egito passou à frente um projeto independente e mais rápido de realizar, “São Paulo É uma Festa”, rodado em 17 dias e com uma equipe de apenas 12 pessoas. © Aline Arruda

 

Por Thiago Stivaletti

2 thoughts on “Em ritmo de fast-movies

  • 29 de junho de 2015 em 06:55
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    O cinema brasileiro está de parabêns!

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  • 6 de julho de 2015 em 20:38
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    O formato de produção pode ser mais rápido se utilizar a iniciativa privada, está pode ser a nova tendência no cinema brasileiro!

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