Mostra Chinesa do Instituto Confúcio apresenta oito filmes contemporâneos na plataforma Spcine Play
Foto: “Deserto”, de Zuo Zhiguo
Por Maria do Rosário Caetano
Quem acompanha os borderôs do grande circuito exibidor planetário pelo Boletim Filme B, editado pelo cineasta Paulo Sérgio Almeida, costuma ver filmes chineses comprando briga com blockbusters norte-americanos e atingindo cifras de tirar o fôlego. Ou seja, rendendo bilheterias similares às dos super-heróis Marvel. Aquelas que passam do bilhão de dólares.
Em muitos casos, os filmes que atingem cifras bilionárias são dramas históricos (alguns sobre guerras patrióticas), nos quais se somam arrebatadoras cenas de ação, realizadas com efeitos especiais de ponta e seguindo moldes do poderoso cinema comercial dos EUA. A grande diferença é que seus elencos têm os olhos puxados.
Outra diferença fundamental se impõe: os blockbusters chineses não circulam no Ocidente. Quando o fazem, alcançam bilheterias inexpressivas. Vendem milhões de ingressos na China Continental e em alguns países da Ásia e da África.
Até o cinema de arte chinês desapareceu do circuito exibidor brasileiro. Desde a Quinta Geração, liderada por Zhang Yimou e Chen Kaige, que não assistimos a ciclos ou mostras substantivas dedicadas ao cinema do grande país asiático (mais de um bilhão de habitantes). Até o cinema de Taiwan, que teve em Edward Yang (1947-2007) seu nome de proa, anda em baixa evidência.
Fora o chinês continental Jia Zhang-ke, que também anda sumido, quem representa a força renovadora do cinema realizado na pátria de Gong Li?
A Coreia do Sul, sozinha, vem brilhando mais que as cinematografias somadas da China, Hong Kong e Taiwan. A cinematografia desses prolíficos centros de produção, que teve no italiano Marco Müller e no francês Olivier Assayas dois de seus grandes arautos, parece em compasso de espera.
Para contribuir com a formação de novos espectadores brasileiros para o cinema da China, o Instituto Confúcio da Unesp (Universidade Estadual de São Paulo) tem realizado, anualmente, a Mostra de Cinema Chinês de São Paulo. Primeiro, o evento acontece presencialmente no CCSP (Centro Cultural Vergueiro). Depois, recebe difusão nacional graças à plataforma de streaming da Empresa Paulistana de Cinema (a Spcine Play).
Moradores de Roraima ao Rio Grande do Sul poderão assistir, gratuitamente, aos oito longas-metragens programados, a partir do feriado da Proclamação da República (essa quarta-feira, 15 de novembro) até dia 30. Os filmes serão disponibilizados ao longo de 16 dias.
A seleção foi feita por intelectuais chineses e se apresenta sob tema bem genérico: “Em Busca da Luz”. Como o cinema tem a luz como matéria-prima, qualquer filme pode ser encaixado sob esse imenso guarda-chuva conceitual.
Shi Wenxue, mestre em Ciências do Cinema e integrante do comitê de seleção do Festival Internacional de Cinema de Pequim, e Lilith Li, do Festival de Macau e da Semana de Séries TV (Sydney Culture – Austrália), assinam a curadoria. Entre os oito filmes selecionados não há nomes conhecidos do público brasileiro. A intenção, pois, é mostrar filmes de novos autores. E que tenham recebido prêmios em festivais chineses ou de outras nações.
Documentários e ficções (uma se qualifica como science-fiction em ritmo de comédia) se apresentam à fruição dos espectadores brasileiros. Nenhuma animação.
Quem assistiu — na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, mês passado — ao longa “Da Cor e da Tinta”, da sino-americana Weimin Zhang, notou a devoção do pintor Chang Dai-chien pelo Jardim das Oito Virtudes, que ele criou e cultivou em sua propriedade em Mogi das Cruzes (o artista viveu no Brasil por 20 anos, depois de abandar a China revolucionária de Mao Tse-Tung).
