Entrevista: Rodrigo Teixeira

Há dez anos, Rodrigo Teixeira, dono da RT Features, via chegar às telas o primeiro longa-metragem que trazia seu nome nos créditos: “O Casamento de Romeu e Julieta” (2005), filme que coproduziu ao lado da LC Barreto. De lá pra cá, o produtor colocou de pé outros 21 longas-metragens e três séries para a TV. Entre erros e acertos, tropeços e recompensas, ele admite que não pode se queixar dos negócios. “Na primeira metade da minha carreira, só perdi [dinheiro]. Quer dizer, ganhei uma vez [com “O Cheiro do Ralo”] e perdi em quatro. Na segunda metade, mais ganhei que perdi”, resume.

Teixeira conversou com a Revista de CINEMA na Cinemateca Brasileira enquanto, numa das salas do espaço, era feita uma projeção de “O Gorila” para a equipe envolvida na produção. Poucos dias depois, ele embarcaria para Nova York para acompanhar as filmagens de “Indignation”, baseado no livro homônimo de Philip Roth. O filme marca a estreia de James Schamus – copresidente da Focus Features e coautor de roteiros de filmes como “O Tigre e o Dragão” – na direção.

“Fui chamado para investir e topei”, diz, simplificando aquilo que, no início de sua carreira, era visto com certa desconfiança pelos pares brasileiros. Quem era, afinal, essa figura que comprava direitos de livros a torto e a direito, entrava em coproduções internacionais e circulava à vontade por Sundance? “Foram pelo menos uns cinco anos até que começassem a me levar a sério”, diz, sem resquício de mágoa, mas deixando transparecer uma ponta de orgulho, o produtor que, em 2014, emplacou dois títulos entre as dez maiores bilheterias do cinema brasileiro – “Alemão” e “Tim Maia”.

A primeira ficha que Teixeira apostou no mercado cultural não foi, porém, cinematográfica, mas sim literária: a coletânea de livros “Camisa 13”, sobre times de futebol. Foi justamente uma dessas histórias, base do filme de Bruno Barreto, que abriu para ele as portas do cinema. O faro para os livros ainda renderia muitos outros projetos. Só os direitos sobre os livros de Lourenço Mutarelli originariam três longas: “O Cheiro do Ralo”, “Natimorto” (2009) e “Quando Eu Era Vivo” (2014). Os diretos de adaptar ficcionalmente as canções de Chico Buarque, por sua vez, geraram a minissérie “Amor em Quatro Atos” (2011), veiculada pela Globo, e o filme “Abismo Prateado” (2011), de Karim Aïnouz.

Aos 38 anos, Teixeira, carioca radicado em São Paulo, cinéfilo e leitor compulsivo, pai de dois filhos pequenos, sente que, ao longo dessa década, o cinema lhe deu muita coisa – de amigos a um enorme sentimento de realização. Mas também o consumiu. “Em cinco anos, envelheci o que eu não tinha envelhecido em dez”, resume.

Mariana Ximenes e Otávio Müller, em “O Gorila”, de José Eduardo Belmonte, em que Rodrigo teve uma relação produtor-criador

Revista de CINEMA – Já que estamos aqui por causa de “O Gorila”, acho que podemos começar a conversa por ele. Você sempre se posiciona como um produtor-criador, que gosta de participar ativamente dos filmes. A parceria com o [José Eduardo] Belmonte [realizador de “O Gorila”] resume um pouco a relação que você espera ter com um diretor? Pergunto isso porque vocês já fizeram três longas [“Alemão”, “Aurora” e “O Gorila”], uma série [“O Hipnotizador”] e têm mais dois projetos em desenvolvimento [“Alemão 2” e “Memórias do Cárcere”].

