São Paulo dá adeus a Maximo Barro, montador, professor e pesquisador de cinema

Por Maria do Rosário Caetano

O cinema paulista perdeu um de seus mais incansáveis montadores, estudiosos e professores: Máximo Barro. Nascido na capital paulista, há 90 anos, o profissional fez história como montador de filmes de Mazzaropi, nordesterns (westerns cangaceiros), filmes de empenho cultural (destaque para “A Ilha”, de Walter Hugo Khouri, e “A Margem”, de Ozualdo Candeias) e muitas pornochanchadas.

Além de seu trabalho como montador, Maximo Barro deixa, depois de quase 70 anos dedicados ao cinema, centenas de discípulos e mais de uma dezenas de livros. Professor na Faap (Fundação Armando Álvares Penteado), ele formou centenas de alunos. E não deixava, em tempo algum, de pesquisar a história do audiovisual brasileiro. Para a Coleção Aplauso, da Imprensa Oficial de São Paulo, ele escreveu quatro volumes: “José Carlos Burle – Drama na Chanchada”, “Sérgio Hingst: um Ator de Cinema”, “Agostinho Martins Pereira: Um idealista” e “Rogério Duprat: Ecletismo Musical”. E foi tema de outro, “Maximo Barro: Talento e Altruismo”, escrito pelo cineasta Alfredo Sternhein.

O pesquisador escreveu, também, livros (ou substantivos, embora sintéticos, estudos) como “A Primeira Sessão de Cinema em São Paulo”, “Caminhos e Descaminhos do Cinema Paulistano”, “O Cinema Começa a Falar”, “Almeida Fleming – Uma Vocação”, “Participação Portuguesa no Cinema Brasileiro”, “Na Trilha dos Ambulantes”, “O Cinema em Cartaz” (este em parceria com Rubens Fernandes Jr) e, o mais recente, “Participação Italiana no Cinema Brasileiro”, que fez jus a bela edição da Sesi SP Editora (2017).

Estudioso da obra de José Carlos Burle, um dos fundadores da Atlântida Cinematográfica, Maximo Barro não descuidou de outro nome essencial na história da empresa, Moacyr Fenelon. A este artífice da produtora de tantas e tão exitosas chanchadas, ele dedicou não um livro, mas estudo biográfico publicado em importante catálogo editado pelo Sesc SP. Junto com Alinor Azevedo (tema de dissertação de mestrado de Luis Alberto Rocha Melo, que merece urgente publicação), Burle e Fenelon formaram trinca de profissionais de cinema à qual o país muito deve.

Em 1941, no Rio de Janeiro – vale lembrar –, um quinteto de sonhadores (além de Burle, Fenelon e Alinor: os não-cineastas Paulo Burle e Arnaldo Farias) ergueu a Atlântida Cinematográfica. Em 1947, sem conseguir manter a empresa, passaram o controle acionário ao empresário Luiz Severiano Ribeiro. Maximo Barro mantinha imenso interesse pela história da empresa carioca, que nos legou filmes importantes como “Carnaval Atlântida”, “Nem Sansão, Nem Dalila”, “Matar ou Correr” e “O Homem do Sputnik”.

Quem assistiu, ano passado, ao documentário “Quando as Luzes das Marquises se Apagam – A História da Cinelândia Paulistana”, de Renato Brandão, pôde desfrutar de substantivo testemunho de Maximo Barro sobre as salas de cinema que fizeram do centro de São Paulo o mais lucrativo e atrativo dos polos cinematográficos do país. Até que os hábitos mudassem e os multiplexes, implantados em shopping-centers, se transformassem no paraíso da classe média consumidora.

Poucos meses atrás, o Canal Curta! exibiu o documentário “Na Ilha”, de Júlia Bernstein e Vinícius Nascimento. Os dois jovens cineastas decidiram ouvir alguns dos principais montadores do país, profissionais que vivem enclausurados em “ilhas” de edição. Um deles foi Maximo Barro. Lúcido e vigoroso aos 89 anos, o montador de tantos Mazzaropis e nordesterns surpreendeu a todos ao relembrar sua conflituosa relação com Ozualdo Candeias, diretor de “A Margem” (1967). Deixou claro que sua opção, como montador, sempre fora pela “montagem invisível” do cinema norte-americano. Ou seja, aquela que dá, ao espectador, a ilusão perfeita de continuidade. Já Candeia não estava atrás de “montagem invisível”, mas sim de um filme poético e livre. Os desentendimentos se multiplicaram, o pau comeu. Barro ameaçou não colocar seu nome nos créditos.

Quando “A Margem” estreou, o beligerante montador propôs à esposa que fossem, discretamente, ver qual fora o resultado. Acreditava que seria, no mínimo, catastrófico. A mulher olhou para o marido e argumentou: resultou em um ótimo filme, do qual você só tem que se orgulhar.

Registro final: Maximo Barro nunca renegou as muitas pornochanchadas que montou (“Viúvas Precisam de Consolo”, “Alugam-se Moças”, “Noite das Depravadas”, “O Castelo das Taras”), mas achou demais prosseguir em seu ofício quando o filme de sexo explícito chegou, em 1981, com “Coisas Eróticas”. Passou, então, a dedicar-se integralmente ao ensino na Faap (por longos 40 anos) e às suas pesquisas.

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