Participação de estrangeiros em produtoras brasileiras
No ambiente de retração econômica, atualmente vivido no Brasil, é interessante notar que o interesse de estrangeiros em ingressar no mercado audiovisual brasileiro tem se mantido de forma crescente.
Tal interesse mostra-se na disposição de pessoas físicas e jurídicas, que já atuam no exterior, em participar de produtoras como sócias ou acionistas, e não apenas como parceiras em projetos de coprodução, por exemplo.
Os valores que poderiam ser utilizados em tais investimentos são relevantes, e muitas produtoras têm total interesse em recebê-los. Entretanto, a regulamentação atual da ANCINE traz diversas limitações à participação de estrangeiros no capital de produtoras e outros agentes econômicos atuantes no mercado audiovisual, especialmente, no que tange à classificação como produtora brasileira.
A Medida Provisória 2.228-1, de 6 de setembro de 2001, dispõe em seu artigo 1º, parágrafo 1º, que “entende-se por empresa brasileira aquela constituída sob as leis brasileiras, com sede e administração no país, cuja maioria do capital total e votante seja de titularidade, direta ou indireta, de brasileiros natos ou naturalizados há mais de 10 anos, os quais devem exercer de fato e de direito o poder decisório da empresa”.
Além da definição estabelecida no artigo acima mencionado, a Instrução Normativa n° 91/2010 da ANCINE estabelece que a classificação de agente econômico como brasileiro independente deve atender a determinados requisitos, dos quais destacamos:
– A empresa (sociedade limitada ou sociedade por ações, por exemplo) deve ser constituída no Brasil, de acordo com as leis brasileiras, e ter sede e administração no país;
– Ter 70% do seu capital total e votante sob titularidade, direta ou indireta, de brasileiros natos ou naturalizados há mais de 10 anos; e
– Ter a gestão das atividades da empresa e a responsabilidade editorial pelos conteúdos produzidos exercida privativamente por brasileiros natos ou naturalizados há mais de 10 anos.
A limitação ao capital estrangeiro, para que uma produtora seja considerada brasileira, para fins de seu registro e de obtenção de Certificado de Produto Brasileiro (CPB), e captação de recursos, a apenas 30% do capital total e votante da sociedade, é certamente um limitador ao ingresso de novos agentes e seus investimentos no mercado audiovisual, considerando-se que aquele que investe seus recursos em uma empresa pode (e deve) ter o direito de participar da administração de tais recursos e das decisões relativas à gestão da sociedade.
Tais limitações devem ser observadas cuidadosamente sempre que um agente estrangeiro pretender participar como sócio ou acionista em produtora brasileira, para que não haja consequências negativas às atividades junto à ANCINE, como o impedimento de classificação como produtora brasileira independente, ou a perda de tal classificação, no caso de sociedade já existente e devidamente registrada perante tal agência reguladora.
No cenário atual, eventual revisão do percentual mínimo de participação de brasileiros, como por exemplo mais da metade do capital (50% + 1), assim como a permissão para que estrangeiros exerçam, ainda que de forma compartilhada com brasileiros, a gestão de tais sociedades, poderia atrair mais investimentos, o que certamente seria salutar ao desenvolvimento do mercado e, consequentemente, ao atingimento de um dos objetivos da ANCINE, que é a “promoção da auto-sustentabilidade da indústria cinematográfica nacional, visando o aumento da produção e da exibição das obras cinematográficas brasileiras”, conforme estabelece o artigo 5º, inciso IV da MP 2.228.
Por Felipe Silva Jardim, advogado do escritório Cesnik, Quintino & Salinas Advogados | www.cqs.adv.com.br