Rodrigo Teixeira – Sempre ouvi falar do Belmonte, mas nunca tinha visto seus filmes, até que, em 2009, ele me procurou interessado em dirigir “Tim Maia”. Fui ver a obra dele e gostei muito. Falei então que “Tim Maia” seria dirigido pelo Mauro Lima, mas que tinha um projeto que achava a cara dele: “O Gorila”. Ele leu, gostou, a gente começou a desenvolver o filme e foi criando uma relação de amizade. Passados dois anos, ele voltou a me procurar, dizendo que, depois da experiência com um projeto maior, o “Billi Pig” (2012), ele queria voltar a algo menor, como “O Gorila”. Naquele momento, eu estava nos Estados Unidos começando a produzir o “Frances Ha” (2012), e era exatamente o que eu buscava também. Eu tinha saído de uma experiência muito bem sucedida, “O Cheiro do Ralo” (2006), para filmes maiores e tinha sofrido as consequências disso. Ou seja, queria voltar às minhas origens. O que eu falei pra ele é que tinha gostado muito dos filmes dele, mas que queria estabelecer uma relação de troca, opinando no elenco, na equipe. Tanto que fui eu, por exemplo, quem sugeriu a [uruguaia] Barbara Alvares para fazer a fotografia.

O resultado do processo de trabalho com o Belmonte é muito bom. Ele troca bastante, e isso me dá prazer. Trabalhar como produtor só para levantar dinheiro não me interessa. No caso do “Alemão”, eu vinha pensando em fazer um filme com essa premissa há muito tempo e, quando vi uma matéria sobre os dois anos da tomada do morro, falei: “vou fazer esse filme”. Conversei com o Belmonte e, da idealização até a filmagem, foram cinco meses. Ele, de novo, foi impecável, e esse filme foi o maior sucesso da minha carreira comercial no Brasil. Ele custou R$ 1,2 milhão, ou seja, tem o tamanho de um filme de arte, e fez um milhão de espectadores – ficando, inclusive, na frente do “Tim Maia”. Depois disso, resolvi chamá-lo para fazer “O Hipnotizador”, série da HBO que estreou em agosto. Em todos os casos, os projetos são da RT e o Belmonte dirige. Isso até gera um pouco de ciúme nos outros diretores que trabalham comigo. Por que minha carreira com o Belmonte andou tão rápido? Porque foi uma experiência que deu certo.

Revista de CINEMA – E, no meio do caminho, vocês ainda fizeram um terror. Como surgiu esse filme rodado na sua casa?

Rodrigo Teixeira – Eu estava mudando de casa e, olhando para aquele espaço vazio, pensei: “Por que não fazer um filme de terror aqui?”. Tínhamos três dias para bolar uma ideia. Liguei para a Carolina Dieckmann, a Marjorie Estiano, a Olívia Torres, o Juliano Cazarré e para o Belmonte. Eu disse pra ele que, em uma semana de filmagem, ele teria a equipe dos sonhos. Tivemos o steadycam que faz os filmes do Gaspar Noé, um fotógrafo de publicidade cuja semana é caríssima, e, em seis dias, o filme estava feito. Por enquanto, se chama “Aurora”.

As filmagens de “Aurora” foram feitas na residência de Rodrigo Teixeira, em apenas seis dias © Luciana Melo

Revista de CINEMA – “O Gorila”, pelo tamanho e estilo, é um filme que você considera a cara da RT?

Rodrigo Teixeira – Não acho que a RT tenha uma cara. O filme que fiz com o Marco Dutra, rodado no Uruguai e falado em espanhol, custou mais de R$ 3,4 milhões, ou seja, é caro para os padrões brasileiros. “O Gorila” foi quase um experimento. Mesmo o “Aurora”, com seis dias, custou quase o que “O Gorila” custou com 18 diárias. O que ele tem é que foi um processo que a gente viu que dá certo. Então, não é que eu queira repetir o processo de “O Gorila”, mas eu quero que meus filmes tenham preços reais. Acho que a grande questão do cinema brasileiro é a precificação. Não tenho interesse em fazer filme jogando o preço lá em cima para me remunerar na produção.

Revista de CINEMA – Quanto custou “O Gorila”?

Rodrigo Teixeira – De produção, com pós, R$ 1,2 milhão, R$ 1,3 milhão.

Revista de CINEMA – E o lançamento?

Rodrigo Teixeira – Bota aí R$ 1,4 milhão com tudo. É uma produção pequena, com uma estratégia de lançamento pequena. Acho, inclusive, que devia tê-lo lançado antes.

Revista de CINEMA – Por que o lançamento levou tanto tempo? O filme passou no Festival do Rio de 2012.

