Elefante Branco

Sétimo longa do cineasta argentino Pablo Trapero, “Elefante Branco”, selecionado para a mostra Um Certo Olhar, do Festival de Cannes de 2012, diz respeito à tentativa de alguns padres e uma assistente social em melhorar as condições sociais de um bairro muito pobre e dominado pelo narcotráfico. O tal ‘elefante branco’ a que o título se refere é um projeto construído, mas nunca acabado, do que seria o maior hospital público da América Latina, iniciado nos anos 1930, que serve de abrigo para muitas famílias, inclusive para os padres.

Trapero é um dos principais nomes do cinema argentino contemporâneo, um dos responsáveis por essa nova onda. Muito se especula sobre a razão do cinema argentino ter conseguido tamanho espaço ao redor do mundo nos últimos anos. As justificativas geralmente focam no fato de esse cinema ter certo gosto em retratar a classe média local, com todas suas nuances, vide os filmes de Daniel Burman, Juan José Campanella e Lucrecia Martel. Pois bem, Trapero nunca foi muito afeito a esses dramas cotidianos familiares usuais. Seus filmes carregam uma grande dose de comentários críticos a problemas sociais diversos. O longa anterior, por exemplo, “Abutres”, falava sobre advogados que batiam ponto em hospitais tentando conseguir trabalho em cima de acidentes automobilísticos e sobre as fraudes em seguradoras. “Leonera” (2008, seleção oficial de Cannes) versa sobre uma mulher grávida que é presa e tem, encarcerada, sua experiência de maternidade.

“Elefante Branco” se passa numa favela, pobre e violenta, em que o combate entre facções narcotraficantes causam medo na população, jovens estão viciados, as casas alagam, a rua não tem pavimento etc. É lá que o padre interpretado por Ricardo Darín tenta mudar o mundo, entre outras medidas, ajudando na construção de novas moradias, junto com colegas do clérigo, uma assistente social (Martina Gúsman, esposa de Trapero) e um padre belga recém-chegado (Jérémie Renier, ator de vários filmes dos irmãos Dardenne). Além de todos os problemas estruturais, ainda encontram barreiras na administração da igreja sobre o local.

A diferença do filme de Trapero para os brasileiros que abordam esse universo é o foco em personagens de uma classe mais privilegiada, ou seja, o olhar para aquela situação é o da classe média, classe de onde vem o próprio cineasta. Nisso, Trapero leva uma grande vantagem, pois o universo da favela não é o seu – assim como o da maioria dos cineastas brasileiros que se incursionam por esse subgênero –, e, por mais que tente, jamais terá a mesma bagagem sobre os problemas dessa realidade. Trapero foge assim de uma sociologia e antropologia barata do universo; seu olhar não é superficial e condicionado a causalidades. Olha com refinamento: seus personagens não são pedantes, não se colocam acima dos moradores da região, e sabem desvaler-se de preconceitos.

O diretor narra sua história, assim, de maneira límpida e crua, sem estilizações, invocando o caráter taciturno dos personagens na composição da imagem. Trapero parece querer que vejamos todos os problemas, sem cair em sensacionalismos. As molduras dentro de seus quadros parecem só querer reforçar para onde o espectador deve olhar.
O principal problema de “Elefante Branco” – e do cinema de Trapero em geral – é a necessidade de uma mensagem ou de um efeito de ironia do destino. É como se o simples retrato para ele não fosse o suficiente e precisasse deixar mais claro o que queria com o filme. São nesses momentos, inclusive, que Trapero opta por deixar de lado a sutileza para embarcar no excesso do trágico, que, ainda que filmado de maneira sóbria, demonstra essa vontade de escancarar os problemas. Vira filme de denúncia, e isso raramente é bom.

Elefante Branco | Elefante Blanco
(Argentina/Espanha/França, 120 min., 2012)
Direção: Pablo Trapero
Distribuição: Paris Filmes
Estreia: 2 de novembro

 

Por Gabriel Carneiro

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