O primeiro complexo a gente nunca esquece

Teté (Sofia Ferreira) é uma garota de 11 anos que vive sem a presença da mãe, rodeada por um pai aparentemente distante e uma gata com filhotes. Seu problema não é esse aparente abandono, mas seus pés. A garota tem o hábito torturante de usar sapatos muito menores que o tamanho que calça para esconder os pés um pouco grande para sua idade (daí o apelido de L). Ao conhecer Héctor, um simpático descendente de chineses com os cabelos cacheados, que ela acha se tratar de um problema para ele também, começa a ver sua aparência por novos ângulos. A partir desse argumento simples, a cineasta Thais Fujinaga constrói um drama pré-adolescente, tratando com poesia uma fase dura na vida de quem começa a descobrir o próprio corpo e a atração inconsciente ao sexo oposto.

“A ideia nasceu de uma lembrança de infância, quando eu tinha a idade da protagonista, e alguém me chamou de L. Isso aconteceu uma única vez, mas foi o suficiente para agora eu escrever um roteiro sobre uma menina que odiava os pés”, relata Thais, autora de outros três curtas, “Desenho da Mão” (2010), documentário sobre o artista plástico Arnaldo Pedroso D’Horta; “A Visita” (2009); e “Hoje é o seu Dia” (2008). A partir deste tema, Thais pesquisou mais sobre essa rejeição aos pés e encontrou respostas na cultura chinesa, onde as mulheres quebravam os próprios pés antes de enfaixá-los para mantê-los pequenos. Mas é a condução desse enredo que a delicadeza da direção se revela, na forma como o personagem transcende sua revolta.

O filme foi realizado em 35 mm, graças a um edital da Secretaria de Cultura da Prefeitura de São Paulo, e vem colecionando prêmios em muitos festivais, como no de Berlim, onde venceu como melhor filme, melhor direção no Festival de Brasília do ano passado, e conquistou ainda o prêmio de melhor filme em Mar Del Plata. Thais é formada em Cinema pela ECA/USP, dá aulas de roteiro, e prepara um roteiro de longa-metragem em fase de desenvolvimento, que somente depois de pronto deverá procurar parcerias com produtoras. Seu próximo curta, “Os Irmãos Mai”, conta a história de dois irmãos de origem chinesa que saem pelo centro de SP em busca de um presente para a avó. Tem previsão de filmagem para abril deste ano.

 

Por Hermes Leal

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