Rodrigo Teixeira – Eu não queria lançá-lo antes do “Alemão”, porque achava que o “Alemão” alavancaria “O Gorila”. E aí eu errei. No ano passado, lancei o “Quando Eu Era Vivo”, “Alemão” e “Tim Maia”. Poderia, no meio disso, ter estreado “O Gorila”.

Revista de CINEMA – O que aconteceu? Você achou que lançar quatro longas-metragens seria demais?

Rodrigo Teixeira – Na verdade, eu não estava dando mais conta de tanto trabalho. Além de lançar os três longas, eu filmei duas séries, sendo que uma série e um longa foram feitos no Uruguai. Ou seja, no segundo semestre de 2014, eu praticamente fiquei em Montevidéu. Além disso, viajei para os laboratórios de Sundance, fui para Los Angeles, filmei um longa em Nova York [“Love is Strange”, de Ira Sachs], outro no Canadá [“The Witch”, de Robert Eggers, premiado em Sundance] e finalizei o “Mistress America” [de Noah Baumbach, diretor de “Frances Ha”]. Eu não aguentava fazer mais nada.

Revista de CINEMA – Mas este ano não está muito diferente, né?

Rodrigo Teixeira – Até agora, filmei dois longas, “Aurora” e “Love” [de Gaspar Noé, exibido em Cannes] e, no começo do ano, fui para Sundance lançar dois longas. Mas até que estou me segurando. No segundo semestre, é que vou entrar num processo louco de filmagem. O que eu me propus foi um primeiro semestre um pouco mais calmo, com muita reflexão dentro da empresa.

“Love”, dirigido pelo argentino Gaspar Noé, produzido por Teixeira em Nova York, gerou polêmica no Festival de Cannes, e está tendo um bom lançamento mundial

Revista de CINEMA – Houve alguma mudança interna na RT?

Rodrigo Teixeira – Não. Eu acho, inclusive, que deste ano até o primeiro semestre de 2017, o produtor brasileiro tem de estar preparado para uma não disponibilidade de recursos. Não tem dinheiro.

Revista de CINEMA – Não tem o do Fundo Setorial do Audiovisual [FSA]?

Rodrigo Teixeira – Tem? Cadê o dinheiro? Está liberado? Essa é minha pergunta. Se estivesse liberado, teríamos um excesso de produção, e não é o que está acontecendo. Quem está produzindo agora é quem ganhou o Fundo Setorial há dois anos. O dinheiro que está sendo liberado é o dos editais de 2013. No ano que vem, se não forem resolvidas as questões do Fundo Setorial, teremos um ano parado. Porque com Artigo 1º e Artigo 1º A ninguém mais conta.

Revista de CINEMA – Você continua captando via Artigo 1º ou está quase impossível mesmo?

Rodrigo Teixeira – Se você tem relacionamento com as empresas, ainda consegue alguma coisa, mas é difícil. Eu capto, no máximo, R$ 2 milhões de Artigo 1º por ano. No ano passado, levantei R$ 2,5 milhões de Artigo 1º; este ano, R$ 600 mil.

Revista de CINEMA – E você entra em muitas chamadas do FSA?

Rodrigo Teixeira – Entro quando acho que vale a pena. Estudo meu projeto e vejo se, economicamente, ele é mais viável sendo financiado por mim ou pelo FSA. Funciona de forma diferente em cada projeto. Sou super a favor do Fundo Setorial, e acho que a Ancine está sabendo criar competição e demanda no mercado. Por outro lado, acho que, em algum momento, haverá uma crítica ao FSA, porque ele prevê que haja retorno financeiro. Então, um dia alguém vai fazer a conta de quanto o FSA investiu e quanto rendeu. Aí vamos ver o que acontece.

O longa de ação “Alemão”, lançado em 2014, foi o filme de maior rentabilidade para a produtora RT, de propriedade de Teixeira © Páprica Fotografia

Revista de CINEMA – Você passou pelo mercado financeiro e, ao entrar no cinema, tinha uma visão de que era possível fazer filmes sem recursos públicos. Desde então, sua visão a respeito das formas de financiamento mudou bastante, não?

Rodrigo Teixeira – Meu segundo filme, “O Cheiro do Ralo”, eu próprio financiei, e foi uma experiência muito boa. Ganhei dinheiro com esse filme. O problema é que eu esqueci que ela era boa e parti para o que o mercado fazia normalmente. Falei: “Não vou mais financiar, vou pegar dinheiro como todo mundo pega”.

