“Twixt”: Coppola pode

Os grandes mestres também têm o direito de se divertir de vez em quando. Não dá para ficar fazendo clássicos inesquecíveis e obras-primas o tempo todo. Provavelmente, foi nisso que Francis Ford Coppola pensou ao realizar seu “Twixt”, filme que para ser curtido precisa, antes de mais nada, ser encarado como uma divertida brincadeira cinematográfica. E nada mais que isso. A começar por seu próprio ponto de partida: um escritor com bloqueio criativo. Nada menos criativo.

Hall Baltimore (Val Kilmer) é um autor de sucesso, especializado em livros sobre bruxaria, que vive uma fase de decadência em sua carreira. Percorrendo o interior dos Estados Unidos para divulgar seu novo título, é ele mesmo, solitariamente, que carrega os volumes no seu carro, coloca os pôsteres de divulgação, e promove tardes de autógrafos em patéticas lojas… de ferragens. Numa destas solitárias incursões ao coração do típico conservacionismo do meio-oeste, Hall conhece o Xerife Bobby LaGrange (Bruce Dern), um tipo meio misterioso, que diz ter uma ótima história de horror para contar. E se oferece ao famoso escritor como “coautor” de um livro que escreveriam juntos. A princípio, motivado pelo seu preconceito contra os caipiras americanos, Hall recusa a ideia, mas estranhos pesadelos o levam a perceber que a história do xerife talvez tenha fundamentos reais que poderiam render um livro de sucesso. Assim, tem início uma investigação que levará o escritor a um mundo real de assassinatos, crianças desaparecidas, casas mal assombradas e fantasmas como nem em suas ficções mais íntimas ele poderia sonhar.

Porém, não se esqueça: “Twixt” é um filme escrito, produzido e dirigido pelo eterno estilista Francis Ford Coppola, que não terá o menor prurido em escancarar sarcasticamente os clichês do gênero, usando e abusando de cores em profusão, e destilando uma fina ironia de viés cômico nem sempre facilmente assimilada. Afinal, não é todo filme que une a gaiatice de Val Kilmer e Bruce Dern nos papéis principais, usa Tom Waits como narrador, e ainda se apropria de enigmáticas aparições e citações de Edgard Allan Poe (vivido por Ben Chaplin).

Ao trabalhar novamente com uma simples história de terror filmada dentro de um orçamento baixo, certamente Coppola deve ter se divertido muito ao recordar “Demência 13”, que realizou na flor de seus 24 anos. Percebe-se em “Twixt” o eterno frescor do cineasta, sua liberdade criativa, sua inesgotável sede de experimentação, e principalmente seu desapego ao excesso de amarras e formalismos que têm minado as bases do cinema comercial americano.

Como não se apega aos padrões consagrados, o filme foi mal recebido nos Estados Unidos, tanto pelo público como pela crítica. Foi remontado várias vezes após passar pela praga dos testes de audiência, recebeu lançamento modesto, quase todo circunscrito aos circuitos dos festivais, e ganhou média de apenas 3,1 (sobre 10) do site Rotten Tomatoes, especializado em críticas cinematográficas.

Ou, em outras palavras, Coppola é bom até quando é ruim.

O filme fala de maldições, mortes e assassinatos não resolvidos. Maldição ou não, o fato é que após “Twixt”, que foi finalizado em 2011, Coppola até o momento não dirigiu mais nenhum filme, concentrando suas atividades na produção e em sua vinícola na Califórnia.

Virgínia | Twixt
(EUA, 89 min., 2011)
Direção: Francis Ford Coppola
Distribuição: Europa Filmes
Estreia: 10 de janeiro

 

Por Celso Sabadin

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