Dora e Gabriel
Por Maria do Rosário Caetano
“Dora e Gabriel”, o novo filme de Ugo Giorgetti, chega aos cinemas nessa quinta-feira, 23 de setembro. À frente do elenco, os atores Natalia Gonsales, do grupo Tapa, e Ary França, com passagens por companhias teatrais com o PodMinoga, de Naum Alves de Souza, o Ornitorrinco, de Cacá Rosset, e o CPT (Centro de Pesquisas Teatrais), de Antunes Filho.
Giorgetti escolhe, mais uma vez, a cidade de São Paulo, maior metrópole da América do Sul, como cenário. Um homem trafega, em seu veículo, por rua de bairro comercial paulistano. Como já vai alta a madrugada, o local está deserto. Ao parar, obedientemente, em um sinal, o motorista é detido por dois assaltantes armados e brutalmente arremessado no porta-malas do carro. Logo em seguida, outra pessoa lhe fará companhia no exíguo espaço. A dupla confinada – um homem e uma mulher – viverá um pesadelo urbano.
Como se dará a convivência forçada entre essas duas pessoas que nunca se viram? Depois de passar por experiência tão inesperada e desesperadora, ela, Dora, e ele, Gabriel, conseguirão estabelecer relações de solidariedade?
Ugo Giorgetti, que escreveu o roteiro do filme, constroi sua narrativa em clima de angustiante thriller. Por causa do inesperado confinamento, a dupla terá que lidar com a escuridão, o medo e a insegurança. Para onde estão sendo levados? Que destino os espera? Serão mortos e desovados num lugar ermo?
Ary França, paulistano de 64 anos, tornou-se conhecido como ator cômico. No teatro, na TV e no cinema foi, na maioria das vezes, escalado para papeis que lhe permitiram exercitar suas imensas qualidades histriônicas. Foi assim na peça “O Doente Imaginário”, de Moliére, em telenovelas como “Chocolate com Pimenta”, na série “Som e Fúria”, de Fernando Meirelles, nos filmes “Um Homem Sério”, da Dainara Toffoli e Diego de Godoy, e em “Durval Discos”, de Anna Muylaert. E assim será em mais dois longas-metragens, a serem lançados nos próximos meses – “45 do Segundo Tempo”, de Luiz Villaça, que ele protagoniza com Tony Ramos, Cássio Gabus Mendes e Denise Fraga, e “Amarração do Amor”, de Carolina Fioratti (neste, ao lado de Cacau Protásio).
Com o bom humor que lhe é característico, Ary França diz não poder adiantar se “está pronto” para enfrentar qualquer desafio. A cada convite, avisa, “tento oferecer o que tenho de melhor”. Afinal, “sou um ator principalmente, um cômico, segundamente, bem como dramaticamente”.
O ator paulistano matiza sua trajetória no cinema, no teatro e na TV, lembrando que muitos de seus trabalhos como ator (ele é também diretor de teatro) “estão fora de gêneros específicos”. Aliás, avisa, “não gosto muito de gêneros, pra falar a verdade”. E faz questão de lembrar que o curta “Um Homem Sério”, recriação de um conto de Machado de Assis, e o longa “Durval Discos” não são comédias no estrito senso da palavra. “Na minha opinião” – pondera – “são crônicas delicadas e engraçadas até certo ponto sobre a condição humana”.
“No caso de ‘Dora e Gabriel’” – detalha – “procurei me ater às necessidades daquela personagem aflita, mas madura o suficiente para escolher uma ação para cada um daqueles diferentes momentos. Não havia escolha”. E, brincando com seu ofício, acrescenta: “falando metaforicamente, constato que um ator está sempre preso num porta-malas com um roteiro”. Esse desafio está em todo trabalho artístico.
