Júri de países do Mercosul consagra “Pacarrete”

Por Maria do Rosário Caetano, de Florianópolis (SC)

“Pacarrete”, longa de estreia do cearense Allan Deberton, protagonizado por Marcélia Cartaxo, foi o grande vencedor do 23º FAM (Florianópolis Audiovisual Mercosul), encerrado nesta quarta-feira, 2 de outubro, na capital catarinense.

O filme, que havia conquistado oito Kikitos na mostra nacional de Gramado, dois meses atrás, recebeu, em Florianópolis, o Troféu Panvision do júri oficial e do júri popular. A comissão julgadora compôs-se com a atriz argentina Antonella Costa, o curador chileno do Festival de Viña del Mar, Claudio Navarro Pereira, e o crítico brasileiro José Geraldo Couto. Único representante brasileiro na competição de ficções do Mercosul, “Pacarrete” venceu dois candidatos argentinos (“Yo Niña” e “El Rocío”), um equatoriano (“Cenizas”), um colombiano (“Niña Errante”) e um boliviano (“El Rio”)

Os três jurados justificaram a escolha do longa brasileiro pela habilidade criativa de seu autor (Allan Deberton) e a excelência de sua protagonista, a atriz Marcélia Cartaxo, em “interpretação refinada e arriscada”. A paraibana Marcélia dá vida a personagem real, Maria Araújo Lima (1912-2004), sexagenária bailarina e professora aposentada, tida como louca pelos moradores do município de Russas. O sonho dela é montar um ballet para mostrar a seus conterrâneos nos festejos do bicentenário de sua cidade natal.

Um menção especial foi feita pelo júri oficial à protagonista-mirim (Huenu Paz Paredes, verdadeira revelação) de “Yo Niña”, longa ficcional da argentina Natural Arpajou. Neste filme, que contém muito de autobiográfico, Huenu interpreta a filha de pais hippies, que a levam para viver na Patagônia, em condições as mais adversas. A Recam (Reunião de Autoridades Cinematográficas do Audiovisual – Mercosul) atribuiu a este mesmo longa-metragem seu prêmio-aquisição (no valor de U$1 mil) para que seja exibido em seu circuito de salas digitais, além de uma cópia “com acessibilidade a portadores de deficiência”.

O Brasil brilhou, também, na categoria longa documental. O grande vencedor do júri oficial foi “Espero tua (Re)Volta”, de Eliza Capai, vibrante registro das lutas de estudantes da grande São Paulo, que chegaram a ocupar 200 escolas. Eles conseguiram impedir que algumas delas fossem fechadas e, assim, forçassem os alunos a estudar em locais distantes (e a gastar com transporte coletivo). O filme é narrado por três estudantes que tiveram presença marcante nas ocupações (Marcela de Jesus, Nayara Souza e Lucas “Koka” Penteado). Marcela e Lucas são, hoje, atores de teatro e integraram elencos de novelas ou séries de TV. Nayara se prepara para candidatar-se a cargo eletivo, seja como vereadora ou deputada.

O júri popular preferiu o documentário chileno “Zurita”, de Alejandra Carmona, que registra a trajetória do poeta Raul Zurita, preso e torturado durante a ditadura comandada por Augusto Pinochet (1973-1990).

Na categoria Curta-Metragem do Mercosul e de Santa Catarina, a mais farta em prêmios, o grande vencedor foi “Ausência”, do colombiano Andrés Tudela. Levou quatro troféus Panvision. Entre os filmes infanto-juvenis, nova consagração (júri oficial e popular) para “Guaxuma”, de Nara Normande, o curta mais premiado do Brasil, nos últimos dois anos.

No terreno do cinema universitário, o FAM realizou nova edição do Rally Audiovisual, maratona que mobilizou 25 estudantes do Mercosul. Divididos em equipes com cinco integrantes cada, eles realizaram, sob supervisão de vários professores (Cavi Borges, Natural Arpajou, Ivan Molina, João Godoy, entre outros), curtas de até cinco minutos. Os estudantes deram conta da tarefa a eles proposta e finalizaram seus filmes em apenas seis dias. Em tempo de apresentá-los ao público durante a cerimônia de premiação.

Um júri especial analisou “Rebú”, “Ateliê”, “Tudo que Leva Consigo”, “Philla” e “O Grande Dia”. Este último sagrou-se o vencedor, com toda justiça. Afinal, conseguiu narrar, com originalidade e poder de síntese, a história de uma mulher com Alzheimer, que tem sua vida comandada por bilhetes que a filha, quando sai para trabalhar, espalha pela casa. Até que, num grande dia, os bilhetes dão orientações novas e capazes de quebrar a rotina da velha senhora.

O FAM valoriza, desde sua primeira edição, seminários reflexivos e a busca de parcerias entre os países do Mercosul. A cada novo ano, promove o Fórum do Audiovisual com participação de autoridades vindas de diversos países da América Latina. Nos últimos anos, o festival catarinense vem atraindo produtores interessados em fechar novas parcerias. Este ano, as participações da Colômbia e do Paraguai foram as mais vistosas. E recompensadas.