Revista de CINEMA – Por que você fez isso se o filme tinha dado dinheiro?

Rodrigo Teixeira – Porque financiar é um risco muito grande, e é desgastante. Eu era novo no mercado e tinha dificuldades. Eu trabalhei no mercado financeiro, mas minha grande relação com o mercado financeiro são as pessoas ao meu redor, os meus amigos. São esses caras que me educam e me dão bronca quando eu erro. Porque eu tomo muita porrada também: tenho uma cabeça de artista, e colocar dinheiro em filme é arriscado. Quando fiz “O Cheiro do Ralo”, eu tinha 28 anos e, apesar de ter financiado o filme, não me envolvi na produção. Aí eu descobri que se você não se fizer presente num filme, as pessoas não notam que você fez parte dele. O filme acabou sendo muito mais associado ao Heitor Dhalia e ao Matias Mariani do que a mim. Quando o filme acabou, vi que continuava tendo a mesma dificuldade de antes no mercado e percebi que estava fazendo tudo errado. Então pensei: “tenho de ser dono do meu nariz e fazer aquilo em que acredito, que é comprar direitos, investir em desenvolvimento e fazer meus projetos”. Foi assim que comecei a me destacar e a ter minha filmografia.

“O Cheiro do Ralo” (2007), de Heitor Dhalia, foi a primeira aposta concreta de Teixeira no cinema, seu primeiro sucesso que serviu como aprendizado

Revista de CINEMA – Pensando que parte dessa filmografia é formada por produções estrangeiras, eu queria que você falasse um pouco sobre o lançamento desses títulos. A gente sabe das dificuldades do cinema brasileiro no circuito, mas o cinema internacional, que não o blockbuster, também enfrenta uma disputa cruel por espaço. Este ano, você deve lançar “Mistress America” (Fox), “Love” (Imovision) e “The Witch” (Universal). O fato de você ser produtor facilita o lançamento desses filmes aqui?

Rodrigo Teixeira – Esses filmes, especificamente, eu sei como devem ser lançados. Estou conversando com os três distribuidores para pensarmos nas estratégias. O “Love”, por exemplo, eu lançaria em três sessões, nos finais de semana, das 22h à meia-noite. Quem viu, viu. Quem não viu, vai esperar a semana seguinte. O “Love” tem de ser uma experiência; ele mexe com a libido das pessoas.

Revista de CINEMA – É mais fácil lançar um filme do Gaspar Noé do que um filme brasileiro?

Rodrigo Teixeira – O cinema brasileiro, infelizmente, ainda é visto como um gênero, e isso dificulta um pouco as coisas. O espectador, em geral, não consegue identificar os diferentes gêneros – no máximo, identifica a comédia. Mas o fato é que ainda se fala: “Ah, vou ver um filme brasileiro”. Além disso, o cinema, hoje, está dominado pelos blockbusters. Eu sou cinéfilo e já vi uns 55 filmes este ano. Mas quantas vezes fui ao cinema? Em Cannes, vi três filmes; em Sundance, dois; e devo ter pago para ir ao cinema umas duas vezes. Então, desses 55 filmes, dez eu vi numa tela de cinema e 45 na minha casa, muitas vezes no iPad. Ou seja, eu consumo cinema, mas não estou indo ao cinema. Adoro Gaspar Noé e Hou Hsiao-Hsien, mas acho que, hoje, o que busco no cinema é diversão. Uma coisa um pouco mais séria, eu talvez prefira ver num outro ambiente, sozinho, como se estivesse lendo um livro. Se quero me impressionar com o espetáculo e a tecnologia, eu vejo “Mad Max”. Os irmãos Dardenne eu posso ver no iPad; eu entro na história do mesmo jeito. Acho que esse é um movimento inevitável: o cinema comercial vai ser o blockbuster. O cinema que eu produzo e o cinema que o Walter Salles dirige, a gente vai comprar na internet e ver em casa. Será, inclusive, uma relação muito mais justa com o produtor, porque você não tem o intermediário e o dono da sala de cinema, que consomem de 60% a 70% do seu ganho.

A série “O Hipnotizador”, produzida por Rodrigo para a HBO, prevista para estrear em agosto, foi baseada nas histórias em quadrinhos argentinas

Revista de CINEMA – Você obtém retorno financeiro de outras janelas?