Ary França recebeu, com naturalidade, o convite de Ugo Giorgetti para coprotagonizar o noturno, claustrofóbico e agonizante “Dora e Gabriel”. Em nenhum momento se perguntou por que o cineasta optara pela escalação de um ator com tantas comédias no currículo para atuar em thriller de atmosfera tão tensa e densa. Afinal, relembra, “Ugo tem me acompanhado no teatro, de perto e atentamente, por décadas e conhece profundamente o ofício de ator, por admirá-los”. E mais, “ele não se deixaria levar por essa coisa de gêneros e suas limitações”.
Dividir o porta-malas de veículo em movimento com pessoa desconhecida, convenhamos, não é fácil. Os contorcionismos exigidos por corpos colocados em espaço tão exíguo são, realmente, parada dura para qualquer ator ou atriz.
França comenta tal desafio: “sem querer parecer pedante, tenho que admitir que as condições mais difíceis são sempre internas”. Já que “as externas a gente vence de um jeito ou de outro”. Para arrematar: “o evidente desconforto dos atores nesse filme foi compensado com muito ensaio fora do porta-mala e muito alongamento” (risos).
Contracenam com Ary França e Natalia Gonsales, em “Dora e Gabriel”, os atores William Amaral e Mauricio de Barros, como os assaltantes que encerram a dupla no porta-malas do carro, Carlos Meceni, na pele de um argentino, Cris Rocha, como a mãe do menino Cauã Alcantara, e Da Lapa e Elaine Cristina, como amigos dos sequestradores.
Em “Dora e Gabriel”, Ugo Giorgetti volta a trabalhar com alguns de seus mais fieis colaboradores: o fotógrafo Walter Carvalho, o paulistano (não confundir com o paraibano-carioca, irmão de Vladimir Carvalho), Malu Oliveira, na produção-executiva, Geraldo Ribeiro e Miriam Bidermam, no som, Marc de Rossi, na montagem, e Mauro Giorgetti, na trilha sonora.
Dora e Gabriel
Brasil, 85 minutos, 2020
Direção e roteiro: Ugo Giorgetti
Fotografia e câmera: Walter Carvalho
Elenco: Ary França, Natalia Gonsales, William Amaral, Maurício de Barros, Carlos Meceni
Distribuidora: O2 Play
FILMOGRAFIA
Ary França (São Paulo-SP, 1957)
Longas-metragens:
1990 – “Beijo 2348/72”, de Walter Rogério
1998 – “Ed Mort”, de Alain Fresnot
1998 – “Amor & Companhia”, de Helvécio Ratton
2001 – “Xangô de Baker Street”, Miguel Faria Jr
2002 – “Durval Discos”, de Anna Muylaert
2009 – “Som e Fúria, o Filme”, de Fernando Meirelles
2018 – “Quase uma Dupla”, de Marcos Alvisi
2018 – “Sai de Baixo, o Filme”, de Cris D’Amato
2021 – “Dora e Gabriel”, de Ugo Giorgetti
2021 – “45 do Segundo Tempo”, de Luiz Villaça (inédito)
2021 – “Amarração do Amor”, de Carolina Fioratti (inédito)
Curtas-metragens:
1986 – “A Bicharada da Dra Schwartz”, de Regina Redha
1989 – “Vinte Minutos”
1989 – “Cadê a Bolinha?”, de Eduardo Caron
1991 – “Viver a Vida”, de Tata Amaral
1994 – “Lumpet”, de Ricardo Elias
1995 – “Brincadeira de Criança”
1996 – “Almoço Executivo”, de Marina Person
1996 – “Lembranças do Futuro”, de Geraldo Mueller e Ricardo Eche
1996 – “Um Homem Sério”, de Dainara Toffoly e Diego de Godoy
1997 – “Manual Cinematográfico dos Seios para Educação de Crianças e Adultos”, de Fernanda Riscali
2005 – “Manual para Atropelar Cachorros”, de Rafael Primot
2005 – “21A”, de Amanda Guimarães
Irei prestigiar!