A vez dos seriados para TV
Nos EUA, onde a indústria do audiovisual é forte, inclusive na televisão, o horário nobre é terra dos seriados. Existem, claro, os programas de variedades, os esportivos e os noticiários, entre outros, mas nenhum com a mesma força do seriado – aquele produto televisivo, com número pré-estabelecido de episódios por temporada, em geral semanal, que é exibido entre setembro e maio, com alguns intervalos. Lá, os seriados dominam a TV aberta, mas têm cada vez mais conseguido um espaço de prestígio na TV paga. No Brasil, os seriados também dominam o horário nobre de muitos canais da TV paga, mas, em geral, são os mesmos produtos que dominam nos EUA, ou seja, são produtos importados. Com a Lei 12.485/11, que impôs uma obrigatoriedade de 3h30 de programação brasileira semanal em cada canal, esse cenário vai, aos poucos, mudando. Ao que tudo indica, deve ser o formato a dominar as programações no futuro e diversificar a produção – inclusive daqueles que atuam, principalmente, no cinema e na publicidade.
O seriado, ao contrário dos filmes ou outros formatos de produção, tem o diferencial em longo prazo. “Os programas seriados fidelizam o espectador dos canais por assinatura. É melhor, para uma programação, obras continuadas do que edições únicas. Além disso, a obra seriada ganha em escala econômica. Como nesse mercado de TV por assinatura existem diferentes canais, com diferentes características, o mercado vai buscar o gênero, no caso ficção ou documentário, que melhor serve à grade de programação”, comenta Marco Altberg, presidente da ABPITV (Associação Brasileira de Produtoras Independentes de Televisão).
Os seriados podem ter diversos gêneros, formatos, públicos e orçamentos. Podem ser de ficção live action, documentais – muitas vezes com o acento do reality – ou animações. As possibilidades são diversas. O espaço alcançado tem refletido não só em novas séries, como na manutenção de outras, que ganham novas temporadas. É o caso de “O Negócio”, da Mixer, e “Destino: São Paulo”, da O2 Filmes, ambas para a HBO, que chegarão à segunda temporada, e de “Sensacionalista”, da Publytape, para o Multishow, que chega à quarta temporada, por exemplo. Para Carolina Paiva, da Flora Filmes, uma produtora pequena que está apostando no segmento televisivo, o seriado brasileiro existir e se expandir é quase uma missão. “Ele fortalece a nossa imagem, e fortalece nosso país”, explica.
“Não acho que estamos copiando formatos. Não é repetitivo como uma novela, mas, ao mesmo tempo, as tramas horizontais dos personagens costumam cativar o público. É só ver quantas séries premiadas a HBO tem e continua investindo para criar e manter seu público. Aqui, a produção independente está aprendendo a fazer não só séries como um pouco de TV”, afirma Andrea Barata Ribeiro, da O2.
É importante ressaltar que, historicamente, antes da novela, vieram os seriados na televisão aberta. Apenas nos anos 1960 é que as novelas se popularizaram e colocaram os seriados de escanteio – ainda assim sendo produzidos. Mesmo na televisão paga, alguns esforços foram feitos antes da aprovação da lei. “Tudo o que foi feito até antes da lei, no campo de conteúdos independentes para TV, foi fruto de esforço dos produtores independentes, da parceria com os diferentes canais, abertos e fechados, públicos e privados, nacionais e internacionais, e a percepção de que as políticas públicas para o audiovisual brasileiro não poderiam se limitar apenas ao cinema. Então, estamos falando de programas independentes construídos a partir de modelos de negócios diferente das condições criadas a partir da lei”, comenta Marco Altberg.
Gêneros e formatos
A ebulição de produtos seriados no Brasil é algo novo, que deve se confirmar nos próximos anos. No momento, existem muitos projetos sendo feitos e vendidos, que devem chegar ao público em breve. A questão, porém, que fica é: existe alguma tendência consolidada nesse novo modelo de negócio? Há preferência por gêneros, formatos, tamanhos etc.? Ao que tudo indica, não. Há espaço para se tentar de tudo. É sempre bom lembrar a premissa máxima da televisão: todos os projetos servem aos canais e seus públicos, devendo, portanto, seguir sua linha editorial.