Rodrigo Teixeira – DVD não rola, acabou. É uma coisa para colecionador, e olhe lá. Os números do VOD estão começando a crescer e ainda é difícil avaliá-los. Mas o futuro está aí. Vai ter o cinema espetáculo e alguns lançamentos especiais. Meu filme participará de um festival, terá quatro premières pagas, que já me remuneram de alguma forma, e, depois, vai direto para o VOD. O prazer de exibir e ver um filme na tela grande continuará existindo. O que não podemos é querer manter o filme no cinema. É muito caro alugar espaço numa tela grande, e a gente não tem como competir financeiramente com “Capitão América”, “X-Man” e “Mad Max”. Nossos filmes perdem uma tremenda grana tentando se igualar a essas produções que são eventos de massa. Alguns poucos filmes vão se sobressair, claro, mas a maioria vai “flopar”.

Revista de CINEMA – Mas todo mundo continua querendo ter seu filme na sala de cinema.

Rodrigo Teixeira – O diretor brasileiro está pensando errado. No dia em que o Spielberg, o David Fincher ou qualquer outro cara que esteja na moda, disser que seu filme vai ter a première no cinema, vai passar num festival e, no dia seguinte, estará disponível para compra online, mudou a regra do jogo. Mas, para que isso aconteça, você precisa de uma marca e de um filme forte. Porque, hoje, se o filme não estreia no cinema, você acha que ele é ruim.

Revista de CINEMA – Por que você nunca fez um lançamento direto em VOD?

Rodrigo Teixeira – Estou pensando em testar isso com “Aurora”. Posso fazer um acordo com a Globo, uma première bacana, reunir meu elenco, fazer uma propaganda online e ir direto para o VOD. Quem quiser, paga. Seria um teste. Hoje, todo mundo tem Netflix. Meu filho de seis anos fala: “Pai, quero ver Netflix”. Ele sabe que, estando ali, tem um mundo à disposição. As salas de cinema foram muito fominhas e terminarão restritas ao cinema espetáculo. O cinema independente não terá dinheiro para entrar no circuito comercial; ele vai ganhar dinheiro de outra forma.

Revista de CINEMA – O que me parece é que, neste momento, o cinema independente não consegue nem se manter na sala de cinema nem ganhar dinheiro ou ser super visto em VOD.

Rodrigo Teixeira – Mas é uma questão de tempo e de educação. O hábito está mudando. A TV também vai deixar de ter uma programação linear: você vai ver o que quiser quando quiser e, no caso das séries, vários episódios de uma vez. No Brasil, a TV ainda não trabalha o online, mas tenho certeza de que se a gente fizer uma série legal e disponibilizar no Netflix, o público aparece.

Revista de CINEMA – Como foi produzir séries? Porque é uma experiência bem diferente daquela do longa-metragem, não?

Rodrigo Teixeira – Foi incrível, e tem uma vantagem em relação ao longa porque, como contratado, você tem acesso ao financiamento de uma forma muito mais profissional e rápida. Minha preocupação era só manter o orçamento. Eu não ficava tenso por não saber se o dinheiro estaria liberado dali a uma semana. Eu adoraria mesclar cada vez mais cinema e TV.

“Tim Maia” (2014), de Mauro Lima, projeto que chamou a atenção de Belmonte, e fez com que Teixeira o convidasse a dirigir outros filmes da RT

Revista de CINEMA – Imagino que hoje muita gente te procure com projetos debaixo do braço. Você tem interesse em projetos de terceiros?

Rodrigo Teixeira – Como tenho muitos projetos e demandas próprias, tenho dificuldade de absorver projetos de terceiros. Eu não sou banco, então meu dinheiro é finito; e também não sou nem um canal de televisão nem um estúdio de Hollywood. Alguns artistas me procuram em busca de um projeto de qualidade no qual possam entrar; outros me procuram para viabilizar seus projetos. Eu, de fato, não teria como viabilizar os meus projetos se parasse para viabilizar as coisas dos outros.

Revista de CINEMA – Mas você recebe as pessoas para conhecer os projetos?

