ANCINE faz recomendações para regulação do vídeo sob demanda
A Agência Nacional do Cinema – ANCINE apresentou ao Conselho Superior do Cinema o relatório da Consulta Pública realizada e um conjunto de recomendações para a regulação dos serviços de vídeo sob demanda no Brasil. As recomendações, aprovadas pela Diretoria Colegiada da ANCINE e apresentadas em reunião realizada nesta terça-feira, 16 de maio, em Brasília, foram consolidadas pela agência após estudos sobre experiências internacionais e de um debate público que contou com a participação ativa de agentes do mercado audiovisual e da sociedade, por meio de contribuições enviadas para a Consulta Pública de uma Notícia Regulatória sobre a comunicação audiovisual sob demanda.
A ANCINE recomenda que, com a intenção de garantir estabilidade e segurança jurídica, a regulação do segmento de comunicação audiovisual sob demanda no Brasil seja feita por meio de legislação específica. A proposta define a comunicação audiovisual sob demanda como sendo o “complexo de atividades, sistemas, plataformas e interfaces destinadas a oferecer ao usuário, por meio de redes de comunicação eletrônica, a seu pedido e em momento por ele determinado, serviços baseados na oferta de conteúdos audiovisuais previamente selecionados ou organizados em catálogos”, definição que inclui os provedores dos serviços de comunicação audiovisual sob demanda, como Netflix, e as plataformas de compartilhamento de conteúdo, como o Youtube. Pela proposta apresentada, provedores e plataformas, embora sejam ambos constituintes da Comunicação Audiovisual sob Demanda, devem ter tratamento regulatório diferenciado.
Como forma de garantir isonomia de tratamento regulatório e tributário, todos os agentes econômicos que ofereçam acesso a conteúdos audiovisuais a usuários no Brasil devem ser submetidos à legislação, independentemente da localização de sua sede ou da infraestrutura para a prestação do serviço. Ficariam ausentes do escopo da regulação a oferta temporária de conteúdo organizado por programadora ou emissora de radiodifusão (catch up TV), a oferta de conteúdos jornalísticos, a oferta de conteúdo operada pelos Poderes da República Federativa do Brasil, e a oferta de conteúdo não direcionada ao público brasileiro.
Em relação às obrigações a serem observadas pelos provedores do serviço, a ANCINE recomenda que a regulação determine que seja disponibilizado um percentual mínimo de 20% de conteúdos audiovisuais brasileiros de espaço qualificado nos catálogos, sendo, pelo menos a metade, produzidos por produtora brasileira independente e que os provedores realizem investimentos anuais em produção ou licenciamento de obras brasileiras independentes. Os percentuais de investimento obrigatório seriam calculados progressivamente sobre a receita bruta de faturamento das empresas, variando de 0% para a parcela de receita até R$ 3,6 milhões a 4% para a parcela de receita anual acima de R$ 70 milhões. A proposta tem como objetivo principal a promoção da cultura nacional e o estímulo à produção nacional independente, e guarda sintonia com a maior parte das experiências regulatórias internacionais para o segmento.
O documento especifica ainda a necessidade de garantia de equilíbrio na divulgação dos títulos brasileiros nas interfaces dos serviços, com exposição transversal dos conteúdos brasileiros em todas as seções e não apenas em nichos. Para evitar a criação de barreiras à entrada de novos provedores no mercado, a sugestão é que as obrigações não sejam impostas às microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples.
Também foram previstas obrigações relativas a divulgação da classificação indicativa das obras audiovisuais com a disponibilização de meios que possibilitem o bloqueio de visualização de acordo com faixas etárias e a obrigação do fornecimento de conteúdo acessível a deficientes visuais e auditivos por meio de legendagem, legendagem descritiva, audiodescrição e LIBRAS.
O documento estabelece ainda recomendações relativas ao recolhimento da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional – CONDECINE. Partindo da constatação de que a atual forma de cobrança da CONDECINE, obrigatória a todos que atuam no segmento, é limitadora da formação de amplos catálogos e, portanto, inibidora do desenvolvimento da atividade, a agência propõe a adoção de um novo modelo que reduza os custos da operação e as barreiras de entrada.
A Consulta Pública trouxe um consenso sobre a necessidade de adequação da CONDECINE às características do segmento, passando da cobrança por título de obra audiovisual a um percentual sobre a receita bruta anual. Deste modo a ANCINE recomenda a revisão da estrutura de incidência da CONDECINE estabelecendo uma forma específica que tenha como fato gerador a receita decorrente do serviço de vídeo sob demanda ou plataforma de compartilhamento de conteúdo audiovisual, tendo como sujeitos passivos os provedores dos serviços ou os responsáveis pelas plataformas.
A base de cálculo seria a receita bruta anual relativa à venda de espaço publicitário, assinatura para acesso ao catálogo, e aluguel ou venda de conteúdo individualizado. Assim como na obrigatoriedade de investimento na produção ou licenciamento de conteúdo, a ANCINE propõe neste caso o estabelecimento de alíquotas progressivas, iniciando em 0% para a parcela de receita bruta anual até R$ 3,6 milhões e tendo como limite 4% para a parcela de receita bruta anual acima de R$ 70 milhões.
As recomendações da ANCINE para a regulação dos serviços de vídeo sob demanda são fruto de um intenso debate que teve início em 2015, no âmbito do Conselho Superior do Cinema. Em uma série de reuniões, o plenário do Conselho discutiu a modelagem de um ambiente regulatório com o objetivo de garantir o desenvolvimento do segmento no Brasil. Dessas discussões saiu, em dezembro de 2015, o documento “Consolidação da visão do Conselho Superior do Cinema sobre a construção de um marco regulatório do serviço de vídeo sob demanda”, que serviu de base para a publicação de uma Notícia Regulatória posta pela ANCINE em Consulta Pública para colher contribuições dos agentes do setor e de toda a sociedade brasileira.
Com o acentuado crescimento apresentado nos últimos anos e seu impacto nos hábitos de consumo de conteúdo, o serviço de vídeo sob demanda se tornou peça fundamental para a garantia da continuidade do ciclo virtuoso de crescimento experimentado pelo audiovisual brasileiro nos últimos anos. No Brasil, o segmento tem experimentado um crescimento em níveis superiores ao desempenho mundial. Só o maior provedor mundial de serviços de vídeo por demanda tem hoje mais de 7 milhões de assinantes no Brasil e receitas superiores à maioria das operadoras de TV aberta.
Este cenário torna essencial a ação do Estado para assegurar um ambiente concorrencial e regulatório isonômico para garantir que não se percam de vista valores e princípios constitucionais como os da liberdade de expressão e promoção da cultura brasileira, além de permitir o acesso de empresas menores ao mercado e a adequação de agentes estrangeiros à legislação brasileira.
A ANCINE tem a convicção de que o vídeo sob demanda precisa de um marco regulatório. O documento apresentado esta semana pela Agência ao Conselho Superior do Cinema consolida todo este debate e oferece os subsídios necessários para a elaboração de uma legislação para o vídeo por demanda no Brasil que garanta o crescimento e assegure o dinamismo do setor.