“Dependendo de cada canal, existem as preferências. Uma das características das produtoras de TV é exatamente a consciência de que não existe produção para TV sem a participação dos canais. Por isso, estamos muito à vontade para entender e atender as diferentes grades de programação. Diferente do cinema, os conteúdos para TV são infinitos e não se limitam a poucos gêneros. O veículo TV está em constante construção de novos gêneros”, conta Altberg.
Para a produtora Flora Filmes, o caso é um. “Muitos canais estão nos pedindo ficção, mas depende do canal porque os mais independentes dependem de editais”, conta Carolina Paiva. Para o canal CineBrasilTV, um dos chamados superbrasileiros, por apresentar mais de 12 horas de programação brasileira diária, o caso é outro. “Os produtores têm apresentado mais seriados documentais do que de ficção. Temos uma grande quantidade de séries documentais em andamento, com produtores de todas as regiões do Brasil”, afirma Tereza Trautman, diretora geral do canal, que tem buscado conteúdos em séries e filmes, mas também está viabilizando mais de 20 telefilmes documentais de 52 minutos, de maneira a introduzir novos produtores independentes que ainda não têm seriados ao mercado de TV por assinatura.
Erotismo e comédia predominam
“No campo da ficção, nota-se que existem, praticamente, dois gêneros fazendo sucesso, a comédia e o erótico, uma tendência muito visível nos canais e também no cinema. Mas apostamos em todos os gêneros, nossa predileção neste segmento ficcional será pela qualidade e pela boa comunicação com o público e não com o gênero”, complementa Tereza, que pretende apostar em seriados sobre cultura popular, gastronomia com temas diferenciados, e até mesmo dramas e policiais. Hugo Janeba, CEO da Mixer, também vê essa tendência. “Começamos a ter um histórico dos sucessos no mercado brasileiro que poderiam levar a esta conclusão, porém, acredito que há mercado para tudo que seja relevante e com histórias bem contadas”, pontua.
A Mixer, por exemplo, é a produtora de “O Negócio”, veiculado na HBO, e que versa sobre o mundo da prostituição de luxo, tendo como mote a revolução da profissão através do marketing. A mesma HBO já havia apostado na comédia “Mulher de Fases”, produzida pela Casa de Cinema de Porto Alegre, que ficou só na primeira temporada. Se o erótico está presente nas principais séries do canal nos EUA, a comédia parece mais uma concessão ao país que tanto gosta do gênero. Outro canal sem muita tradição nisso é a Fox Brasil, que aposta em “Se Eu Fosse Você”, a série. Em contrapartida, o humor é um dos pilares do Multishow e sempre fez parte da programação do canal, com séries como “Adorável Psicose”, “220 Volts”, “Estranha Mente”, “Sensacionalista”, “Cilada”, entre outros. Mas depois da meia noite, os programas e seriados eróticos predominam.
O erotismo, porém, parece ser mais certeiro. A mesma Fox lança outra adaptação do cinema, “Bruna Surfistinha”, em 2014. O Multishow, desde seu começo, aposta nesse filão. Nos últimos anos, o canal exibiu séries como “Uma Rua sem Vergonha”, produzida pela Conspiração Filmes, sobre o meretrício em Copacabana, e “Oscar Freire 279”, produzida pela Prodigo, sobre uma arquiteta que vira prostituta de luxo. “O humor e a programação sensual fazem parte do Multishow desde o nascimento do canal, pois são temas que interessam à nossa audiência. O canal está sempre atento às demandas e necessidades do seu público-alvo – jovem de 18 a 34 anos –, seja através de pesquisas ou pela interação na web. E isso se reflete na nossa programação, que faz com que o jovem se veja retratado nela. Trouxemos o jovem para dentro de nossa grade, tanto no conteúdo quanto na produção”, explica Christian Machado, gerente de produção artística do Multishow.