Rodrigo Teixeira – Muito. Mas é algo que tenho tentado mudar, porque o tempo está escasso e eu não consigo dar a atenção devida. Isso é ruim porque algumas pessoas começam a achar que sou metido e eu não quero essa energia. Preciso me concentrar nas coisas que estão dentro de casa, descobrir gente nova e trazer para perto, e apreciar o projeto dos meus parceiros como espectador.

Revista de CINEMA – Como você se organiza para lidar com esse fluxo de coisas sem perder o foco? Hoje, muitas produtoras têm dezenas de projetos em desenvolvimento, mas não é fácil concluí-los.

Rodrigo Teixeira – Em cinco anos, envelheci o que eu não tinha envelhecido em dez. Por quê? Porque eu concluo. Durante muito tempo, fui chamado de megalomaníaco por pares da minha indústria. Isso aconteceu, em parte, porque eu dava entrevistas de projetos que iam levar um tempo até se concretizarem. Até que as coisas começaram a acontecer e eu não precisei mais me justificar. Mas é assim: se um projeto está em desenvolvimento, posso interrompê-lo. Se entrei na pré-produção, ele vai acontecer. Tenho muita coisa em andamento que ninguém sabe que existe. Hoje em dia, prefiro aparecer pouco: rejeito pauta toda semana. Gosto de aparecer só quando um filme está pronto, e não porque comprei mais um direito autoral. Quero ser entrevistado para você falar bem de um filme que eu fiz, para você falar mal de um filme que eu fiz. Nesses anos, perdi muito a vaidade.

Revista de CINEMA – Por quê?

Rodrigo Teixeira – Porque hoje eu sei onde estou, sei onde errei e acertei. Já me entendo mais como produtor e consigo dormir com a cabeça tranquila, sem me chatear com uma crítica que recebi, achando que eu sou aquilo que falaram que sou. Amadureci.

Revista de CINEMA – Como está a parceria que você firmou com o Martin Scorsese para a realização de filmes de cinco diretores em início de carreira?

Rodrigo Teixeira – Estamos no processo de seleção dos filmes. Tivemos acesso a menos projetos do que gostaríamos. Estamos selecionando juntos os projetos que vão receber investimento, e a ideia é que, no ano que vem, a gente tenha pelo menos uns três realizados.

Revista de CINEMA – A sua formação cinematográfica, como a de muita gente da sua geração, passa essencialmente pelo cinema norte-americano. Mas quais são as suas memórias do cinema brasileiro?

Rodrigo Teixeira – Quando criança, vi “Dona Flor e seus Dois Maridos”, “Bye Bye Brasil”, “Memórias do Cárcere” e “Pixote”, que foram filmes que marcaram minha vida. Vi “O Romance da Empregada” também. Tenho uma memória muito carinhosa desses filmes e dos filmes dos Trapalhões. Acho que o Renato Aragão, até a morte do Zacarias, foi um gênio. Ele fez obras-primas que, um dia, ainda vão ter o reconhecimento que merecem. Ele fazia um entretenimento que batia a Walt Disney.

Revista de CINEMA – E as comédias? O que, a seu ver, elas significam para o cinema brasileiro?

Rodrigo Teixeira – Acho que é o gênero brasileiro por excelência. A história do cinema brasileiro é essa. A comédia sempre existiu. Quando é bem feita, ela funciona. O que eu acho é que você não pode só ter comédia. Tem que ter ação, terror, drama. Tudo.

Revista de CINEMA – Você mais ganhou ou perdeu dinheiro com cinema?

Rodrigo Teixeira – Na primeira metade da minha carreira, só perdi. Ganhei uma vez e perdi em quatro. Na segunda metade, mais ganhei que perdi.

Revista de CINEMA – Ou seja, foi aprendendo.

Rodrigo Teixeira – Não sei, espero que sim. Mas cinema não tem receita.

Revista de CINEMA – Nesses quatro filmes em que você perdeu, você acha que errou?

Rodrigo Teixeira – Errei por várias razões. Errei porque era imaturo; porque não sabia produzir tão bem quanto hoje; porque tinha uma visão de cinema diferente da que tenho hoje.

Revista de CINEMA – Você me disse que a RT tem 22 funcionários. Ela deve crescer?

Rodrigo Teixeira – Por mim, ficaria deste tamanho pelo resto da vida.

 

Por Ana Paula Sousa

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