Dois filmes colombianos brilharam no WIP (Work in Progress), segmento do FAM destinado à análise de filmes em fase de finalização. Os vencedores foram a ficção “El Arbol Rojo”, de Joan Gómez Endara, e o documentário “El Film Justifica los Médios”, de Juan Jacobo del Castillo. Sem que o público soubesse que os diretores estavam presentes, uma especialista em recepção pediu que os espectadores apontassem os pontos positivos e negativos dos filmes.

“El Arbol Rojo” recebeu mais elogios que críticas, ao construir-se como um road-movie e drama familiar. Os mais diversos meios de transporte levam um pescador rechonchudo e maduro, uma criança (sua irmã temporona) e um jovem negro, que sonha em tornar-se boxeador, do Caribe colombiano até Bogotá. No caminho, eles encontram os mais diversos desafios, seja a brutalidade da polícia, um motorista mal intencionado ou um grupo de guerrilheiros (a história se passa no final dos anos 1990).

“El Film Justifica los Médios” também agradou ao público ao narrar a história do documentário político na Colômbia (visto por alguns de seus artífices, como Carlos Alvarez e Marta Rodriguez) e evocar o sacerdote-guerrilheiro Camilo Torres (1929-1966).

A Colômbia se saiu bem em outro segmento: o ECM-FAM (Encontro de Coprodução Mercosul), pois teve selecionado o projeto “Las Hojas del Poder”. O Paraguai, que se fez representar aqui por Guillermina Villalba, diretora de Audiovisual da Secretaria Nacional de Cultura, trouxe projeto tão sólido, que mais um prêmio foi distribuído pelo ECM. O escolhido foi “Kokue”. Os dois projetos receberão consultoria, apoio jurídico, de regulação, estruturação de negócios e assessoria artístico financeira de várias instituições lideradas pelo FAM (caso da Petrus Barretto Advogados, da Bravi – Brasil Audiovisual Independente, do Instituto de Pesquisa Boca a Boca e da Latam Cinema.

Confira os premiados:

MOSTRA DE LONGAS FICÇÕES MERCOSUL

. “Pacarrete” (Brasil) – melhor filme pelo júri oficial e pelo júri popular
. “Yo Niña”(Argentina) – Prêmio Recam de Aquisição e menção honrosa à atriz-mirim Huenu Paz Paredes

MOSTRA DE LONGAS DOCUMENTAIS MERCOSUL

. “Espero Tua (Re)Volta”(Brasil) – melhor filme pelo júri oficial
. “Zurita”, de Alejandra Carmona (Chile) – melhor filme pelo júri popular

MOSTRA DE CURTAS (Mercosul e Catarinense)

. “Ausência”, de Andrés Tudela (Colômbia) – Grande Prêmio FAM, melhor ficção, melhor atriz (Marina Corredor), melhor roteiro (Andrés Tudela)
. “Aqueles Dois”, de Emerson Maranhão (Brasil) – melhor documentário
. “Apnéia”, de Carol Sakura e Walkir Fernandes (Brasil) – melhor animação
. “Nossa Terra”, de Samuel Moreira (Brasil) – melhor curta catarinense (júri oficial)
. “Nas Curvas da Estrada”, de Viviane Mayumi – melhor filme catarinense (júri popular)
. “A Volta para Casa”, de Diego Freitas (Brasil) – Júri Popular, melhor ator (Lima Duarte), trilha sonora (Ed Cortez)
. “Kiriri”(Paraguai) – melhor direção (Miguel Aguero), fotografia (Angel Molina)
. “Oyentes”, de Fabricio Centorbi (Argentina) – melhor montagem (Café 80)
. “Cabrita Sin Cuernos”(Argentina ) – melhor direção de arte (Aureliano Gentili)

MOSTRA INFANTO-JUVENIL

. “Guaxuma”, de Nara Normande (Brasil) – melhor filme infanto-juvenil pelo júri oficial e pelo júri popular
. “As Quatro Estações”, de Lícia Brancher (Brasil) – menção honrosa do júri oficial

MOSTRA DE VIDEOCLIPES

. “Tenemos Voz – La Yegros Ft. Soom T” (Argentina) “, de Juan Manuel Costa – melhor videoclip
. “Ore Kunhangue-Mbya Resiste”, de Luiz Fernando Machado – Júri Popular
. “Prá que Ser Tão Normal – Julio Secchin”(Brasil) — de Romã – menção honrosa

RALLY UNIVERSITÁRIO FAM

. “O Grande Dia”- Melhor filme do projeto-maratona Rally Universitário

WORK IN PROGRESS

. “El Arbol Rojo”, de Joan Gómes Endara (Colômbia) – melhor filme em finalização
. “El Film Justifica Justifica los Médios”, de Juan Jacobo del Castillo (Colômbia)

PRÊMIO ECM (Encontro de Coprodução Mercosul — Consultoria)

. “Kokue” (Paraguai)
. “Las Hojas del Poder” (Colômbia)

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