Na tradição cultural chinesa, jardins são construídos como obras de arte. Quem assistir, no evento do Instituto Confúcio, ao documentário “Pequenos Jardins” (95 minutos), de Hongbo Zhou e Zhenyu Lu, terá mais uma prova de tal devoção. O filme explora a relação entre três famílias de Suzhou com seus jardins particulares. Eles são considerados “verdadeiros tesouros culturais e históricos da China”.
O encanto do país oriental pelos jardins é tamanho, que a China (a Continental, portanto a socialista) está reconstruindo o Jardim das Oito Virtudes de Chong Dai-chien, destruído por represamento realizado no Rio Jundiaí, no distrito paulista de Taiaçupeba. E isso acontece, apesar do artista ter rompido com a China revolucionária e, depois de correr mundo, escolhido Taiwan como sua última morada e túmulo.
Os curadores da mostra chinesa fizeram mesmo questão de escolher filmes diversificados (drama, comédia, road movie, documentário e a já lembrada ficção científica).
“Acima das Nuvens” (90 minutos), de Liu Zhihai, é um drama de guerra, gênero muito apreciado no país oriental. Tanto que o filme selecionado foi eleito “o mais popular” do Festival Internacional de Cinema de Pequim (ou Beijing). E ainda foi destacado na categoria “Exploração Artística”. Parecem conceitos contraditórios, mas — convenhamos — não estamos familiarizados com a nomenclatura do festival realizado na capital chinesa há 29 anos.
Com prêmios internacionais chegam o documentário “Juntos pelo Mundo” (98 minutos), de Xu Chenghua, e “Irmãos” (95 minutos), de Guo Xiuzhua. O primeiro foi eleito o melhor filme do Festival de Documentários de Hollywood e mostra pai e filho, que partem juntos de Dali, na província de Yunnan, rumo ao Tibete. O longo trajeto de 8.700 quilômetros rumo às montanhas tibetanas colocará muitos imprevistos no caminho dos dois personagens.
Já “Irmãos” foi premiado — vejam só — no 14º Festival de Cinema de Taiwan. Lembremos que são tensas as relações entre a China Continental e a Insular. O filme explora os laços inquebrantáveis entre dois irmãos — Wen Guang, que vive o desafio do autismo, e o caçula Wen Xiu. Unidos, mas sozinhos, eles enfrentarão as adversidades da vida. O tema edificante deve ter colaborado para que a rivalidade política entre as duas nações ficasse em segundo plano.
“Departamento Editorial de Exploração Espacial” (118 minutos), de Kong Dashan, que mistura comédia a ingredientes de ficção científica, gira em torno de Tang Zhijun, editor-chefe de revista decadente, pautada por assuntos de sci-fic. Em determinado momento ele decide partir em busca, muito atrapalhada, por vida extraterrestre.
“Cordão da Vida” (96 minutos), de Qiao Sixue, foi premiado no 20th Film Channel Media Focus Unit, em Xangai. Na trama, uma história familiar — a de Arus e sua mãe. Ele leva sua genitora de volta às estepes, onde fica sua terra natal, de forma que ela possa resgatar seu lar perdido na memória.
“Um Pai, um filho” (97 minutos), de Bai Zhiqiang, constrói-se como um road movie, que acompanha a jornada de Gou Ren, atormentado pela perda do filho. Ele acaba conhecendo Mao Dou, um capeta em forma de guri, decidido a encontrar o pai. O filme foi premiado no Festival de Pequim.
“Deserto” (93 minutos), de Zuo Zhiguo, acompanha Lin e seu irmão, que procuram o pai desaparecido no deserto. A questão da água será central na narrativa, pois os que buscam a figura paterna terão que enfrentar ambiente inóspito e duras adversidades.
MOSTRA DE CINEMA CHINÊS DE SÃO PAULO
Abertura nessa quarta-feira, feriado de 15 de novembro (até 30)
On-line para todo o território brasileiro, pela Spcine Play
Endereço de acesso gratuito: https://www.spcineplay.com.
Promoção: Instituto Confúcio da Unesp e Spcine