A importância entre produtoras e canais
O Multishow procura sempre desenvolver o conteúdo junto com a produtora. “Buscamos sempre boas histórias, que na essência é o que um seriado se propõe, e é necessário um bom roteiro e um bom elenco. No desenvolvimento de um projeto de ficção, esses são os aspectos mais importantes. A decisão de continuidade de uma série parte da avaliação dos resultados artísticos e de audiência. Na maioria dos casos, desenvolvemos projetos que tenham ganchos para outras temporadas e que estão de acordo com nossa estratégia de programação”, conta Machado.
O CineBrasilTV, por outro lado, tem como posicionamento não encomendar projetos. “Apostamos na competência do produtor independente, que deve seguir as regras do mercado de TV por assinatura, que tem sua grande força nos seriados que gerem muitas temporadas. Esse é um segmento que se paga através do maior número de temporadas”, afirma Tereza Trautman. “Neste momento, temos licenciados seriados prontos dos mais variados temas, como aventuras, viagens, história do Brasil, problemática jovem, curiosidades do interior do Brasil, entre outros. E estamos com muitos projetos novos em andamento com nossos parceiros produtores, que deverá preencher a grade do canal em 2014 com uma programação nova e inédita”, complementa Tereza, sobre o modo operante do canal.
Os canais também têm sido abertos quanto a formatos. “Depende da política de programação dos diferentes canais. Existem séries de cinco a 52 capítulos por temporada, de 11 minutos até uma hora de duração”, conta Marco Altberg. O parâmetro do mercado tem sido temporadas de 13 episódios com duração de 26 minutos. E sempre apostando na possibilidade de continuidade por vários anos. “Já fazemos os projetos pensando em ficar pelo menos três anos em exibição. Estamos fazendo temporadas de 13 episódios e de sete episódios, depende do que o canal pede”, conta Carolina Paiva, que tem proposto projetos de acordo com o perfil do canal, como tem recebido briefing.
“Sempre pensamos nas amarrações necessárias das histórias para permitir novas temporadas, porque projetos que não tenham esse potencial estão fora das nossas prioridades. Para criar uma indústria saudável e perene, temos que montar modelos de negócio de longo prazo e com ganhos de escala”, pontua Hugo Janeba. Na Mixer, ele conta com três núcleos de desenvolvimento com focos distintos: dramaturgia, documentário e animação.
Mesmo sendo importante planejar as temporadas seguintes, não se deve cair em algumas armadilhas. “Não se pode guardar ideias para outras temporadas. As melhores têm que ser colocadas todas na mesa. Se você faz novas temporadas, deveria ser um sinal de que sua série foi bem. Às vezes vai bem, mas mesmo assim não se consegue viabilizar novas temporadas”, aponta Andrea Barata Ribeiro, que, na O2, conta com um núcleo pequeno para um primeiro take dos projetos – se o projeto interessar, contratam mais roteiristas sob demanda.
Financiamento vem dos canais e do FSA
A produção está a mil. Mas a questão no audiovisual brasileiro sempre volta para um ponto: e quem financia isso? Há muitos canais que tiram do seu bolso a verba necessária para produzir uma série. A maioria, porém, espera o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), que em sua linha B contempla projetos televisivos. Com a lei, esse valor subiu muito nos últimos anos e é esperado um orçamento de R$ 400 milhões para a área nos próximos. Há outros mecanismos fiscais que também podem ser usados, com os artigos 3º, 3º-A e 39.
“A única linha atual de TV no FSA diz respeito à produção de séries de ficção, documentais e animação. Os canais entram com 5 a 15% do valor da produção a título de licenciamento. Com a vigência da lei, está para ser anunciado o novo FSA para TV, já com a amplitude esperada a partir da nova demanda do mercado”, afirma Marco Altberg.
