Um Banho de Vida

Por Maria do Rosário Caetano

“Um Banho de Vida”, comédia agridoce sobre time de quarentões do nado sincronizado, chega ao Brasil depois de arrasar nas bilheterias francesas. O filme, dirigido pelo ator Gilles Lellouche, foi o mais visto entre as produções made in France, mobilizando 4,1 milhões de espectadores. Além do mais, recebeu dez indicações ao Cesar, o “Oscar francês”. Só ganhou uma estatueta (a de melhor ator coadjuvante para Philippe Katherine), mas liderou as indicações ao lado do vencedor, o drama conjugal “Custódia”, de Xavier Legrand. Um feito, convenhamos, para uma comédia blockbuster.

Gilles Lellouche, de 46 anos, fez questão de reunir time de atores da pesada e concentrou-se na direção (o que é raro, quando o realizador é, ele mesmo, ator dos mais atuantes e festejados). Liderando o elenco, está Mathieu Amalric, um dos futuros (e incompetentes) praticantes do nado sincronizado. Com ele, formarão a desajeitada equipe aquática o roqueiro cabeludo (e fracassado) Jean-Hughes Anglade (do cult “Betty Blue” e “Rainha Margot”), Gillaume Canet (ator e diretor da saborosa comédia “Rock’n Roll: Por Trás da Fama” e companheiro de Marion Cotillard), o belga amalucado Benoît Poelvoorde, o sensível Philippe Katherine, entre outros (serão oito, no total).

O time masculino será comando por duas mulheres poderosas, ambas na função de treinadoras: a democrática e (até) paciente Delphine (a comediante Virginie Efira) e a mandona Amanda (Leila Bekthi, beleza de origem árabe, hoje estrela ascendente do cinema francês).

Desde que a comédia edificante “Intocáveis” (Toledano e Nakache, 2011) vendeu um milhão de ingressos no Brasil (o filme virou peça de teatro e ganhou remake em diversos países), que uma pergunta se impõe: quando um novo filme francês repetirá tamanho sucesso?

As esperanças estão, agora, depositadas em “Um Banho de Vida”. Claro que se o filme chegar a um quinto do borderô brasileiro do blockbuster protagonizado por Omar Sy e François Cluzet, o dado será festejado. Chegará? Eis a questão.

O distribuidor brasileiro do filme, Bruno Beauchamps, da Pagu Pictures, prefere não adiantar números. Mesmo assim, não esconde que “Um Banho de Vida” é “o filme certo, na hora certa”. Ou seja, “uma comédia de qualidade, otimista, e que fala o tempo inteiro de superação”, características “importantes e necessárias no Brasil de hoje”.

Beauchamps destaca outro mérito do filme: “nele, nos deparamos com a força feminina”. São “as mulheres que comandam o grupo de homens”. Lellouche destaca “a brincadeira entre o feminino e o masculino”. E o distribuidor revela curiosa e tentadora ideia: “por entender que todos nós podemos usar as cores que quisermos e fazermos o que bem entenderemos, quase dei ao filme (‘Le Grand Bain’, no original), o título de ‘Mulheres Vestem Azul e Homens Vestem Rosa’”. Mas a presença da água e a prática da natação levaram Beauchamps a “um título mais alto astral e aquático”.

“Um Banho de Vida” – defende o jovem empresário – “nos faz rir com a força da transformação pessoal, com a superação de obstáculos”. Por isto, “merece ser visto neste momento difícil que atravessamos”.

A Pagu Pictures foi criada há apenas dois anos. Seu primeiro lançamento foi “Gabriel e a Montanha”, de Fellipe Gamarano Barbosa, “uma dádiva, que nos trouxe muita alegria”. Depois, vieram “On Yoga: Arquitetura da Paz”, de Heitor Dhalia, “Aos teus Olhos”, de Carolina Jabor, e “Slam, a Voz do Levante”, de Tatiana Lohmann e Roberta Estrela D’Alva, “filmes dos quais me orgulho de ser o distribuidor”.

A Pagu, segundo seu proprietário, “veio para tentar fazer diferente, com energia, estratégia e, principalmente, muito trabalho, lançando filmes de valor artístico e potencial comercial, sempre atrás do público certo em todas, digo todas, as plataforma de exibição”.

É hora, pois, de testar a receptividade do público brasileiro para a história dos quarentões do nado sincronizado, que tanto mobilizou os franceses, um povo louco por piscinas públicas.

Quando “Um Banho de Vida” começa, o quarentão Bertrand (Mathieu Amalric) está desempregado e deprimido. Os medicamentos não estão fazendo efeito. Ele busca, então, a piscina municipal do bairro onde vive. Acabará conhecendo, no local, outros homens com histórias parecidas com a sua. O grupo se juntará, de forma desajeitada, em equipe de nado sincronizado masculino, algo incomum dentro desta prática artístico-esportiva. Quem conhece Hollywood e seu poderoso cinema, sabe que a Metro Goldwyn-Mayer fez de Esther Williams a estrela de seus musicais aquáticos. Um deles, “A Rainha do Mar”, de 1952, tem um trecho acrobático mostrado em “Um Banho de Vida”.

O time de marmanjos desajustados e melancólicos será treinado por uma ex-atleta, saudosa de seus anos de glória. Quando um problema a afastar do trabalho, ela será substituída por uma amiga, presa a uma cadeira de rodas, mas pronta a domar e disciplinar os quarentões.

Thierry (Philippe Katherine), um gordo de coração mole, convencerá os novos companheiros a participar do Campeonato Mundial de Nado Sincronizado, na Noruega, país que conta com time espetacular, capaz de acrobacias dignas de Esther Williams. A equipe francesa terá chances? Esta é a pergunta que se impõe aos quarentões, que encontram na água válvula de escape para seus problemas cotidianos. E, rumo à Escandinávia, mais que um desafio, um novo propósito para suas vidas. Com direito a visão estonteante do sol da meia-noite.

Se o filme emplacar no Brasil, ele integrará time seleto, no qual os campeões vindos da França são o melodrama “Retrato da Vida” (Claude Lelouch, 1981), que permaneceu por mais de um ano em cartaz, e o bem-aventurado “Intocáveis”. Um dado curioso: como “Um Banho de Vida”, o filme do veterano Lellouch tinha longa duração (184 minutos), portanto mais de três horas, e “Intocáveis” dura quase duas horas. Quando um filme cai no gosto do público, a longa duração não constitui problemas. Vide “E o Vento Levou…”.

 

Um Banho de Vida
França, 122 minutos, 2018
Direção: Gilles Lellouche
Elenco: Mathieu Almaric, Guillaume Cantet, Virginie Efira, Jean-Hughes Anglade, Leila Bekhti, Marine Foïs, Felix Moati e Philippe Katherine

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