“Parece que boa parte do mercado de produção para a TV por assinatura está voltado para o FSA, onde há muito dinheiro e ainda poucos projetos. As regras do FSA estão mudando o olhar do produtor para o mercado. Esse deve ser o grande incentivador para esse seguimento do seriado, pois o FSA privilegia quase que totalmente o produto seriado”, pontua Tereza Trautman.
O procedimento no CineBrasilTV, que não participa em nada da produção, é um pouco diferente. “Quem corre atrás dos editais são os produtores, o canal apenas licencia o projeto pronto ou no papel, como no caso do FSA. Quando nos interessamos por um seriado, fazemos um contrato de pré-licenciamento com o produtor, garantindo a primeira janela de exibição desse seriado. Com esse contrato, ele concorre aos recursos do FSA. Sem um canal, o produtor não pode solicitar verbas do Fundo. E o CineBrasilTV tem sido um grande parceiro do produtor neste momento”, conta. Para quem quiser propor algum conteúdo para o canal, basta entrar em seu site e inscrever seu projeto. “Todos os projetos são bem analisados, o canal tem profissionais que auxiliam os novos produtores a formatarem e potencializarem seus projetos”, aponta Tereza.
Carolina Paiva tem trabalhado mais dependendo de verbas incentivadas. A Flora Filmes é uma produtora de pequeno porte que tem conseguido se impor nesse mercado. No momento, está com quatro projetos no FSA, um esperando contratação (“Foliar Brasil doc”), e três em análise (“Lusófonas”, “Sinastria” e “República do Peru”). “O FSA demora muito, o que é uma pena, porque numa atividade como a nossa, que prima pela agilidade, a burocracia nos engessa muito. Se o FSA fosse mais ágil, nós poderíamos estar fazendo muito mais coisas, e quando falo nós, falo de todos os produtores independentes do Brasil, porque verba sabemos que tem”, problematiza Carolina. “Os canais não independes – americanos e que têm empresas grandes por trás – bancam direto os programas. Mas os mais independentes dependem totalmente dos editais”, afirma. “Mas também são ótimos de trabalhar porque querem coisas novas, e é bem legal o acesso e a conversa com eles”, complementa.
Muito por conta disso, a O2 tem trabalhado mais com canais privados. “A maioria tem pago com art. 3º, 3º-A e 39. Já temos projetos feitos pelo FSA, mas o mecanismo ainda não está na velocidade que o mercado necessita; para o cumprimento das cotas, terão que agilizar mais. O mercado privado é muito mais eficiente do que o estatal, infelizmente”, desabafa. Andrea tem trabalhado com orçamentos diversos. “Beleza S/A”, feito para o GNT, teve um custo de R$ 280 mil cada episódio. Já “Destino: São Paulo” e sua segunda temporada, “Destino: Rio de Janeiro”, são mais caros, em torno de R$ 700 mil o episódio. No momento, preparam uma série de ação, cujo orçamento por episódio é de R$ 1,2 milhão. “Quando o canal banca o projeto, ele tem duas opções: fica 100% dono do projeto, e nesse caso não cumpre cota, ou 51% fica com o produtor independente, que tem os direitos de exibição de volta depois de certo tempo”, conclui.
Por Gabriel Carneiro
Olha, o momento é ótimo, estão todos super empolgados, trabalhando a milhão mas a verdade é que faltam boas histórias ainda. Como as produtoras estãõ resolvendo esse problema? Como elas estão se equipando para oferecer criação/dramaturgia de qualidade? O que se viu até agora são séries mornas a chatérrimas. Algumas bonitas, bem produzidas mas depois que vemos um episódio não dá vontade nenhuma de voltar pra assistir o próximo.
Olá, tudo bom? Gostaria de compartilhar o lunk de um programa que produzi sobre found footage
http://www.youtube.com/watch?v=V_WArcugco4
Espero que curtam!
Muito legal a crítica. E a do Hao, a nova página só para vídeos, já viram? Bem legal: http://br.hao123.com/movie?tn=fb_self_wt_01_movie_br
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